Opinião
Carlos Etchichury: não dá para comemorar
Policiais militares perseguiram criminosos armados com pistolas e fuzil, os encurralaram, trocaram tiros e os mataram - três dos quatro mortos tinham extensa ficha criminal. Tudo ocorreu no final da tarde de sexta-feira, em frente ao maior complexo hospitalar do Estado, na zona norte de Porto Alegre, com centenas de pessoas nas ruas.A ação foi saudada pelo comando da Brigada Militar, que decidiu condecorar os PMs envolvidos na operação. É justo homenagear policiais que expuseram-se contra o crime e agiram como heróis.
A pergunta que se impõe é a seguinte: esse é o tipo de segurança que queremos, com risco real de, a qualquer momento e em qualquer lugar, ficar na linha de tiro entre PMs e bandidos? Ao mesmo tempo em que reconheço o bom trabalho dos policiais, que foram corajosos e precisos na abordagem, questiono o que a secretaria da Segurança Pública está fazendo para proteger a população.
Porque o cenário é o pior possível. Temos um governo incapaz de pagar horas-extras para policiais (sequer os salários são pagos em dia), programas sociais como o Territórios da Paz descontinuados, quadrilhas cada vez mais violentas e bem armadas e, como cereja neste bolo macabro, temos o mais baixo efetivo da história da Brigada Militar - até o final deste ano, cerca de 3 mil PMs devem se aposentar, numa debandada sem precedentes na corporação. É possível condecorar os PMs sem comemorar uma operação violenta e sangrenta.
Graças ao preparo, eles saíram apenas com ferimentos leves do confronto. Mas pela quantidade de tiros disparados, só um milagre mesmo justifica o fato de nenhum inocente ter sido alvejado. Para quem acha que está tudo bem, com “sociedade 4 x bandidagem 0”, numa analogia simplória corrente nas redes sociais, eu lamento informar que o campeonato está sendo perdido - com cada vez mais assassinatos nas periferias, mais assaltos nos bairros de classe média, mais roubo de veículos pela cidade, mais inocentes vítimas de latrocínios e mais vidas ceifadas.
Para continuar na metáfora do futebol, o que aconteceu na sexta, infelizmente, foi uma vitória circunstancial. É como um time desorganizado que vence sem saber por que conquistou os três pontos. É óbvio que logo adiante vai perder e, com certeza, não vai ganhar nada. E, neste caso, quem perde somos todos nós.