Polícia



Adolescência assassinada

De 50 mortes de crianças e adolescentes, metade foi solucionada

Há quatro anos, Estado priorizou investimento na qualificação das investigações de homicídios

16/07/2015 - 07h03min

Atualizada em: 16/07/2015 - 07h03min


Carlos Ismael Moreira
Carlos Ismael Moreira
Enviar E-mail
Arte DG / null

No dia 20 de maio, fazia 37 dias que o adolescente Antônio Gregori Maciel dos Santos, 15 anos, havia sido assassinado a tiros, junto com o amigo Bruno Robert Silva de Farias, 21 anos, dentro de casa, no Bairro Rubem Berta. Nessa data, uma ação da 5ª DHPP chegou às prisões de Valderi dos Santos Machado, o Zoreia, e Guilherme Oliveira da Silva, o Gui, reconhecidos pelo crime que, naquele momento, tinha o seu inquérito encerrado.

A rápida investigação, com resolução do inquérito e apontamento da autoria dos crimes, é o aspecto positivo na análise dos pelo menos 50 assassinatos de crianças e adolescentes na Região Metropolitana nos primeiros cinco meses deste ano. Até agora, metade dos casos já foram concluídos pela polícia, com as prisões de suspeitos em 16 crimes. Entre os outros 25 homicídios que ainda estão sem resposta, 13, segundo a polícia, já têm autoria determinada. Os dados contrariam uma realidade nacional. Em todo o país, a média de homicídios solucionados não passa dos 10%.

"Se não atacar a raiz do problema, continuarão morrendo", diz presidente do Cedica
Comissão de Direitos Humanos da Câmara vai investigar mortes de jovens gaúchos 

Os números traduzem na prática o investimento feito pelo Estado desde o final de 2011, com as criações de delegacias especializadas em Porto Alegre, Alvorada, Canoas, Gravataí, Viamão, São Leopoldo e Novo Hamburgo. Desde então, as resoluções desses crimes têm mantido uma média acima de 60% a cada ano. O índice, no entanto, não determinou a redução nos homicídios.

- Diminuir a sensação de impunidade é o nosso desafio sempre. É fundamental elucidar a maior quantidade de homicídios possível, e no menor tempo possível. Mas evitar os crimes exige muitas outras ações que fogem ao controle da polícia - resume o diretor do Departamento de Homicídios de Porto Alegre, delegado Paulo Grillo.

Para a presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedica), Maria Milene Alves Gomes, o número é positivo, mas não representa uma justiça efetiva às crianças e adolescentes.

- Justiça não é só a punição de quem já cometeu um crime. A prioridade de investimentos públicos precisa estar na vida dessas crianças e atacar o que as levou para a morte- aponta.

E aí as perspectivas, como já admitiu o secretário estadual da Justiça e Direitos Humanos, César Luís Araújo Faccioli, não são imediatas. O único investimento previsto pelo governo estadual só deve se concretizar em 2017, com a construção do primeiro de seis centros do Programa de Oportunidades e Direitos (POD), justamente no Bairro Rubem Berta, onde Antônio Gregori foi assassinado em abril.

Leia outras notícias do dia
Curta nossa página no Facebook

O mapa abaixo mostra onde cada um dos assassinatos aconteceu



Investigação imediata

De acordo com a delegada Jeiselaure Souza, que comandou a investigação da morte de Antônio Gregori, o que determinou a resolução rápida deste crime foi a presença imediata de toda a equipe de investigação no local quando os fatos ainda se desenrolavam.

- As pessoas precisam ver que estamos empenhados em solucionar o crime. Naquele momento conseguimos conversar com familiares, amigos. E ali já sabíamos a motivação e um possível autor dos disparos, que já era investigado por outros homicídios na região - conta a delegada.

A polícia concluiu que o menino foi morto pela dupla de traficantes conhecidos no Loteamento Timbaúva simplesmente porque discutiu com eles minutos antes por estarem fazendo bagunça próximo às janelas da Cohab Rubem Berta.

