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Um ano após prisão, ginecologista é condenado por violar sexualmente nove pacientes em Canguçu

Cairo Roberto de Ávila Barbosa, 66 anos, foi detido em junho do ano passado, após série de denúncias de mulheres

26/06/2022 - 14h39min

Atualizada em: 26/06/2022 - 14h40min


Leticia Mendes
GZH
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Marco Favero / Agencia RBS
Em 1º de junho de 2021, GZH esteve em Canguçu e a clínica de Cairo Roberto de Ávila Barbosa não estava mais funcionando

Um ano após ser preso por suspeita de ter abusado de pacientes durante atendimentos em Canguçu, no sul do RS, o ginecologista Cairo Roberto de Ávila Barbosa, 66 anos, recebeu a sentença por violação sexual de nove pacientes. A Juíza de Direito Hélen Fernandes Paiva, da 1ª Vara Judicial da Comarca do município, o condenou a 16 anos e cinco meses de prisão, em regime fechado, além de indenizar em R$ 25 mil cada uma de suas vítimas. O réu está preso e não poderá apelar em liberdade. Segundo a defesa do médico, ele nega que tenha cometido os crimes.

Como as denúncias envolvendo 19 mulheres que alegam terem sido vítimas dele foram recebidas separadamente, o médico, que nega os crimes, tornou-se réu em três processos. Agora restam mais dois para a Justiça decidir se ele é ou não culpado.

A denúncia, objeto do julgamento do primeiro processo, foi aceita pela Justiça em junho do ano passado, momento em que também foi decretada a prisão preventiva do acusado. Desde então, Barbosa segue no Presídio Estadual de Canguçu. É nesta condição que ele aguarda o desfecho dos processos. O médico é acusado de ter abusado sexualmente das pacientes durante atendimentos realizados tanto no Hospital de Caridade de Canguçu, como em sua clínica particular que mantinha na área central do município.

Segundo a juíza, as vítimas "relataram terem a sensação de que o procedimento adotado era, no mínimo, estranho, contudo não tiveram a certeza de que se tratava de um abuso sexual, já que tentaram acreditar no procedimento adotado pelo renomado médico".

Na sentença, a magistrada também destaca que após o recebimento da denúncia pela Justiça, "centenas de denúncias surgiram após o caso vir à tona, de mulheres de variadas localidades, inclusive de fora do Estado do Rio Grande do Sul, o que afasta a existência de eventual grupo criminoso voltado para tirar dinheiro do réu, como levantado pela defesa pessoal do réu". "Inviável acatar a tese de que houve consentimento por parte das vítimas, justamente em razão da fraude empregada, que impossibilitava a imediata identificação do abuso sofrido, levando as vítimas a acreditarem, ou esforçarem-se para acreditar, que o que estava acontecendo era normal", acrescentou.

Como as denúncias foram agrupadas

O primeiro processo, que teve denúncia encaminhada em maio do ano passado, envolve quatro mulheres. Neste caso, o réu responde pelo crime de violação sexual mediante fraude, delito diverso do estupro, por não envolver violência. Segundo a acusação, o médico teria alegado que se tratava de um procedimento de exame para abusar das pacientes. Pelo menos duas mulheres que constam nessa ação estavam grávidas quando foram atendidas.

Foi esse processo que levou a promotora Luana Rocha Ribeiro a pedir o afastamento do profissional do hospital do município e também a suspensão da licença médica. As duas solicitações foram atendidas pelo Judiciário e Barbosa deixou de realizar atendimentos na cidade. Até então, não havia pedido de prisão contra o médico. Com a investigação em andamento por parte da Polícia Civil, novos relatos de mulheres foram recebidos.

No mês seguinte, mais duas denúncias, com total de 15 mulheres, foram levadas à Justiça. Na primeira delas, no dia 14 de junho, foram apontadas outras oito vítimas, todas moradoras de Canguçu. Além da violação sexual mediante fraude, em relação a uma das pacientes o Ministério Público entendeu que houve estupro de vulnerável. A jovem, na época com 20 anos, estava numa gestação de 37 semanas e cinco dias, em início de trabalho de parto, quando, ao procurar o hospital de Canguçu, acabou atendida pelo médico, que estava no plantão. Naquele momento, o ginecologista teria forjado realizar um exame para abusar da paciente.  

Estes casos levaram o MP a pedir a prisão preventiva do médico, por entender que ele vinha agindo de forma reiterada contra as pacientes. O pedido foi aceito pela Justiça e Barbosa foi detido em 17 de junho na Praia do Cassino, em Rio Grande. Ainda no ano passado, o Conselho Regional de Medicina do RS (Cremers) passou a apurar a conduta do médico. Na última sexta-feira (24), o conselho confirmou que a sindicância segue em andamento.

"Não pensei que seríamos tão julgadas", diz vítima

Uma das vítimas que consta no primeiro processo movido contra o médico, uma moradora de Canguçu vive um misto de sentimentos. Ao longo do último ano, diz que se sentiu confortada ao ver mais mulheres se encorajaram a buscar ajuda da polícia em outros casos envolvendo médicos no Estado, mas, ao mesmo tempo, sofre com os julgamentos.

— Denúncias começaram a aparecer depois que denunciamos aqui. Começaram a cair os médicos nas outras cidades. Parece que encorajou outras mulheres. Mas, por outro lado, tem esse julgamento. Não achei que seria tanto. Sabia sim que seria julgada, mas não achei que seria tanto o julgamento. Valer a pena, valeu porque ele foi preso, mas o que passamos nesse um ano, não é fácil — diz.

Em 2017, grávida, a mulher procurou a clínica do ginecologista e, durante o atendimento, conta que ele pediu para que ela se despisse e deitasse em uma maca. Ali, o médico teria dito que precisava estimular seu corpo para que conseguisse fazer coleta de material. Neste momento, teriam iniciado os abusos. Depois disso, a paciente conta ter sofrido com depressão, síndrome do pânico e insônia. Ela foi uma das que procurou a polícia para relatar o que havia acontecido. Depois disso, no município de 56 mil habitantes, a cerca de 50 quilômetros de Pelotas, a revelação do caso no ano passado se tornou o principal assunto.

— O que passamos, parece que somos nós as culpadas. O único ponto bom é que ele continua preso — afirma.

Contraponto

O advogado Gustavo Goularte, um dos responsáveis pela defesa do médico, informou que só se manifestará nos autos do processo. Quando foi ouvido na Justiça sobre os fatos apontados pelas mulheres, o ginecologista negou que tenha cometido os crimes, mesma versão que havia apresentado à Polícia Civil durante a investigação.


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