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Setor da beleza é mais uma das vítimas da crise: clientes somem e número de salões fechados dispara

Com aumento de 213% no fechamento de salões na Capital nos últimos quatro anos, setor sofre com sumiço dos clientes. Só em 2016, 44 salões já encerraram suas atividades em Porto Alegre

12/03/2016 - 10h01min

Atualizada em: 12/03/2016 - 10h01min


Jeniffer Gularte
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Tadeu Vilani / Agencia RBS
Salão de beleza de Iara, no Bairro Cristal, amarga com a queda de clientes

Nem o mercado da vaidade escapou da crise que vem afetando o país. Se no começo da década, o Diário Gaúcho noticiou o boom das concessões de alvarás para salões de beleza em Porto Alegre, mostrando que ingressar no setor era prenúncio de bom negócio, agora o cenário é bem menos promissor. O ritmo da economia está contribuindo para o esvaziamento e fechamento salões na Capital.

Entre 2012 e 2015, o fechamento destes estabelecimentos aumentou 213% - 229 extintos no ano passado ante 73 em 2012 -, ao mesmo tempo em que houve queda de 26% no número de aberturas. Os dados da Junta Comercial do Rio Grande do Sul, solicitados pela reportagem, mostram ainda que, em 2016, 44 salões já fecharam as portas Porto Alegre.

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Segundo a Secretaria Municipal da Produção, Indústria e Comércio (Smic), existem 8.607 salões de beleza que possuem alvará de funcionamento em Porto Alegre.

- Acredito que fomos os últimos a serem atingidos pela crise, porque todo mundo precisa se embelezar. Mas, se a gente está sentindo isso, é porque a crise está forte - avalia o presidente do Sindicato dos Salões de Barbeiros, Cabeleireiros, Institutos de Beleza e Similares do Estado do Rio Grande do Sul (Sinca), Marcelo Francisco Chiodo.

Segundo ele, os salões com poucos anos de existência são os mais vulneráveis à crise. Para quem está há mais tempo no mercado, a clientela fiel, mesmo não indo ao salão com mesma frequência, ainda mantém o faturamento. Só nos dois primeiros meses do ano, Marcelo calcula que o movimento e o faturamento dos salões tenha caído mais de 15%, reforçando o cenário pessimista já apontado pelos dados da Junta Comercial.

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Hora de se profissionalizar

A crise impõe aos salões uma conta que não fecha: de um lado, a debandada dos clientes, e de outro, o aumento de impostos, da conta da luz e os produtos cada vez mais caros. Neste cenário, é necessário ir muito além da técnica. O profissional precisa saber administrar seu negócio, pontua a docente do curso de Imagem Pessoal do Senac Centro Histórico, Fabia Vieira Coelho:

- Um dos fatores mais comuns é o estoque não mensurado, por exemplo, quando a pessoa não consegue prever a compra do produto para a demanda que ela tem. Isso precisa ser previsto de acordo com o perfil de atendimento de cada temporada.

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É justamente o maior espaçamento de atendimentos no salão que pede mais noções de gestão do negócio, acredita o técnico do Sebrae e gestor de projetos Lucas Alves.

- É um setor mais amador que está começando a se organizar. São pessoas que têm perfil técnico e que só no ano passado começaram a sentir mais a crise - avalia.

O sumiço dos clientes de Iara

Para quem já precisou trabalhar até de madrugada para dar conta da clientela, ver o salão cada vez mais vazio é angustiante. A cabeleireira Iara Inês Hinterholz, 50 anos, com experiência na área desde os 14, atualmente chega a ficar três dias sem atender ninguém. Com tanto tempo de mercado, jamais imaginou ter que ficar à espera de trabalho:

- Eu não parava nunca e hoje (quinta-feira passada) não tenho nada marcado.

