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Resultados das lives: artistas se envolvem em entregas de doações pelo Estado

Músicos gaúchos assumem protagonismo e vão ao encontro do povo, para levar doações arrecadas durante lives

06/06/2020 - 07h00min


José Augusto Barros
José Augusto Barros
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De formas diferentes, mais ou menos intensas, a epidemia de coronavírus afetou a vida de praticamente todo mundo. Para os artistas, a necessidade de distanciamento social significou agendas congeladas e shows apenas virtuais. Para muitas pessoas, porém, o período significou geladeira vazia e dificuldades financeiras.

Félix Zucco / Agencia RBS
Samba Tri distribuiu onda de solidariedade na vila São José

Com a explosão das lives - transmissões ao vivo pelas redes sociais que permitem ao público matar a saudade de seus músicos favoritos no conforto e na segurança de casa -, surgiu também a chance de ser solidário.

Nesta reportagem, você confere histórias de nomes da música gaúcha que partiram para a ação para tentar virar o jogo das dificuldades trazidas pelo novo coronavírus. Com a ajuda de seus fãs e também de patrocinadores, eles arrecadaram e distribuíram – muitas vezes, pessoalmente - alimentos por todo o Estado. E não pretendem parar tão cedo.

Um dia de solidariedade

Acostumados a tocar para grandes públicos, os músicos do Samba Tri passaram por uma experiência diferente, e emocionante, no final de maio, na vila São José, Zona Leste da Capital. Foi lá que os artistas, liderados por Guto Paulista, vocalista do grupo gaúcho, fizeram uma das entregas das mais de 11 toneladas de alimentos, 200 caixas de leite e 200 quilos de carne, arrecadadas na live beneficente que o grupo fez no final de abril. 

Arquivo Pessoal / Arquivo Pessoal
Live arrecadou mais de 11 toneladas de alimento

Na ação, batizada de Live do Bem, Paulista e sua turma contaram com a solidariedade de uma turma de peso, pois parte da arrecadação foi conseguida por conta da ajuda de grandes nomes do futebol nacional e internacional, que estavam assistindo ao show online, como Renato Portaluppi, técnico do Grêmio,  e Arthur, meia do Barcelona, que fizeram doações. 

- Desde o início da pandemia, nós, do grupo, estávamos com uma inquietação, mas não só por nós, por toda a população. Com o nosso trabalho, e o da maioria da população, suspenso, intensificamos nossas ações sociais. Sempre ajudamos as pessoas, sejam crianças, idosos, doentes em hospitais ou comunidades vulneráveis, Só que, desta vez, fomos nós que saímos em busca do povo - afirma Guto Paulista.

Antes da vila São José, o grupo havia distribuído alimentos na Restinga, na Vila Dique, na vila Santo André, no Belém Velho, em Eldorado do Sul e até na comunidade indígena do bairro Lami.

- Durante essas visitas, percebemos que essas famílias precisam de mais do que alimentos, precisam de apoio social, de um olhar positivo no meio de todas essas adversidades que elas estão passando. Estamos tentando promover a esperança e levar um pouco de cidadania na vida dessas pessoas. Essas populações estão à margem dos serviços e dos olhares da sociedade, trabalham de dia para comer à noite - afirma Paulista.

E o povo que o Samba Tri e sua turma encontrou estava realmente necessitado. Lá, em uma tarde ensolarada, entregaram alimentos para moradores que fizeram fila para receber as doações, como a diarista Maria Iara Machado de Machado, 44 anos. Antes da pandemia de coronavírus, ela conseguia fazer faxina, em média, em quatro casas por semana, tendo uma renda média de R$ 600 mensais, para o seu sustento e de o quatro filhos - Max Welder, 20, Leandra, 16, Renan, 14 e Douglas, 11. Em abril, ela ainda contou com a ajuda de seus “patrões” que seguiram lhe pagando, mesmo que ela não fosse trabalhar, por conta dos riscos de contágio de coronavírus. Porém, em maio, ela não recebeu nada.

- Zerou tudo, é muito raro aparecer alguma coisa. Acredito que amanhã (sexta-feira, pois a entrevista foi feita na quinta-feira), conseguirei ir na casa de um rapaz para o qual eu trabalho. Para mim, esse período tá bem apertado, mesmo - lamenta a diarista.

Ao ver a chegada do grupo com as entregas, ela celebrou. Na sua casa, Paulista e sua turma entregaram cinco quilos de arroz, sacos de feijão, massa, azeite, sal e pacotes de bolachas para as crianças.


"Não cai do céu"

Porém, mesmo com todas as dificuldades, conversar com Iara é uma lição de vida. Durante a entrevista, ela conta que seu cadastro no Auxílio Emergencial do Governo Federal está em análise, há três meses. E afirma que ainda espera receber R$ 1,2 mil, por ser mãe solteira.

Félix Zucco / Agencia RBS
Maria Iara, com os alimentos arrecadados

- Mas os R$ 600 já ajudariam - afirma ela.

Mesmo assim, Iara não "fica parada e espera que as coisas caiam do céu", como ela mesma define. No No período de pandemia, ela, que já fazia pães e bolos para vender, intensificou a produção. Quem faz a distribuição é o filho de 14 anos. Para completar, passou a fazer crochê. E esbanja solidariedade.

