Papo Reto
Manoel Soares: "O arrepio do Carnaval"
Colunista escreve no Diário Gaúcho aos sábados


O som do tambor arrasta pelos braços de quem ouve. Um arrepio prazeroso que vem acompanhado de um medinho gostoso, que parece nos conectar a algo que não entendemos muito bem, mas que, aos poucos, faz nosso corpo balançar discretamente. Em poucos minutos, vira uma sacudida que libera tudo que nos deixava tristes.
O nome desse sentimento é macumba. Eu não quero falar de religião aqui, mas não tem como você curtir o Carnaval sem cultuar algum orixá das religiões de matriz africana. Por mais que seja um bloquinho de rua, você está conectado com o encantado. Primeiro que o Carnaval acontece na rua, território do orixá Exu, que não é demônio, mas uma entidade poderosa que, no sincretismo católico, para alguns é Santo Antônio, o casamenteiro, mas na macumba ele zela pelos caminhos e encruzilhadas.
O encantamento de quem fica hipnotizado com o ritmado da bateria, ou da manda de rua, nada mais é que o transe de uma gira onde os orixás se manifestam em pessoas que têm a espiritualidade aflorada. As risadas fáceis, a libido aflorada, o corpo que transcende tudo isso é a macumba se manifestando disfarçada de festa popular.
As músicas, todas têm em suas letras pequenos itãs, que são aquelas histórias sobre orixás que trazem ensinamentos. A levada dos tambores segue o ritmado que toca nos terreiros e que veio com os africanos e suas crenças. As baterias da primeiras escolas de samba eram compostas pelos ogãs que ritmavam os rituais que evocavam axé. Independentemente da identidade de sua fé, se o Carnaval te puxa e por algum motivo te traz uma alegria que só se manifesta nessa época, quero te dizer que você está no transe que existe nos terreiros. Curta seu Carnaval com o respeito que as origens dele merecem.