O salão no Bairro Cristal, na Zona Sul da Capital, especializado em maquiagem definitiva, coloração e mechas de cabelo, enfrenta o reflexo da crise e tem transformado inclusive a vida pessoal de Iara. 

-  Antes, eu ia no supermercado e comprava tudo em grande quantidade, para nunca faltar nada. Hoje, é só o necessário. Deixei de gastar R$ 400 para no máximo R$ 200, até verduras e legumes deixei de comprar - conta ela, que mora com a filha Laura, 19 anos, estudante de Fisioterapia.


Além de sustentar a casa, precisa ajudar na mensalidade do curso superior da filha e manter os produtos no salão. Por usar itens de qualidade, garante que não tem como baixar preços. 

- Consigo me manter, mas de forma bem apertada. Estou investindo bem menos no salão, compro só o básico para nenhum produto ficar parado. É muito triste. Tem um monte de cliente que vem aqui tomar café comigo, mas não faz nada. Dizem que vão deixar para retocar a raiz (do cabelo) só na Páscoa, e assim vão indo - relata.

Priscila abriu mão do salão e faz hidratação em casa

Se para Iara está ruim, para a cliente, a advogada Priscila Vargas, 25 anos, economizar no salão de beleza foi uma das alternativas para cortar gastos enquanto procura emprego. Fazendo as unhas e sobrancelha uma vez por semana e hidratação e tintura no cabelo a cada 30 dias, gastava ao menos R$ 300 mensais no salão. Esse dinheiro agora tem outras prioridades:

- De uns tempos para cá, precisei privilegiar outras coisas. Hidratação estou fazendo em casa, comprei os produtos e eu mesma faço. Só não me arrisco a cortar o cabelo sozinha, mas tenho amigas que já cortam em casa.

Priscila economiza, mas lamenta ter que abrir mão do conforto. Nesse caso, porém, é o bolso quem fala mais alto.

- Só não abri mão de fazer a escova progressiva a cada três meses - afirma.

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Salão dando espaço para o artesanato

O movimento no salão do casal de cabeleireiros Ana Claudia Fialla, 38 anos, e Alessandro Pereira, 43 anos, minguou tanto que eles decidiram migrar para outra atividade usando o espaço do próprio local de trabalho.

Junto com o salão que existe há 12 anos, no Bairro Independência, começaram a fazer artesanato. Com peças que variam de R$ 10 a R$ 150,  produzem almofadas, lancheiras, enfeites, conjuntos de banheiro e cozinha. A experiência deu tão certo que o ateliê já ocupa 70% do espaço que antes era apenas do salão. 

- Ao longo do ano passado o serviço começou a despencar. Não perdemos clientes, mas quem vinha de 20 em 20 dias para fazer coloração, está vindo de 40 em 40. Quem vinha fazer escova uma vez por semana, só aparece quando tem um evento - comenta Alessandro.


Foi para não deixar a peteca cair que em outubro do ano passado o artesanato que Ana já sabia fazer virou negócio. Hoje, ele desenha as peças e os dois costuram, cada um em sua máquina. Ana admite que sua vocação ainda é ser cabelereira mas, nesse momento, a necessidade financeira falou mais alto. 

Atualmente, trabalham 12 horas por dia na produção das peças e eles mesmos se impressionam ao se dar conta que "não apareceu quase ninguém" para pedir serviços do salão em fevereiro. Nesta semana, até a quarta-feira, apenas uma escova havia sido feita no pequeno espaço ainda destinado ao salão.

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O casal assume que ainda não fechou o salão pela fidelidade de clientes que há anos fazem mechas, coloração e escova progressiva com o casal. Ambos preveem que não será possível permanecer com o salão aberto até o final do ano.

- É apenas uma questão de tempo para fecharmos - lamenta Alessandro.



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Foto: Tadeu Vilani/Agência RBS

 
O que era salão de beleza virou ateliê de artesanato para Alessandro e Ana
Foto: Adriana Franciosi/Agência RBS


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