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Crise climática

Nova "supertempestade" afeta um terço dos municípios gaúchos e deixa mais de 3 mil desabrigados

Nível do Guaíba em Porto Alegre atingiu maior marca desde a enchente de 1941, com 3m30cm no fim da tarde desta segunda-feira

20/11/2023 - 22h15min


Marcelo Gonzatto
Marcelo Gonzatto
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A violência climática que marca o ano no Rio Grande do Sul, responsável por inundações raramente vistas, voltou a provocar impactos históricos nos últimos dias.

As tempestades que despejaram enormes volumes de chuva causaram estragos em um terço dos municípios gaúchos, deixaram pelo menos quatro vítimas confirmadas até esta segunda-feira (20) e causaram danos significativos na infraestrutura do Estado. Mais de 70 pontos de rodovias chegaram a ficar bloqueados total ou parcialmente, cerca de 3,7 mil pessoas seguiam desabrigadas até o final da tarde e municípios que ainda se recuperavam da enxurrada mortífera registrada em setembro voltaram a ficar submersos. 

Na Capital, o Guaíba atingiu o maior nível desde a notória enchente de 1941. O governador Eduardo Leite sobrevoou algumas das áreas mais comprometidas pela chuva ao longo do dia.

Conforme o climatologista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Francisco Eliseu Aquino, os gaúchos foram castigados pelo mesmo tipo de fenômeno que atingiu o Estado entre os dias 4 e 5 de setembro e deixou 52 mortos. É um tipo específico de "supertempestade" classificada cientificamente como complexo convectivo de mesoescala e caracterizada pelo grande acúmulo de nuvens capazes de provocar vendavais e chuvarada em uma grande área — que, em média, atinge uma dimensão equivalente a todo o território do Rio Grande do Sul.

— Foram sistemas que se formaram e foram evoluindo na noite e madrugada de sexta (17) para sábado (18) — afirma Aquino.

Mas os efeitos do mau tempo – potencializado pela combinação entre as mudanças climáticas e o El Niño (aquecimento das águas do Pacífico) — já haviam começado a provocar perdas materiais e de vidas alguns dias antes. No dia 15, uma mulher morreu quando um centro esportivo desabou durante outro temporal em Giruá, na região Noroeste.

Desde aquela data até o sábado (18), 158 prefeituras relataram algum tipo de prejuízo causado pelas chuvaradas que varreram o território gaúcho por todos os quadrantes, mas concentraram os piores efeitos em regiões como Vale do Taquari, Metropolitana e Serra. As cidades de Muçum e Roca Sales, devastadas menos de três meses atrás por uma torrente irrefreável de água extravasada do leito do Rio Taquari, voltaram a ficar parcialmente submersas.

Mas, desta vez, o mau tempo espalhou seus impactos por uma área ainda mais ampla. No município de Eldorado do Sul, na Região Metropolitana, 2,4 mil tiveram de deixar suas casas. Em São Sebastião do Caí, no Vale do Caí, o rio que empresta o nome à cidade subiu a 16m durante a madrugada de domingo, desabrigou quase 500 pessoas e atingiu a maior marca já registrada no local.

Inundação histórica na Capital

Porto Alegre, que havia fechado suas comportas de proteção contra cheias apenas dois meses antes, voltou a testemunhar o transbordamento do Guaíba em direção à sua malha urbana, atingido a marca de 3m30cm no fim da tarde – contra 3m18cm verificados em setembro, mas ainda abaixo do patamar recorde de 4m75cm. Na Zona Norte, onde uma das barreiras metálicas não foi acionada a tempo, a água avançou em direção à Avenida Voluntários da Pátria. As ilhas registraram vários pontos de inundação, como a da Pintada, e havia risco de o nível do Jacuí atingir um trecho da nova ponte do Guaíba.

As intempéries também voltaram a causar mortes, ainda que em patamar bastante abaixo ao do episódio anterior. A Defesa Civil contabilizava quatro vítimas até a tarde desta segunda. Além da ocorrência em Giruá, outras duas mulheres foram soterradas dentro de casa, em Gramado, e um homem tentou atravessar um ponto de inundação com o carro e acabou arrastado em Vila Flores. Até a noite de domingo, a contabilidade oficial indicava ainda 63 pessoas feridas e mais de 194 mil afetadas direta ou indiretamente por chuva, vendaval, enxurrada, inundação ou soterramentos.

Os danos também foram extensos sobre os sistemas de infraestrutura. Além de pelo menos cem mil clientes terem ficado sem luz, o sistema viário foi duramente afetado por inundações e deslizamentos de terra. Cidades como Nova Roma do Sul, que já havia testemunhado uma ponte ser arrastada na enxurrada de setembro, desta vez perdeu o acesso a Nova Pádua e ficou praticamente isolada, com ligação por terra restrita a Antônio Prado via RS-448. Até a manhã de segunda, 48 trechos de rodovias estaduais ou federais seguiam com interrupções totais ou parciais em diferentes pontos do Estado.



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