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Investigação

Exploração de jogos por facção e uso de "laranjas": operação tem como alvo R$ 8,8 milhões em carros e imóveis

Segundo a Polícia Civil, grupo criminoso aliou-se a bicheiros nos vales do Rio Pardo e Taquari e usa nomes de pessoas sem registros criminais para "lavar" dinheiro do tráfico

15/01/2020 - 10h52min

Atualizada em: 15/01/2020 - 11h00min


Leticia Mendes
Polícia Civil / Divulgação

Em setembro de 2017, casas passaram a ser atacadas com tiros de pistola e fuzil em Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo. Para a polícia, aquele era o recado de uma facção para bicheiros e donos de máquinas caça-níquel. O grupo criminoso, com base no Vale do Sinos, queria expandir seus negócios e forçava um acordo. Mais de dois anos depois, uma ação da Polícia Civil revela uma relação de parceria estabelecida entre o tráfico e os jogos de azar.

A operação, que fez buscas em casas, escritórios e comércios de supostos "laranjas" — pessoas sem antecedentes que teriam nome usado pelo grupo para adquirir bens —  tem como alvo R$ 8,8 milhões em veículos e imóveis. Foram cumpridos 23 mandados de busca e apreensão em oito cidades: a maior parte, nove deles, em Santa Cruz do Sul. Os nomes dos envolvidos não foram divulgados. Mas o município é berço de um preso, considerado principal investigado desta operação e líder da facção naquela região, que conseguiu estabelecer a parceria com os jogos.

— Os bicheiros ali preferiram se aliar aos faccionados, que matam, roubam e traficam, para seguir faturando. O tráfico vai diversificando as receitas graças ao auxílio desses exploradores. Em paralelo, financiam a facção, injetando dinheiro para eles se equiparem, especialmente para a compra de armas — explica o delegado Filipe Bringhenti, titular da Delegacia de Repressão à Lavagem de Dinheiro (DRLD) do Gabinete de Inteligência e Assuntos Estratégicos (GIE).

Em 2017, a facção chegou a exigir pagamento de R$ 650 mil e mais 10% dos lucros mensais dos exploradores de jogos em troca de proteção. Quem recusasse o acordo, passaria a ser alvo. Em outubro daquele ano, a Polícia Civil apreendeu em Santa Cruz do Sul 15 fuzis e 21 pistolas no apartamento de um universitário. O arsenal pertencia ao mesmo grupo criminoso. Atualmente a polícia não detectou nenhum tipo de coação por parte da organização contra os bicheiros. Pelo contrário, segundo Bringhenti, traficantes e exploradores de jogos de azar dividem inclusive os mesmos espaços:

— Se no passado isso aconteceu, hoje a relação é amistosa, inclusive de irmandade, com auxílio mútuo entre o tráfico e os jogos de azar. Os bicheiros não aceitaram sair, mas emprestaram espaços. Cederam locais, onde eles exploravam os jogos, para a facção colocar equipamentos (jogos eletrônicos). Dividem o lucro.

Buscas

Além dos 23 mandados de busca, a polícia obteve 30 mandados de apreensão de veículos — sete haviam sido localizados até o fim da tarde — e conseguiu na Justiça autorização para indisponibilizar 30 imóveis. A maior parte está registrada em Santa Cruz do Sul e Lajeado, no Vale do Taquari. Na prática, a polícia oficiou o registro de imóveis e esses bens não podem ser vendidos até o desfecho da ação penal.

Os imóveis e veículos teriam sido adquiridos como resultado da exploração do tráfico. Segundo a polícia, pertencem aos investigados, mas estão em nome de terceiros. Enquanto, no papel, um veículo está no nome de algum laranja, pode, por exemplo, estar nas ruas sendo usado para o transporte de drogas ou para a locomoção de integrantes do grupo criminoso como seguranças ou gerentes. Há, entre os alvos, automóveis de padrão popular e outros de até R$ 280 mil, como BMW ou Land Rover.

— Há carros de luxo. Quem ganha dinheiro com o crime, também quer desfrutar do conforto. Mas se eu pesquisar hoje o principal investigado, ele não tem conta bancária, não tem imóvel, não tem carro. Nada está no nome dele — diz Bringhenti.

A ação não visava neste momento a prisão de nenhum dos investigados e, sim, encontrar mais provas da lavagem de dinheiro. Outro objetivo era identificar a existência de outros bens e de outras pessoas que tenham o nome utilizado pela facção. Ao todo, 120 pessoas físicas e jurídicas estão sendo investigadas nessa apuração. Segundo o delegado, ainda estão sendo feitas buscas pelos veículos.  

— A maioria dos nossos alvos, 90%, não eram os traficantes. São esposas, mães ou outros familiares, que não costumam se envolver com o crime. São escolhidos porque não tem antecedentes, não vão atrair a atenção da polícia — afirma o delegado.

Os mandados:

  • 9 Santa Cruz do Sul
  • 4 Lajeado
  • 4 Porto Alegre
  • 2 Campo Bom
  • 1 Venâncio Aires
  • 1 Estrela
  • 1 Novo Hamburgo
  • 1 Osório 

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