- Quando ganho alguma coisa, reparto com meus vizinhos. Aqui, todo mundo se ajuda. Estou vivendo como todo mundo, não me queixo da sorte - afirma a diarista.

Ao fim da entrevista, educadamente, ela pede a este repórter que a indique para faxinas, caso saiba de alguém que precisa.

- Faço um ótimo trabalho. Se entrar algum dinheiro, estou no lucro - finaliza.


Cadeia da música beneficiada

Arquivo Pessoal / Arquivo Pessoal
Uma das entregas das arrecações da dupla, em Cidreira, no Litoral Norte

Uma das duplas mais tradicionais da música gaúcha, César Oliveira & Rogério Melo também mostraram toda a sua solidariedade, não só com a população em geral, mas com integrantes da cadeia musical, severamente atingida pela pandemia de coronavírus. Em quatro lives, sendo três da dupla e uma com participação de Gaúcho da Fronteira, os músicos arrecadaram mais de 25 toneladas de alimentos, destinados ao Banco de Alimentos do Rio Grande do Sul, que fez boa parte da logística da entrega, como os das fotos acima, realizadas no Litoral Norte. 

Reproducão / Instagram
Uma das lives da dupla, que beneficiou, também, o povo da música

-  Via Banco de Alimentos, conseguimos que essas doações fossem para todo o Estado, para as mais diversas entidades carentes - explica César.

O músico explica que, dentre as 25 toneladas, eles conseguiram direcionar algumas cestas básicas para que o Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG) distribuísse para parte da cadeia cultural do Estado, como trovadores, narradores de rodeio e músicos.

- Conseguimos, ainda, um número bem expressivo de cestas básicas para escolas de Novo Hamburgo, que forneciam alimentação para os alunos. Antes da pandemia, elas forneciam cinco refeições semanais para alunos carentes. Agora, estavam conseguindo fornecer somente duas - explica César.


Preocupação

Outro movimento importante, ele destaca, é a iniciativa Tradicionalismo Solidário, do MTG, que tem cerca de 200 pontos de coleta e distribuição de alimentos pelo Estado. Conforme o músico e ativista cultural, o MTG solicitou aos coordenadores das 30 Regiões Tradicionalistas (RT) do Estado que elegessem cinco CTGs de sua área de atuação, que seriam os pontos de coletas de cada região. 

 O músico demonstra preocupação com a situação do setor como um todo, que será um dos últimos, senão o último, a retomar suas atividades, acredita ele. 

- Eram pessoas que se sustentavam por meio de eventos dos CTGs, das invernadas e que, agora, estão sem trabalho. E, quando as coisas voltarem ao normal, bailes e bailões, por exemplo, terão dificuldades de voltar ao normal, por conta da aglomeração de pessoas que esse tipo de evento gerava antes.

Dever cumprido

Vencedor do The Voice Brasil, em 2018, e atualmente morando em São Paulo, Léo Pain não esqueceu de suas origens. Na sua única live realizada até o momento, em abril, ele arrecadou seis toneladas de alimento não perecível. Com ajuda de patrocinadores e do público, que fez doações, Léo fez a entrega das doações em Santa Maria, cidade onde ele mora desde 2005 (o cantor nasceu em Alegrete). 

Arquivo Pessoal / Arquivo Pessoal
Léo, com os alimentos arrecadados, em Santa Maria

- Dá uma sensação de dever cumprido, de ajudar quem mais precisa. Isso prova que, de mãos dadas, com amigos e apoiadores, todos somos mais fortes - afirma Léo. 

Comida quentinha para quem está na rua

Na noite do dia 1º de maio, os gaúchos do Alma Gaudéria decidiram fazer uma live diferente. Na sede do grupo, na Zona Norte da Capital, os músicos promoveram o Bolicho Online, primeira apresentação do gênero da banda após o início da pandemia. No dia, o diferencial da apresentação da banda foi que, além de horas e horas de músicas, o grupo contratou um cozinheiro para preparar 150 refeições, que os integrantes da banda doaram para pessoas em situação de vulnerabilidade social. Assim que terminou a live, já de madrugada, os artistas pegaram o carro e foram para o Centro da Capital, onde entregaram as marmitas para moradores de rua. 

Arquivo Pessoal / Arquivo Pessoal
Quentinhas chegando, para quem mora na rua

- O que a gente arrecadou, serviu para que fizéssemos as refeições, uma paeja campeira, que levamos para as pessoas que moram na rua. E ficamos impressionados com a quantidade de gente que mora na rua. E a gente vê o quanto a gente pode perder a humanidade, pois as pessoas passam por moradores de rua e acham que é uma situação cotidiana. A gente se revigora (realizando ações deste tipo), pois tu vê que pode ajudar, mas sai chateado, na condição de seres humanos - afirma Fernando Espíndola, voz e violão do grupo.

No dia 21 de junho, o grupo fará uma nova live, que terá o objetivo de arrecadar roupas. 

- É um momento de empatia e solidariedade, que deveria existir sempre, né? Com o frio, a que deveria existir sempre, né? Com o frio, a ideia é levar comida, além de agasalhos - anuncia Fernando.




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