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Reforço em casa

Aulas domiciliares ajudam estudantes a enfrentar perdas de aprendizagem com a pandemia em Esteio

Município contratou 70 professores para o programa Conectando Saberes

15/08/2021 - 21h31min


Isabella Sander
Isabella Sander
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Jefferson Botega / Agencia RBS
João Vitor Menezes Reis, 10 anos, passou a ter o acompanhamento da professora Jussara Vieceli nesta semana

Com a pandemia de coronavírus obrigando estudantes a ficarem meses sem poder ir às aulas em todo o país, em Esteio, na região metropolitana de Porto Alegre, a escola passou a ir até o aluno. Um projeto embrionário em 2020 ganhou força e, em 2021, se tornou o programa Conectando Saberes, que oferece aulas domiciliares a estudantes da rede de ensino do município que tenham passado por perdas de aprendizagem durante a pandemia. O resultado tem sido aprovado pelas famílias atendidas.

No ano passado, o projeto contava com cerca de 15 docentes da rede municipal que, no contraturno, ofereciam aulas de reforço para os alunos. Neste ano, a ideia evoluiu – foram contratados de forma emergencial 70 professores, formados em Pedagogia, exclusivamente para o Conectando Saberes, e o número pode chegar a 200, conforme a demanda.

Os educadores atendem até 14 estudantes, sempre encaminhados pela escola em que estão matriculados. Eles realizam visitas semanais com duração de 50 minutos a alunos do primeiro ao nono ano do Ensino Fundamental. A expectativa é oferecer o serviço para em torno de um quarto das cerca de 7 mil crianças e adolescentes da rede que estão nessa etapa. Hoje, 770 alunos são atendidos.

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— Tem bastante demanda porque, além dos alunos que tiveram acesso bastante precário às aulas, outros apresentam dificuldade mesmo tendo o acesso, já que não conseguiram acompanhar da forma adequada — relata o prefeito de Esteio, Leonardo Pascoal.

A ideia foi criar um sistema semelhante à Estratégia de Saúde da Família, na qual agentes comunitários fazem o acompanhamento familiar, mas adaptado à educação. Nesse caso, o professor comunitário faz as visitas para dar o reforço e mantém interlocução com a escola em que o estudante está matriculado e com o professor regente da turma dele.

Jefferson Botega / Agencia RBS
Elis Pretti Sá, sete anos, ainda não retomou as aulas presenciais, mas é acompanhada em casa pela professora Luciana Ligocki

O foco tem sido principalmente em alunos em idade de alfabetização. É o caso de Elis Pretti Sá, sete anos, que ainda não retornou às aulas presenciais, mas está sendo acompanhada em casa há um mês pela professora Luciana Ligocki. De acordo com a mãe da menina, Liziane Pretti Sá, Elis apresenta dificuldades de aprendizagem desde o ano passado e as visitas da docente trouxeram grandes avanços.

— Eu percebi que o interesse despertou mais nela porque ela é uma profissional da área, que tem estratégias para cativar a criança. Eu, como mãe, tentava ensinar, mas tinha muita dificuldade de pensar em atividades que a cativassem e despertassem o interesse em aprender a ler. Esses 50 minutos de aulas semanais rendem mais do que eu com ela a semana toda — conta Liziane.

Um pouco mais velho, João Vitor Menezes Reis, 10, está no quarto ano e já havia participado do projeto emergencial em 2020. Com a contratação de docentes específicos para o programa, mudou de professora e nesta semana passou a ter o acompanhamento de Jussara Vieceli.

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— Eu gostei muito do projeto porque ele estava bem fraquinho e estava começando a me dar um desespero. Fiquei feliz porque ele está aprendendo bastante — comemora a mãe de João Vitor, Cinara Menezes.

O garoto está frequentando as aulas de forma presencial desde maio. Mesmo assim, ficou com lacunas na aprendizagem – a família não tinha um celular para ele acompanhar as atividades remotas, o que deixava João Vitor restrito aos materiais entregues pela escola semanalmente para serem feitos em casa.

Avaliações diagnósticas

Para avaliar as perdas de aprendizagem, o município previu três avaliações diagnósticas ao longo do ano – uma foi feita no primeiro semestre, outra ocorrerá neste mês e uma terceira será realizada no final de 2021, a fim de identificar a evolução dos alunos ao longo desse período e analisar o resultado do programa.

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É uma prática jornalística que abre espaço para o debate de saídas para problemas relevantes, com diferentes visões e aprofundamento dos temas. A ideia é, mais do que apresentar o assunto, focar na resolução das questões, visando ao desenvolvimento da sociedade.

O Conectando Saberes atende tanto crianças que já retornaram para as aulas presenciais como as que seguem no modelo remoto. Em julho, 52% dos matriculados tinham voltado para as salas de aula. Em agosto, a projeção da prefeitura é de que o percentual tenha subido para 65%. O Executivo municipal equipou todas as suas 188 salas de aula do Ensino Fundamental com recursos tecnológicos como notebooks, câmeras e datashows para viabilizar o ensino híbrido.

Acompanhamento pedagógico para fortalecer o vínculo com a escola

Na opinião do professor de Educação Roberto Rafael Dias da Silva, da Universidade do Vale do Sinos (Unisinos), a iniciativa é promissora, pois promove equidade, ao garantir o acesso à escola para as populações mais vulneráveis, e oferece um acompanhamento pedagógico.

— Se o projeto vai gerar uma melhoria nos indicadores, é cedo para saber, mas ele é louvável no sentido de, em meio a esse contexto bastante desafiador da pandemia, oferecer uma alternativa. Me parece que há uma clareza, na construção da iniciativa, de que o acompanhamento pedagógico é mais importante do que o reforço, neste momento, porque auxilia a que os alunos mantenham um vínculo com a escola — analisa o docente.

Segundo Dias da Silva, a pandemia ocasionou o afastamento de muitos estudantes da escola e, por isso, o acompanhamento próximo permitido por visitas e aulas individualizadas é mais importante, hoje, do que o reforço das habilidades em si. Para o professor, a medida é ainda mais essencial entre os alunos dos Anos Finais do Ensino Fundamental, que correm mais risco de, sem vínculo, abandonarem a escola.


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