Polícia



Um ano de investigação

Exame de DNA, vingança e estrangulamento: polícia chega a homem que teria assassinado adolescente e Justiça nega pedido de prisão

Paola Roberta Lopes Faiet, 16 anos, foi morta dentro de casa em 14 de abril do ano passado, na Capital. Após confronto genético, polícia indiciou ex-cunhado da vítima pelo crime e juíza nega detenção

25/03/2021 - 07h00min


Jeniffer Gularte
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Arquivo Pessoal / Arquivo Pessoal
Paola, 16 anos, foi morta dentro de casa em 14 de abril do ano passado em Porto Alegre

O resultado de um exame de DNA gerou reviravolta na investigação do assassinato de uma adolescente de 16 anos​ em Porto Alegre e levou a Polícia Civil a chegar ao nome do​homem que teria cometido o homicídio. Paola Roberta Lopes Faiet foi encontrada estrangulada dentro de casa com um vestido, na tarde de 14 de abril do ano passado, no bairro Bom Jesus, na Zona Leste. Na época, o companheiro da vítima chegou a ser preso, apontado como principal suspeito do crime. Após quase um ano de apuração e 15 depoimentos, a coleta genética confirmou que o responsável pelo assassinato era, na verdade, outro familiar: o ex-cunhado de Paola, um homem de 21 anos, que não teve o nome divulgado pela polícia.

Corroborada por três testemunhas, que dizem ter visto o jovem no pátio da casa da adolescente na manhã da data em que ela foi morta, a prova técnica do Instituto-Geral de Perícias (IGP) motivou o pedido de prisão preventiva do suspeito. A solicitação, no entanto, foi negada nesta terça-feira (23) pela juíza Lourdes Helena Pacheco da Silva, da 2ª Vara do Júri do Foro Central de Porto Alegre, e o homem permanece em liberdade.

No pedido de prisão, o delegado Guilherme Gerhardt, titular da 1ª Delegacia de Homicídios de Porto Alegre, argumenta que, além da indicação de autoria, o suspeito reside próximo das testemunhas, também na Bom Jesus, o que, na visão dos investigadores, põe em risco as pessoas que se dispuseram a colaborar com o inquérito policial e também justifica sua prisão imediata.

No despacho, a magistrada afirma que o risco é uma suposição do delegado pois não há "nenhuma notícia no sentido de que o investigado tenha interferido nas investigações ou indicativo concreto de que possa interferir."

— Depois de meses de apuração de um crime hediondo, essa decisão vem como um balde de água fria para toda equipe policial. Uma adolescente de 16 anos morreu estrangulada, ou seja, o assassino matou com as próprias mãos, olhando nos olhos da garota que agonizou durante vários minutos. Isso demonstra frieza e crueldade — afirma o delegado Gerhardt.

A juíza ressalta também que não há demonstração de que o suspeito prejudicou o desenvolvimento da investigação, fez ameaças ou constrangeu testemunhas, informantes e peritos. Também pondera que o crime "é relativamente remoto no tempo", pois aconteceu há quase um ano. A prisão antes do julgamento, no entendimento da juíza, tem "sempre um sentido de urgência, de imprescindibilidade de uma reação imediata do Estado frente a uma situação, que não pode esperar" a eventual condenação, o que não se aplicaria nesse caso.

Quem está morta sou eu. Minha filha tinha 16 anos, era uma guria que estudava e vivia dentro de casa. Não fazia mal para ninguém. Só vou descansar quando o delegado me ligar e dizer que o culpado está preso. Não vai trazer minha filha de volta, minha dor será eterna, mas pelo menos vou saber que quem a matou está preso.

CLEUSA TEREZINHA FERREIRA LOPES

Mãe de Paola

Entre os policiais, a decisão da magistrada causou revolta por tratar-se de um crime investigado há quase ano e que tem autoria baseada em prova técnica. O diretor de Investigação do Departamento de Homicídios, delegado Eibert Moreira Neto, afirma que o posicionamento desmotiva a equipe que trabalhou na investigação e convenceu pessoas a depor no inquérito. Para Eibert, a juíza entende que a prisão preventiva deve ser utilizada em casos de exceção, porém, o delegado argumenta que o crime de homicídio também deve ser tratado como exceção:

— A leitura da legislação permite interpretações, mas deve ser mais voltada a preservar vidas. O indivíduo apontado como autor de homicídio deve ter tratamento diferenciado e, neste caso, isso é embasado por prova técnica. O DNA é irrefutável. A decisão nos deixa em descrédito perante os familiares e isso é grave. Não é simples convencer uma pessoa a prestar depoimento em um inquérito de homicídio. Em regra, autor, vítima e testemunhas de homicídios residem muito próximo uma da outra e isso está claro nesse fato. O indivíduo, autor do homicídio, vai ficar solto convivendo com as testemunhas.

