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São Leopoldo

Filho grava vídeos para ajudar o pai que sofre com esquecimentos provocados pelo Alzheimer

Lembranças em forma de vídeo são mostrar para o seu Nelson Nunes da Silva, 84 anos, diagnosticado com a doença há cinco anos

27/06/2016 - 10h01min

Atualizada em: 27/06/2016 - 10h02min


Ana Karina Giacomelli
Ana Karina Giacomelli
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Uma relação de amor e cumplicidade entre pai e filhos transformou a vida de um idoso que luta contra os sintomas do Alzheimer. Nelson Nunes da Silva,84 anos, de São Leopoldo, foi diagnosticado com a doença há cinco anos e, desde então, seus sete filhos se reinventam a cada dia para ajudar o pai a manter a independência, aumentar sua qualidade de vida e ter uma rotina mais feliz.

Em 2015, o músico Miro Nunes, 48 anos, um dos filhos de Nelson, decidiu fazer vídeos de ocasiões importantes da rotina do pai para ajudá-lo a relembrar das situações que acabam apagadas da memória devido à doença.

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O caso lembra a história do filme Como se Fosse a Primeira Vez, em que a personagem Lucy (Drew Barrymore) perde a memória recente depois de um acidente. Na ficção, seu amado Henry (Adam Sandler) produz um vídeo contando toda sua história para que ela assista diariamente e compreenda a situação.

– O paizinho sempre cuidou da gente com muito amor. É o momento de retribuirmos tudo que ele fez por nós. Faço vídeos todos os dias para ajudá-lo a relembrar das coisas. E eu percebo que tem funcionado bem. Algumas vezes, ele comenta que lembra de umas cenas – conta Miro.

Bem-humorado Nelson diverte-se com as gravações do filho e com a explicação de que ele vai esquecer logo daquele momento, mas que irá lembrar de tudo depois.

– Eu acho graça das coisas que eles me contam e mostram. Adoram pegar no meu pé por causa da memória e isso vira uma brincadeira – conta Nelson.

Com o avanço da doença, o idoso perdeu a memória recente, como na história do filme, e passou a se sentir incomodado quando saía da rotina e do ambiente com os quais estava acostumado.

– O primeiro vídeo que eu gravei foi na praia. Notei que o humor dele mudava quando a gente viajava e ele se sentia mal por não lembrar das coisas. Então, toda vez que ele ficava angustiado e me perguntava se tinha acontecido algo diferente, eu mostrava o vídeo e ele se acalmava – observa o filho.


Miro conta que o problema se agravou após a morte da mãe, há um ano. Mesmo tendo ficado ao lado da amada durante todo o funeral, Nelson sente-se culpado por achar que não estava lá.

– Sempre que ele pergunta da mãe, mostro a gravação para ele saber que ficou ao lado dela o tempo inteiro – diz Miro.

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Encontro devidamente filmado

Para a filha Estela Nunes, 54 anos, é importante que o pai mantenha a independência e faça suas principais atividades diárias sozinho.

– O paizinho faz chimarrão, varre a calçada, toma banho, se arruma e faz a barba sozinho. Às vezes, peço para ele comprar alguma coisa no armazém da esquina, para sentir que confiamos nele. Esse sentimento de ser útil é muito bom para a autoestima dele – relata.

Além disso e dos vídeos, Miro faz questão de entoar canções que o pai jamais esqueceria. Nelson completa dizendo que a música lhe remete a bons momentos, histórias antigas que não fugiram da sua memória.

– Eu gosto muito de música. A gente sempre teve toca-discos. Eu cantava e o meu irmão mais novo tocava violão. Lembro que a gente fazia serenatas – conta Nelson, mandando o filho pegar um violão.

Durante a entrevista, Nelson perguntou duas ou três vezes se a equipe de reportagem era de São Leopoldo. Ele também questionou os filhos, quatro ou cinco vezes, sobre a sua idade e o tempo em que moravam na mesma casa no Bairro Jardim América.

A conversa com Nelson e sua família, que durou cerca de uma hora, talvez até nem escapasse da lembrança do idoso, não fosse Miro ter filmado o encontro. Ele prometeu mostrar o vídeo para o pai junto com a publicação desta reportagem.

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Evolução da doença

Coordenador do Grupo de Apoio da Associação Brasileira de Alzheimer (Abraz) de São Leopoldo, o neurologista Paulo André dos Santos confirma que mostrar estes vídeos para Nelson pode servir como estímulo.

– Não sei qual será o efeito a longo prazo, se continuará ajudando. Mas o importante é que, neste momento, está estimulando a memória dele –destaca.

De acordo com o médico, um dos sintomas mais clássicos da doença é a repetição de ideias ou questionamentos na mesma conversa. Ele salienta que, quanto mais cedo a doença for diagnosticada, maior será a qualidade de vida do idoso, pois a independência dele é prolongada e o impacto acaba sendo menor para a família.

Sintomas

O agravamento da demência (perda progressiva das capacidades mentais) inclui ausência de memória recente, desorientação de tempo e espaço, comprometimento da linguagem, dificuldade de reconhecer rostos e situações e perda das habilidades motoras.



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