Polícia



Cárcere privado

 Casal é preso em Esteio por torturar e manter mulher em situação análoga à escravidão

Vítima, que é deficiente física, tinha benefícios usados pelos dois e sofria abusos sexuais. Filho dos suspeitos, de 16 anos, foi apreendido

23/06/2021 - 07h00min


Cid Martins
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Ronaldo Bernardi / Agencia RBS
Polícia Civil prendeu nesta terça-feira, de forma temporária, casal suspeito em Esteio

Um casal foi preso nesta terça-feira (22), em Esteio, na investigação sobre o caso de uma mulher, de 51 anos, resgatada na semana passada em situação análoga à escravidão. O filho deles, de 16 anos, foi apreendido e encaminhado para internação devido a atos infracionais.

A vítima é deficiente física e precisa se arrastar para conseguir se locomover. Mesmo assim, era obrigada a trabalhar em casa e em uma reciclagem de lixo, das 7h às 23h, sendo mantida em cárcere privado.

A mulher tinha marcas de agressões nas costas e, segundo a polícia, sofreu duas tentativas de homicídio e foi abusada sexualmente. Ela ainda teve benefícios sociais usados pelo casal investigado.

Uma adolescente de 14 anos, que é deficiente visual e seria familiar da mulher detida, estava na mesma casa e foi encaminhada para um abrigo. Ela está recebendo atendimento médico e psicológico.

— Em 12 anos de polícia, nunca vi situação igual. A gente, enquanto ser humano, enquanto policial, não tem como não ficado chocado. Essas situações me dão força para investigar, ir atrás e prender estes suspeitos — diz a titular da Delegacia de Esteio e responsável pelo caso, delegada Luciane Bertoletti.

A vítima — que está tendo o nome preservado — foi resgatada na terça-feira passada após uma denúncia. Logo depois, o casal investigado fez um saque do benefício federal que a mulher recebe, além de ter feito um empréstimo bancário no nome dela.

Ronaldo Bernardi / Agencia RBS
Polícia apreende corrente usada em agressões à vítima em Esteio

Inquérito policial e prisões

Um inquérito foi instaurado e, com os depoimentos das duas vítimas, dos denunciantes e de testemunhas, além de exames periciais, foi possível comprovar os crimes. A delegada Luciane diz que obteve ordens judiciais de busca, prisão temporária e para internação do filho do casal.

Na manhã desta terça-feira, ocorreram as prisões e a apreensão do adolescente, todos que estariam envolvidos nas agressões à vítima. O objetivo agora é saber os valores que foram subtraídos da mulher, bem como se a menina de 14 anos que estava na casa também teve benefícios usados pelos investigados e se foi vítima de abusos.

Segundo a delegada, a mulher era do Interior e passou a morar em Esteio com o marido. Ela teria sido abandonada por ele e, há aproximadamente cinco anos, foi convidada pelos vizinhos — o casal suspeito — para morar com eles.

Logo na sequência, teve a casa vendida e o dinheiro usado pelos suspeitos, assim como os benefícios. A mulher fazia os serviços domésticos, cuidava de porcos e dos cães, além de ter que trabalhar em uma reciclagem de lixo dos investigados.

— Ela apanhava de relho, tem várias marcas nas costas, está com infecção urinária, além de passar a ser abusada sexualmente pelo adolescente de 16 anos, filho do casal. Em duas situações, em que o homem entendeu que o serviço da vítima não estava sendo realizado corretamente, ele atirou duas vezes contra ela, por sorte acertou a parede da residência — ressalta Luciane.

O casal responde pelos crimes de tortura, estelionato, furto qualificado e trabalho análogo à escravidão. O adolescente internado responde pelo ato infracional de abuso sexual.

Os detidos não tiveram os nomes divulgados para não identificar o adolescente, conforme determina o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Denúncias

 Denúncias sobre trabalho análogo à escravidão podem ser feitas pelo Disque 100 ou nos sites do MPT e da Auditoria-Fiscal do Trabalho do Ministério da Economia.  Denúncias de abuso, cárcere e tortura podem ser feitas pelo fones 181 ou 197 ou pelo site da Polícia Civil

Situação análoga 

O MPT considera situação análoga ao trabalho escravo por não existir mais escravidão. Portanto, é um trabalho similar, mesmo sem restrição de liberdade. Porém, ocorrem trabalhos forçados mediante ameaça, por dívida, submetidos à condição degradante, sem moradia decente, sem higiene, banheiro, sem normas de segurança e saúde e com jornada exaustiva, extenuante, como no corte de cana que leva pessoas à morte devido a horas por dia em exposição ao sol. 



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