Polícia



Sistema prisional

Suposto plano para fuga em massa do Presídio Central alerta autoridades

Equipamento detectou alterações no solo e escavações foram feitas para descobrir se um túnel está sendo construído para acessar a maior cadeia de Porto Alegre

25/06/2020 - 09h36min


Adriana Irion
Adriana Irion
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Ronaldo Bernardi / Agencia RBS
Escavação na Capital busca indícios de um suposto túnel que seria usado para fuga do Presídio Central

Um suposto plano para fuga em massa do Presídio Central de Porto Alegre colocou autoridades da Segurança Pública em alerta nos últimos dois meses.

A informação de que um novo túnel estaria sendo construído por uma facção criminosa em direção à cadeia, a exemplo do que ocorreu em 2017, é de abril. Desde então, agentes de inteligência têm vasculhado as redondezas da prisão em busca de indícios da obra. 

O trabalho é da direção do Presídio Central com apoio dos órgãos de segurança pública do Estado e do município. Com auxílio da prefeitura, em maio, foi usado um georadar nas ruas para detectar alterações no solo. Foi encontrado um ponto com desnível de três metros, o que poderia indicar a existência de estrutura subterrânea. Nesta quarta-feira (24), escavações foram feitas no local para verificar se há um túnel. 

O trabalho visava a verificar pontos em que havia desnível na rua, indicando a possível existência de estrutura subterrânea. Por volta das 9h30min, escavações começaram a ser feitas na Rua Jorge Luiz Medeiros Domingues, a apenas 40 passos da casa usada em 2017 para ocultar a obra de um túnel que chegou a ter 47 metros de extensão em direção ao presídio. O primeiro ponto verificado foi exatamente no meio da via, quase em linha reta à entrada da casa usada por uma organização criminosa para despistar a obra de 2017.  Por volta das 11h, foi concluída a primeira etapa da escavação, que não localizou nenhuma estrutura suspeita. No começo da tarde, um segundo ponto também foi analisado, sobre uma calçada, bem paralelo ao que seria a trajetória do antigo túnel.  

Os trabalhos chamaram a atenção na região, já que a Jorge Luiz Medeiros Domingues ficou bloqueada para o trânsito e quem precisava sair ou acessar as ruas no entorno do presídio precisou fazer desvios. Além da curiosidade dos moradores - já acostumados com incidentes envolvendo a maior prisão da Capital -, detentos, especialmente do pavilhão D, também observaram a movimentação.

Moradores contam que ouvem barulhos semelhantes a batidas no subsolo durante as madrugadas. Há relatos também de tentativas de compra de casas ao redor da prisão, hoje chamada de Cadeia Pública de Porto Alegre, pela facção Os Manos, a mesma que financiou o túnel descoberto em 2017. 

Enquanto o trabalho de inteligência para o levantamento de informações prossegue, o passo seguinte da apuração ocorre. A Brigada Militar (BM) e a Promotoria de Justiça de Execução Criminal pediram à Secretaria Municipal de Obras e Viação (Smov) e ao Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae) o fornecimento de mão de obra e maquinário para o trabalho. A execução foi feita pela Smov com auxílio do Dmae para evitar a quebra de redes de água e esgotos.

Telefonema anônimo

Apesar das informações recentes, a possibilidade de uma nova tentativa de fuga financiada por organização criminosa já existia desde o ano passado. Em meados de abril de 2019, um homem telefonou anonimamente para o presídio informando que havia um plano para fuga pela rede de esgoto do Central. 

Essa rede passa atrás e ao lado do Pavilhão B, justamente o prédio em que estão recolhidos integrantes da facção Os Manos, e o mesmo cujos detentos teriam acesso à liberdade por meio do túnel feito em 2017.

Depois do telefonema anônimo, a direção da casa rastreou as redes de esgoto e reforçou com grades os acessos. Em meados de agosto, policiais militares apreenderam um martelo e duas talhadeiras (ferramentas que poderiam ser usadas para arrombar ou acessos à rede ou para fazer escavação) nas proximidades da rede de saneamento do pavilhão D. O estado de alerta se manteve. Outro fato inusitado, também ocorrido em agosto, fez autoridades suspeitarem de que criminosos seguiam com interesse na estrutura do túnel descoberto em 2017.