A conclusão do inquérito

O inquérito, concluído nesta quarta-feira (24), indicia o homem por homicídio triplamente qualificado, por motivo torpe, asfixia e mediante simulação. Segundo a investigação, o crime foi motivado por vingança pois Paola teria interferido em uma briga entre o ex-cunhado e a irmã uma semana antes de ser morta. Testemunhas contam que o suspeito teria avisado Paola para não se meter na discussão do casal e a adolescente teria respondido que se intrometeria, sim, para defender a irmã. Na manhã do assassinato, o ex-cunhado teria batido na porta da casa de​ Paola dizendo que queria conversar com seu companheiro. Ele teria entrado na moradia e cometido crime.

O DNA é irrefutável. A decisão nos deixa em descrédito perante os familiares e isso é grave. Não é simples convencer uma pessoa a prestar depoimento em um inquérito de homicídio. Em regra, autor, vítima e testemunhas de homicídios residem muito próximo uma da outra e isso está claro nesse fato. O indivíduo, autor do homicídio, vai ficar solto convivendo com as testemunhas.

EIBERT MOREIRA NETO

Diretor de Investigação do Departamento de Homicídios

No inquérito, o ex-cunhado chegou a ser considerado testemunha até que os policiais passaram desconfiar de sua conduta. O homem foi convencido pelos investigadores a ir até o IGP. Para o delegado, o suspeito foi achando que não encontrariam material genético seu compatível com o da vítima, o que não se confirmou. Em depoimento à polícia antes de sair o resultado do DNA, o homem afirmou que teve um desentendimento com a vítima, mas que depois se acertaram, e que não sabe quem matou a adolescente.

Deste a data do crime, todo o dia 14 a família de Paola liga para a 1ª Delegacia de Homicídios em busca de informações. A mãe da garota, a dona de casa Cleusa Terezinha Ferreira Lopes, 44 anos, se diz decepcionada por não ver o homem preso:

— Quem está morta sou eu. É muito doloroso, estou de cama, depressiva, minha filha tinha 16 anos, era uma guria que estudava e vivia dentro de casa. Não fazia mal para ninguém. Não saia sem a minha autorização nem com o companheiro dela. Só vou descansar quando o delegado me ligar e dizer que o culpado está preso. Não vai trazer minha filha de volta, minha dor será eterna, mas pelo menos vou saber que quem a matou está preso.

GZH contatou a o Tribunal de Justiça. Por meio da assessoria de imprensa da instituição, a juíza Lourdes Helena Pacheco da Silva se manifestou por nota. Leia: 

 "Trata-se de investigação do homicídio de consumado, ocorrido em abril de 2020, no Bairro Bom Jesus, em Porto Alegre. Aportou, em juízo, pedido de prisão preventiva, no dia 22/03/2021, o qual restou indeferido, basicamente pela ausência de contemporaneidade entre a ocorrência do crime e o requerimento. O pedido baseou-se em provável manipulação, por parte do acusado, de uma informante, bem como pelo risco gerado pelo fato dele residir próximo de familiares da ofendida. Contudo, conforme restou consignado na decisão, não há nenhum indicativo concreto de que, neste período de quase um ano, o investigado tenha interferido nas investigações ou de que possa interferir.
A decisão é bastante fundamentada, nos termos do artigo 93 da Constituição Federal.
A imprensa é um mecanismo democrático de trânsito e esclarecimento de informações. Todavia, a midiatização de investigações criminais pode ter efeitos nefastos para a descoberta da verdade, militando contra a independência judicial e podendo chegar ao ponto de exercer indevida pressão sobre o Poder Judiciário e seus agentes.
Ademais, a decisão judicial está submetida a recurso, sendo esta a via legal para eventual insurgência e análise do mérito da decisão
". 


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