Polícia



Três anos depois

Justiça manda a júri réus pelo assassinato de bebê e de seus pais em saída de festa de aniversário em Porto Alegre

Com apenas um ano, Alice Beatriz Paines Araújo foi morta a tiros, assim como o pai Douglas Araújo da Silva, 29, e a mãe Sabrine Paines Rodrigues, 24

22/09/2021 - 07h00min

Atualizada em: 22/09/2021 - 07h00min


Leticia Mendes
Arquivo Pessoal / Divulgação
Sabrine Panes Rodrigues com a filha Alice Beatriz e o companheiro Douglas Araújo da Silva em festa

A Justiça determinou que cinco réus devem ir a júri pelo assassinato de Alice Beatriz Paines Araújo, de um ano, e de seus pais, Douglas Araújo da Silva, 29, e Sabrine Paines Rodrigues, 24. O crime aconteceu há quase três anos, em 23 de setembro de 2018, na saída da festinha de aniversário da bebê, na zona norte de Porto Alegre. Os cinco serão julgados por três homicídios triplamente qualificados — pela morte da criança ainda há possível aumento de pena, em caso de condenação, por se tratar de menor de 14 anos.  

Respondem pelo crime Maycon Azevedo da Silva, o Dime, 26 anos, Leandro Martins Machado, o Mandy, 31, Nícolas Teixeira da Rosa, o Ovelha, 26, Anderson Boeira Barreto, o Boquinha, 29, e Michel Renan Bragé de Oliveira, o Bragé, 24. Em março do ano passado, o processo foi dividido, por conta do envio de Émerson Alex dos Santos Vieira, o Romarinho, para penitenciária federal — apontado como responsável por planejar o crime, ele responde separadamente dos demais. GZH aguarda retorno do Tribunal de Justiça sobre o andamento deste segundo processo.  

Em relação aos cinco réus, a decisão de mandá-los para o Tribunal do Júri é do juiz Marcos Braga Salgado Martins, da 3ª Vara do Júri de Porto Alegre. No entendimento do magistrado, ainda que todos os acusados neguem ter cometido o crime, há "prova da materialidade" e "indícios suficientes de autoria". Neste caso, caberá aos jurados analisar as versões apresentadas pelos réus e suas defesas. No mesmo documento, chamado de sentença de pronúncia, o juiz negou pedidos de soltura dos réus e definiu que todos devem seguir presos. Também manteve a ordem de prisão do réu Leandro, até então foragido.  

Segundo a acusação, Michel Renan, Maycon e Anderson teriam planejado o crime com os comparsas, e ido até o local da festa da criança, armados. Após perseguição, teriam sido os responsáveis por atirar contra o carro onde estavam os pais e a bebê. Áudios obtidos durante a apuração indicam que a o crime teria sido planejado. Já Nicolas, é apontado como o responsável por fornecer e dirigir um dos veículos durante a execução. Leandro teria sido responsável por vigiar as vítimas durante a festa e alertar os demais sobre a saída deles. O entendimento da Justiça é de que todos concorreram para as execuções.    

Os cinco réus também eram acusados de formarem associação criminosa, no entanto, neste caso o entendimento do juiz foi de que não foram apresentados indícios suficientes deste crime. "Muito embora haja nos autos elementos bastantes a indicarem a prática dos crimes de homicídio pelos denunciados, suficientes à pronúncia desses, não há mínima demonstração nos autos de que os réus mantivessem liame estável e permanente, com vista à prática de crimes", ponderou o magistrado na decisão.  A data do julgamento deverá agendada pela Justiça.

Depoimentos  

Três anos após terem perdido o filho, a nora e as netas  — além de Alice, Sabrine estava grávida de outra menina — os pais de Douglas seguem se mudando constantemente, com medo de represálias. Os avós, assim como outros familiares das vítimas, também foram ouvidos ao longo da instrução do processo.  

— A gente continua sofrendo. É horrível. Mataram duas bebês, sem piedade, sem dó, nem nada. Na audiência lá, ficaram me intimando, eu e minha mulher. Esperávamos que eles também fossem para a prisão federal, que ficassem isolados. Quero que eles paguem, pela maldade que fizeram, pela dor que eu carrego — diz o avô.  

Embora a festa de aniversário de Alice tenha sido realizada no dia 23, a data de nascimento da criança é 18 de setembro. O dia, segundo o avô, é um dos mais difíceis.  

—  Só quem perde para saber. Queriam matar, executar a família. Se nós estivemos no carro, matariam todo mundo. Nunca vi tanto tiro num carro. Coisa mais horrível. A dor é muito grande. Não tem como entender isso, nunca — diz o avô.  