Uma empresa de São Leopoldo se habilitou para fazer o fechamento da passagem e dois engenheiros visitaram o local com integrantes das secretarias da Segurança Pública e da Administração Penitenciária. Ao analisar dados da empresa e dos engenheiros, a inteligência da BM descobriu que um deles — engenheiro civil — estivera preso no Central entre 2016 e 2018 e tinha ligação com um dos detentos apontados por participar do plano de construção do túnel. Ou seja, mesmo depois de a fuga ter sido frustrada, os criminosos seguiam interessados na estrutura, que chegou a ter quase 50 metros de escavação concluídos em direção ao presídio.

Nova informação de túnel

Em abril deste ano, setores de inteligência de mais de uma unidade da Brigada Militar tiveram informações sobre um novo túnel estar em construção e mais uma vez a direção do Presídio Central foi alertada. Foram então desencadeadas ações de busca de informações ao redor da prisão por agentes de inteligência.

A casa em que o antigo túnel começou a ser construído em 2017 foi visitada. Nenhuma alteração foi detectada no local.

Em 19 de maio, funcionários do Dmae utilizaram um georadar em ruas indicadas pela BM em busca de movimentações no terreno. Foi encontrado um local com desnível de cerca de três metros em um ponto no qual poderia haver conexão com o túnel velho. Nesta quarta-feira, escavações devem mostrar o que de fato está acontecendo no local.

Investigadores não descartam a participação de moradores e comerciantes do entorno do presídio. São monitoradas visitas de detentos que sairiam da cadeia com dinheiro que estar sendo destinado ao financiamento da obra subterrânea. O túnel de 2017 custou R$ 1 milhão.

Plano de fuga em massa interrompido em 2017

Ronaldo Bernardi / Agencia RBS
Túnel foi descoberto em 2017

Durante três meses, policiais do Departamento Estadual do Narcotráfico (Denarc) enfrentaram a angústia de suspeitar que um túnel estava sendo construído sem saber ao certo em que local e quando o plano de fuga de detentos do Presídio Central seria colocado em execução.

Depois de monitorar a movimentação de trabalhadores em uma casa, a Polícia Civil deflagrou operação em 22 de fevereiro de 2017 e frustrou a conclusão da obra. Sete homens e uma mulher foram presos no local.

A casa onde começava a obra do túnel está situada na Rua Jorge Luís Domingues, no bairro Aparício Borges. A estrutura já tinha 47 metros de comprimento em direção à cadeia. A polícia calculou, na época, que faltavam cerca de 60 metros para o túnel atingir o pavilhão em que estavam os detentos que financiaram a obra. Investigação apontou que o plano custou cerca de R$ 1 milhão e que a facção responsável, Os Manos, venderia espaço de fuga para membros de outras organizações.

Desde então, o governo já tentou por seis vezes contratar empresas para fechar a estrutura, mas não obteve sucesso.

O que é o georadar

Também conhecido como GPR, é um dispositivo que faz mapeamento de interferências e estruturas subterrâneas. Possui a capacidade de investigar terrenos e materiais com até 50 metros de profundidade. 

Por meio da propagação de ondas eletromagnéticas é possível descobrir objetos enterrados no subsolo, como tubulações, cabos, redes de água, esgoto, entre outros. Esse equipamento é muito utilizado na elaboração de projetos de engenharia, pois permite a sondagem do solo antes de escavações, diminuindo o custo operacional e 90% do tempo gasto para localizar as redes.

O georadar também tem sido útil na atualização do cadastro comercial em relação à área técnica. O dispositivo já auxiliou na localização e no cadastramento de diversas redes na cidade de Porto Alegre, além de encontrar ramais clandestinos e ligações irregulares, que interferem tanto na entrega de água com qualidade quanto na cobrança justa aos consumidores.


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