Pressão da comunidade agilizou a polícia

Era domingo à noite, 1º de março, e toda a criançada do trecho final da Avenida Zero Hora, no Recanto do Algarve, em Alvorada, estava na rua. Na esquina, um grupo de amigos conversava em frente ao local onde Cristian Rodrigues de Assis comemorava seus 19 anos. Pelo menos oito criminosos - três deles adolescentes - invadiram a vila fortemente armados e se aproximaram do grupo, atirando.

Executaram Cristian e os adolescentes Brayan Ildo de Andrade, Jonas Dorneles de Souza e Andrey Flores Monticelli, todos de 16 anos. O crime foi solucionado 50 dias depois pela Delegacia de Homicídios de Alvorada, com os indiciamentos de cinco adultos - três deles presos - e três adolescentes - dois apreendidos e um morto. O suposto mandante segue foragido.

- Foi um crime que, apesar do medo dos moradores, mobilizou toda uma comunidade. A partir dali, participamos de diversas reuniões com moradores, o policiamento ostensivo e os nossos investigadores ficaram presentes lá por muito tempo. Isso deu confiança às pessoas. Elas sabiam que era uma prioridade solucionar o crime e evitar a invasão daqueles traficantes na área - explica o delegado Cassiano Cabral.

Neste contexto, uma testemunha considerada chave surgiu e ajudou a guiar a investigação. Durante a apuração, essa pessoa foi mantida sob proteção. E depois, saiu do Estado.

Os casos parados no silêncio

A polícia sabe que os quatro tiros no rosto que vitimaram Hamilton Vinícius Costa, o Baleia, 14 anos, na Vila Elza, em Viamão, no dia 14 de maio, foram uma possível punição, típica do tribunal do tráfico. Mas daí a concretizar as provas que dariam fim ao inquérito policial, o caminho para a Delegacia de Homicídios de Viamão parece longo.

- É um crime que envolve traficantes acostumados a impor o medo na comunidade. O resultado disso é o silêncio das pessoas. Mesmo que alguns saibam quem cometeu o crime, e até como cometeu, muitas vezes não falam porque imaginam que não haverá punição - afirma o delegado Carlos Wendt.

O desafio, segundo ele, é "mostrar serviço".

- Temos nos esforçado em apreensões de armas e drogas, mas nem sempre é possível conseguir a decretação de prisões de suspeitos - comenta.

Sem as provas testemunhais, a necessidade de dedicação dos agentes a cada caso é redobrada.

- Com o atual efetivo, é natural que esses casos tenham uma apuração mais lenta. Fica muito difícil garantir dedicação exclusiva do agente para um único caso a cada mês, por exemplo - complementa o titular da 3ª DHPP, delegado João Paulo Abreu.

Perícia como obstáculo

Um dos obstáculos para as investigações de homicídios é quando os principais elementos de prova não falam. São técnicos. Aí o caso esbarra nas limitações técnicas das perícias no Estado e no próprio emaranhado burocrático da estrutura da Segurança.

A solução para a morte da menina Laura Machado Machado, sete anos, com uma bala perdida de fuzil 5.56 na madrugada de 17 de abril, enquanto dormia em casa, no Bairro Vila Nova, Zona Sul da Capital, é considerada um dos principais desafios ao Departamento de Homicídios. Nenhum dos possíveis envolvidos no tiroteio que resultou em sua morte foi descoberto. Restou aos investigadores caçar o fuzil usado no crime. Uma busca literalmente estacionada durante dois meses.

Um fuzil com o mesmo calibre havia sido apreendido em Viamão e poderia ser comparado com o material encontrado no local do crime. No entanto, a arma só foi encaminhada ao IGP no dia 19 de junho. Agora, a 4ª DHPP aguarda o resultado da comparação balística.

Na fila de espera pela perícia também está o resultado do inquérito que apura a morte de Muriel Rocha Dias, 15 anos. Morta com um tiro na cabeça no Bairro Rubem Berta em 14 de abril, a suspeita da polícia é de que ela possa ter sido estuprada antes de morrer. O suspeito poderá ser identificado pelos exames periciais feitos na menina. Eles ainda não chegaram à delegacia.

Casos abertos | Create infographics

*Diário Gaúcho e Zero Hora


MAIS SOBRE

Últimas Notícias