Durante a audiência na qual foi ouvida, a mãe de Douglas também falou sobre a necessidade de trocar de endereço constantemente, em razão das ameaças sofridas pelo filho. A avó disse que se sente culpada, por ter preparado a festinha para a neta.  

—  A bebê nem caminhava. Eles não mataram só o meu filho, a minha neta e a minha nora, eles me mataram também — disse.  

As qualificadoras

Motivo torpe  — segundo a acusação, o crime foi motivado por desavenças envolvendo disputas pelo tráfico de drogas. Conforme a sentença de pronúncia, Douglas era alvo da ação por pertencer à facção rival aos criminosos. Ele já havia sido preso por tráfico de entorpecentes e, quando foi morto, estava na condição de foragido.  

Perigo comum — a Justiça entendeu que os acusados efetuaram diversos disparos de arma de fogo contra as vítimas em via pública, colocando em risco a vida de terceiros que não possuíam relação com o fato.  

Emprego de emboscada e recurso que dificultou a defesa das vítimas  — segundo a acusação, os executores vigiaram a movimentação das vítimas, aguardando o momento para o ataque, além de estarem em maior número de pessoas e portando armas.  

O crime  

A família foi atacada tão logo deixou o salão da festa. Douglas dirigia um Ka prata. Sabrine e a filha estavam na carona. O veículo passou a ser perseguido por outro Ka e uma Ecosport. Douglas perdeu o controle do carro e bateu em árvores na Rua Cacilda Yaconis Becker. Na sequência, criminosos armados e fardados como policiais civis desembarcaram. Foram mais de 50 disparos com pistolas 9 milímetros e fuzil 5.56. Dentro do salão onde tinha acontecido o aniversário, convidados ouviram os tiros e correram para saber o que havia ocorrido. Alice e os pais foram encontrados mortos dentro do veículo.  

Contrapontos  

O que diz a defesa de Anderson Boeira Barreto

A defesa sustentou à Justiça a ausência de provas da autoria dos crimes. Pediu, com base nisso, a absolvição sumária ou impronúncia. Também pediu afastamento das qualificadoras e a concessão do réu ao direito de apelar em liberdade. Quando interrogado, Anderson negou envolvimento. GZH tenta contato com o advogado Brian Vinícius da Silva de Miranda.  

O que diz a defesa de Leandro Martins Machado

À Justiça, a defesa sustentou que não há provas nos autos da participação do cliente. Durante a instrução, a defesa apresentou testemunhas, que informaram que Leandro estaria trabalhando na lancheria da mãe na noite do crime. Ainda assim, a Justiça entendeu que esses relatos não permitem afastar de forma imediata a acusação contra o réu. Leandro não pode ser ouvido durante a instrução processual para apresentar sua versão, por estar foragido. GZH tenta contato com o advogado Marcelo Wojciechowski Dorneles da Silva.

O que diz a defesa de Maycon Azevedo da Silva

A defesa do réu pediu a absolvição sumária ou impronúncia do acusado, e alegou que não há provas da participação dele nos crimes. Em seu interrogatório judicial, o réu se reservou ao direito de permanecer em silêncio. GZH tenta contato com a advogada Aline Pereira Jurgensen.

O que diz a defesa de Michel Renan Bragé de Oliveira

A defesa alegou à Justiça total ausência de indícios de que ele seja o autor do crime. Pediu a impronúncia ou absolvição sumária do réu, além do afastamento de qualificadores e revogação da prisão preventiva. O réu optou por não se submeter ao interrogatório judicial. GZH entrou em contato com a advogada Tatiana Vizzotto Borsa e aguarda retorno.  

O que diz a defesa de Nicolas Teixeira da Rosa

À Justiça, a defesa sustentou que não existem provas do envolvimento do réu no crime e pediu a absolvição do cliente, além da revogação da prisão preventiva. Quando interrogado, Nicolas negou participação. A advogada Hevelin Ferreira enviou nota sobre o caso. Confira:

"A defesa de Nicolas Teixeira da Rosa vem a público esclarecer que apesar de ter sido prolatada sentença de pronúncia, não significa que foi provada a participação de Nicolas Teixeira da Rosa no crime em questão, mantendo-se, assim, a coerência com a defesa do princípio constitucional da presunção de inocência. No que se refere à sentença de pronúncia, quem vai decidir sobre a participação ou não de Nicolas Teixeira da Rosa, serão os jurados, com base nas provas que instruem o processo o que será comprovado que o mesmo não teve qualquer participação no crime."


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