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"Saber rodar"

Motoristas profissionais dizem que combustível consome 50% dos ganhos após aumento de gasolina e diesel  

Transportadores de app admitem cancelar corridas que dariam prejuízo, enquanto taxistas reclamam de despesas extras nos veículos

15/03/2022 - 21h51min


Tiago Boff
Tiago Boff
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Tiago Boff / Agencia RBS
Motorista de micro-ônibus escolar, Cunha diz que não tem como repassar aumento de custos aos clientes

O aumento dos combustíveis realizado pela Petrobras na última sexta-feira (11) impacta, naturalmente, os motoristas profissionais que atuam em aplicativos de transporte ou táxi. Nem mesmo os reajustes promovidos pelas empresas, como Uber e 99, fazem frente à alta de 18% na gasolina e de 25% no diesel nas refinarias. A estimativa corrente entre os condutores é de que 50% do que recebem das empresas acaba indo para o pagamento da gasolina.

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— Claro que R$ 8 mil em um mês é muito bom, mas metade disso vai para gasolina. E toda manutenção? Se não souber rodar, nem isso a gente tira. Fica um por um, gasta R$ 1 para cada R$ 1 ganho — diz o motorista de aplicativos Carlos Eduardo Silva da Silva, 22 anos. 

Um dos efeitos desse aumento, que coloca o litro de gasolina perto de R$ 7 em postos de Porto Alegre, faz surgir uma nova máxima entre os motoristas: "saber rodar"

— Saber rodar é selecionar corrida. Escolher a que mais paga por quilômetro, se não a gente empata, não ganha nada — explica Silva. 

Essa prática faz crescer as reclamações de clientes sobre cancelamentos, prática admitida por condutores.  Para manter a renda, a casa e as duas filhas, o motorista Sandro Alex dos Reis, 46 anos, estendeu o turno de trabalho. Passa fácil das 10 horas e chega a 12 em alguns dias. Ainda assim, diz que é preciso focar em “saber rodar”:

— Em certas corridas a gente empata. Em outras, não vale a pena ir até o passageiro. 

Outro setor afetado pelo aumento na gasolina é o de táxis, pois uma parcela dos automóveis não tem gás natural veicular (GNV) instalado. Na rodoviária, maior ponto de Porto Alegre, o movimento era fraco na manhã desta terça-feira (15). Enquanto aguardava o desembarque dos ônibus, Marcos Piva, 56 anos, listava os itens exigidos para não perder sua concessão: 

— A gente faz exame toxicológico, tem que renovar o "carteirão" (documento que autoriza a atividade), os colegas que tem GNV pagam a vistoria. É muito gasto. 

O litro da gasolina se tornou o vilão no orçamento de Piva. 

— Tem que reduzir o custo, ou não tem viagem — diz. 

Nem todos os táxis rodam com seguro total para danos e colisões devido ao valor alto para cobertura de veículos de transporte. João Luiz dos Santos, 54 anos, paga mais de R$ 3 mil por ano pela proteção. 

— E o pneu? Também subiu muito. Um jogo de pneu está mais de R$ 1 mil — se queixa.  

Encher o tanque de micro-ônibus passa de R$ 900 

Os 24% de acréscimo nas refinarias para o diesel vão custar, a cada abastecimento, mais de R$ 200 para Valmor Espíndola da Cunha, 65 anos. O micro-ônibus com o qual leva e traz duas dezenas de alunos da rede de ensino infantil armazena 150 litros do combustível, e ele enche o tanque uma vez por semana. 

— Como eu vou repassar esse custo todo para os pais, que também são trabalhadores? Se aumentar o preço, fico sem aluno para transportar — lamenta. 

Trabalhar com a criançada é a vida do motorista, há 35 anos na direção. Durante o período sem aulas presenciais, ele se viu tendo de pagar contas com cartões de crédito, “empurrando” as dívidas com a barriga. Hoje, se mostra feliz por ter voltado ao convívio dos alunos.  Já quando vai ao supermercado, a alegria se transforma em pavor. 

— Nossa! Eu que faço as compras lá em casa, arroz, feijão, pão... Nossa Senhora, tudo sobe! O azeite, que custava R$ 7, está R$ 13. Dúzia de ovos que estava R$ 8 está R$ 14. 

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