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Sapucaia do Sul

Para aprender sobre a responsabilidade de ter filhos, alunos cuidam de "bebê" durante todo o ano 

Boneca tem nome, ganha chá de fraldas e recebe todos os cuidados necessários no projeto "Um bebê em minha vida"

16/05/2019 - 05h01min


Jéssica Britto
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Mateus Bruxel / Agencia RBS
Professora Ana Paula orienta os alunos sobre os cuidados que um bebê exige

Em 2015, quando seis alunas adolescentes ficaram grávidas na Escola Municipal de Ensino Fundamental Getúlio Vargas, no bairro Parque Joel, em Sapucaia do Sul, a professora de Ciências Ana Paula Machado decidiu que era o momento de tomar uma atitude e criou o projeto Um Bebê em Minha Vida. A ideia era mostrar, na prática, as etapas da gravidez e tudo que envolve a chegada de um bebê, desde a gestação, os exames pré-natais, o chá de bebê, até o nascimento. 

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– Muitas alunas engravidaram sem querer. Mas uma situação, em especial, me preocupou, quando uma adolescente me disse que queria engravidar. Às vezes, essa é a maneira que encontram de sair de uma rotina de violência ou que acham que as aproximará mais de um namorado. Na maioria dos casos, essas alunas não voltam mais para a escola – descreveu a professora.

O projeto contempla alunos do 8º ano e dura o ano inteiro. Em 2019, três turmas e 75 alunos estão envolvidos. Tudo começa com a simulação do teste de gravidez. Após a descoberta da "gestação da turma", aguarda-se pela revelação do sexo. Esse ano teve até chá revelação: duas turmas esperam dois meninos, Miguel e Benjamin, e outra, uma menina, Alice. 

Com apoio de profissionais voluntários e professores de outras disciplinas, a professora Ana consegue dar explicações específicas sobre os temas tratados. Uma enfermeira fala sobre métodos contraceptivos, já a professora de matemática auxilia com os cálculos, onde é possível analisar qual será o gasto, por exemplo, com fraldas descartáveis.

Mateus Bruxel / Agencia RBS
Estudantes aprendem sobre assuntos que vão de métodos contraceptivos aos gastos com fraldas

As etapas

Uma pesquisa sobre o desenvolvimento do feto durante as 40 semanas de gestação é organizada pelos alunos e tudo é devidamente registrado em um livro com as ecografias.

Conforme a gestação evolui, o parto passa a ser o momento mais aguardado. Nos últimos anos, o médico obstetra Luis Rogério Link, atual prefeito do município, é responsável pelo procedimento. Ele faz uma simulação, entrega o recém-chegado aos alunos e conversa sobre parto, riscos, procedimentos e esclarece dúvidas. Com o bebê para cuidar, os papais de brincadeira começam a registrar tudo no diário do bebê. Cada "criança" tem uma página no Facebook, onde alunos, famílias, professores podem acompanhar as atividades do projeto. 

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– O bebê passa por todos os alunos da turma, um de cada vez. Eles devem levar para casa por dois ou três dias e fazer todas as atividades com a criança e registrar em fotos. As famílias ajudam bastante – conta Ana.

A hora da despedida

Ao fim do período, o aluno deve fazer uma autoavaliação e a turma analisa como foi o seu desempenho no papel de "pai ou mãe".

Após analisar gastos com fraldas e leite artificial, aprender sobre vacinas, necessidade de consultas periódicas e exames, e até fazer um ensaio fotográfico de recém-nascido, é chegada a hora da despedida. A turma organiza uma festa para o primeiro aniversário do bebê e as crianças da Educação Infantil são convidadas para a confraternização. Os papais da turma recepcionam os convidados e cuidam de toda a produção da festa. 

Mateus Bruxel / Agencia RBS
Boneca é cuidada ao longo de todo o ano letivo

Ao final do ano, com auxílio de um advogado, os adolescentes participam de uma "audiência". Na sala de aula, os candidatos à guarda definitiva defendem as razões para ficarem com a criança – no caso, o boneco ou boneca que os acompanhou durante todo o ano letivo – e vence quem tiver o melhor argumento. 

Queda no número de gestantes

Desde que o projeto foi implantando, a ocorrência de gravidez caiu entre os alunos participantes. Nos últimos três anos, não houve registro de gravidez entre as turmas. Conforme o diretor Luiz Neuri Hammes, uma mudança de consciência foi plantada entre os adolescentes. 

– Eles estão mais conscientes das mudanças que teriam que enfrentar e da responsabilidade que é criar um filho. Não é apenas colocar no mundo. Eles aguardam ansiosos pelo 8º ano para participar do projeto – lembra o diretor.

Mateus Bruxel / Agencia RBS
Trabalho inclui álbum com fotos dos "bebês" de outras turmas

Aos 13 anos, Guilherme David só planeja ter filhos depois dos 25. Talvez aguarde mais. 

– Tenho dois irmãos mais novos e sei o trabalho que dá e os gastos, que são muitos – justificou.

O pensamento é o mesmo entre os colegas Heliar Soares e Stephanie Mendes, ambos de 13 anos.

– A gente percebe que não é necessário ter filho tão cedo, pois é muita responsabilidade – completa Heliar.



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