Transporte público
As linhas de ônibus de Porto Alegre que mais foram alvo de reclamação em 2021
Ligação entre Restinga e Centro é a mais criticada. Ranking da EPTC reúne dados de janeiro a novembro de 2021 a aponta linhas com mais reclamações por demanda na cidade
Em um ano onde a pandemia ainda seguiu severa nos primeiros meses, sendo reduzida com o avanço da vacinação ao longo do segundo semestre, o sistema de transporte sentiu as mudanças na circulação de passageiros. Se no começo de 2021 a demanda representava cerca de 40% do pré-pandemia, hoje esse número ultrapassa a casa dos 60%. Ainda assim, para os usuários que viram menos ônibus circulando, os canais oficiais da prefeitura seguiram como caminho para reclamação.
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A pedido do Diário Gaúcho, a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) levantou as 10 linhas que mais tiveram relatos feitos pelos usuários através dos telefones 156, 118 ou pelo aplicativo 156+POA, no período entre janeiro e novembro. Os dados foram cruzados com o número de usuários transportados por essas linhas.
Com o cruzamento de informações, é possível saber de maneira proporcional quem foi alvo de mais reclamações. Este é caso da linha 110/Restinga Nova via Tristeza, que recebeu uma reclamação para cada 6.914 usuários transportados — índice bem superior ao da linha com menos reclamações entre as 10, que foi a T1/Transversal 1, alvo de uma reclamação a cada 14.715 usuários.
As duas linhas transportaram um número parecido de passageiros no período entre janeiro e novembro. A 110 levou cerca 1,4 milhões de pessoas, e a T1, 1,6 milhões. A linha com maior público entre as pesquisadas é a T4, que leva 2,8 milhões de pessoas. O itinerário aparece em 9º lugar na lista, com uma reclamação a cada 14.650 usuários.
Em todo o ranking, aparecem cinco linhas operadas pela Carris, empresa pública de transporte da Capital que deve iniciar sua desestatização ainda no primeiro semestre de 2022, e outras cinco linhas operadas pelos consórcios privados. Os principais motivos dos contatos dos usuários com a EPTC são falha no cumprimento da tabela horária, recusar embarque de passageiro, superlotação, sugestão de mais horários para a linha e direção com excesso de velocidade e/ou imprudência por parte do motorista.
Engenheiro de transportes da Associação dos Transportadores de Passageiros (ATP), que representa os consórcios privados da Capital, Antônio Augusto Lovatto pontua que as reclamações têm muito do período em que a frota de ônibus circulando pela cidade estava reduzida.
— A linha 110, por exemplo, está hoje com uma oferta 4% superior ao que era antes da pandemia. Teve muito acréscimo de viagens ao longo do ano — pontua Lovatto.
Fiscalização
A EPTC pontua que as reclamações são ponto essencial para que as melhorias no sistema ocorram. A coordenadora de Indicadores e Estatísticas de Trânsito e Transporte da EPTC, Marluce Coutinho diz que o trabalho foi ainda mais importante na pandemia, onde a mudança na oferta e demanda precisou ser constantemente analisada. Logo no início da retomada da circulação, a EPTC chegou a fazer alterações diárias no sistema de transporte público por ônibus. Atualmente, as mudanças têm sido divulgadas semanalmente. Em alguns casos, duas vezes na semana.
— Com a redução de ônibus circulando na pandemia, os problemas se enfatizaram e, por consequência, as reclamações. Monitorando esses dados vindos dos usuários, conseguimos ver a necessidade de fazer mudanças ou colocar mais horários numa linha, por exemplo — cita Marluce.
A coordenadora ressalta, entretanto, que não apenas as reclamações suscitam mudanças. Os relatos são usados como base para que equipes analisem dados ou até mesmo façam acompanhamentos em campo:
— Não dá para criar uma linha para uma ou duas pessoas, por isso, buscamos entender se realmente existe a necessidade antes de aplicar mudanças.
Trajetos longos são destaque
Das 10 linhas do ranking, todas fazem trajetos que ou cruzam a cidade ou ligam um extremo ao Centro. Além das cinco transversais operadas pela Carris, que vão de um ponto ao outro da cidade sem passar pelo Centro, as outras linhas que aparecem no ranking ligam pontos da Zona Sul ou da Zona Leste ao Centro Histórico da cidade. E faz sentido que esses trajetos mais longos apareçam na lista. Isso porque em um momento com menos ônibus circulando, fica muito mais perceptível quando esse tipo de linha atrasa entre uma viagem e outra. Isso é corrigido com mais oferta de ônibus, o que tanto ATP quanto EPTC pontuam que vêm sendo feito conforme mais passageiros retornam ao sistema.
— Ainda falta uma parcela importante que são os estudantes em aulas presenciais. No primeiro semestre do próximo ano, se houver a retomada completa das aulas presenciais, devemos chegamos aos 75% da demanda pré-pandemia — cita o engenheiro da ATP.
E de acordo com especialistas do setor que vêm acompanhando o tema durante a pandemia, esse deve ser o novo teto do transporte público. Chegar ao mesmo patamar pré-pandemia é algo bastante distante. A demanda deve se estabelecer por volta dos 70% ao que era antes do coronavírus assolar o mundo.
Carris celebra melhoria
Em anos anteriores, as linhas da Carris, com apresentação dos dados brutos, acabam liderando os rankings. Com o cruzamento de informações que mostra o índice conforme a demanda da linha, a empresa ficou mais para trás na lista, mesmo em linhas com grande fluxo, como o T4. Carlos Pires, diretor técnico da Carris, cita que a empresa tem feito um trabalho intenso para evitar a perda de viagens ou atrasos. Segundo ele, em novembro, por exemplo, dos 56 mil horários que a Carris precisava cumprir pela tabela da EPTC, somente 12 foram perdidos. Ainda assim, o saldo foi positivo, explica Carlos:
— Nos horários de pico, colocamos 303 viagens extras durante novembro. Ou seja, além do que a tabela oficial pedia. Isso nos deu uma cobertura de 100,54% da nossa tabela.
Tanto a ATP quando a Carris concordam que uma das razões dos atrasos na cidade está no trânsito. Isso porque estima-se que 98% das viagens saiam na hora certa dos terminais, conforme a ATP, mas ao longo do caminho, com o ônibus dividindo espaço com carros no trânsito, o tempo de viagem vai sendo afetado.
— Tivemos obras importantes de mobilidade, com faixas exclusivas e corredores de ônibus. Isso ajuda bastante — cita o diretor da Carris.
Para Carlos, os números de 2021 são bons. Ele brinca que este é um ranking que quanto mais para trás as linhas aparecem, melhor:
— Ninguém quer ser aquele que mais recebe reclamação.