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Série especial

Invisíveis: Vergonha na cara

A falta de dinheiro, de casa digna e comida para os filhos gera constrangimentos - mesmo para pessoas que recebem dinheiro do governo e continuam vivendo na linha da pobreza

18/04/2013 - 07h26min

Atualizada em: 18/04/2013 - 07h26min


Vanessa vive com os dois filhos numa casa sem janela e sem banheiro, na Restinga

No segundo dia da série que retrata a pobreza em Porto Alegre, o Diário Gaúcho mostra
a história de pessoas que, mesmo com ajuda do governo, como o Bolsa Família, ainda
enfrentam situações definidas por elas como humilhantes. Se escondem por não ter banheiro em casa e dividir o teto com ratos. Sentem vergonha de receber dinheiro de programas sociais porque não conseguem sustentar os filhos.

Se a presidente Dilma Rousseff comemorou, em 19 de fevereiro passado, o fim da pobreza extrema para 2,5 milhões de beneficiários do Bolsa Família (pelo menos outros 2,5 milhões continuam nesta situação), a reportagem comprova hoje que esta página da história ainda não foi virada para várias famílias de Porto Alegre.

GALERIA: Veja mais fotos de como vivem os Invisíveis
DIA 2: Quem são essas famílias que trazem a vergonha no rosto

Antes de sair com um balde de dentro da casa de papelão, revestida de lona, a frentista desempregada Vanessa da Cruz Barbosa, 30 anos, enfia a cabeça pela única abertura do casebre e olha para os dois lados da Vila Chácara dos Pinheiros, no Bairro Restinga, no Sul da Capital. Apesar de fazer isso várias vezes por dia, envergonha-se de jogar no pátio o que deveria ter sido feito num vaso sanitário. Vanessa sente vergonha por não ter um banheiro para os filhos Lorenzo, dois, e Laion, seis anos.

Vivendo há um ano no casebre sem janelas, a ex-frentista sobrevive com R$ 210 do Bolsa Família. E luta para se aposentar no INSS. Com problemas de audição desde o nascimento, Vanessa teve seu calvário aumentado ao descobrir que tem uma doença degenerativa que afeta neurônios, causando rigidez dos músculos, o que restringe seu caminhar e engolir.

- Vivemos em área de extrema miséria. O pior é morar numa casa sem janela e sem saneamento básico - desabafa Vanessa.

O mesmo sentimento de vergonha é compartilhado por Fabiana Nunes da Silva, 32 anos, viúva, mãe de oito filhos: Ezequiel, 16 anos, Dienifer, 14, Dionathan, 13, Alexsander, 11, Gabriel, seis, Daniel, quatro, Alejandro, um, e Mateus, dois meses. E é avó de Miguel, seis meses, filho de Dienifer. Moradora de uma área de risco às margens da BR-290, na Ilha do Pavão, Fabiana perdeu o emprego de serviços gerais no contrato de experiência, quando soube da última gravidez.

Hoje, vive com R$ 630 - parte pensão de dois dos filhos e parte Bolsa Família. Porém, o dinheiro não é suficiente para tirar a família da extrema pobreza - R$ 63 mensais por integrante. Pobre é acima de R$ 70. Cabisbaixa, Fabiana alega:

- Pobreza é não ter emprego, não poder sustentar sozinha meus filhos. Ganho ajuda do governo, mas isso não pode ser para sempre. Preciso sair desta situação.

Frestas e ratos

Por estarem no Bolsa Família, Vanessa e Fabiana já deveriam ter deixado a linha da
extrema pobreza, de acordo com os critérios do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).

Conforme o órgão, os 2,5 milhões de beneficiários brasileiros que permaneciam nessa situação passariam a receber em março um complemento no valor mensal para ultrapassarem a linha. Desses, garante o MDS, 5.125 famílias - 9.104 pessoas - eram de Porto Alegre. Porém, isso ainda não havia ocorrido com Vanessa e Fabiana até ontem. Na família do catador Marco Antônio Marcelino Rolim, 45 anos, também da Ilha
do Pavão, o sentimento de vergonha segue de mãos dadas com o medo.

A mulher, Cinara de Oliveira, 38 anos, e os cinco filhos evitam falar da convivência
permanente com baratas, ratos e outros animais peçonhentos que se criam em meio ao lixo espalhado pelo pátio e entram pelas frestas da casa de madeira - equilibrada sobre palafitas de 2m de altura.

A filha Talia, dez anos, carrega até hoje nos pés as marcas das mordidas de ratos sofridas quando ainda era um bebê. O único que comenta a situação da família é o próprio catador.

- Já fui mordido por ratinho pequeno enquanto eu estava dormindo. Acho que o lixo acaba atraindo eles, mas não tenho o que fazer. Só me resta o medo - deixa
escapar Marco Antônio.

* Leia a reportagem completa no Diário Gaúcho desta quinta-feira, 18 de abril.


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