Rio Grande Afora
Conheça a primeira mulher a comandar a maior reserva florestal do Estado
Solange Dias de Deus é a gestora do Parque Estadual do Turvo, no Noroeste do Estado, que também abriga a maior queda d'água do mundo, onde vive sem comodidades como celular ou internet
Pela primeira vez em sete décadas de existência, a maior unidade de conservação do Rio Grande do Sul, o Parque do Turvo, em Derrubadas, no Noroeste do Estado, está sob o comando de uma mulher. Desde fevereiro, a bióloga Solange Dias de Deus, 37 anos, tem a responsabilidade de manter intactos os 17.491,40 hectares de mata nativa que abrigam o Salto do Yucumã, a mais importante queda d'água longitudinal do mundo, com 1,8 mil metros de extensão.
Apesar dos números estrondosos da unidade, que poderiam assustar quem vive na zona urbana – antes de se transferir para o Interior, Solange morava em Gravataí e trabalhava em Porto Alegre –, a bióloga nem precisou pensar quando a Secretaria Estadual de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Sema) lançou a proposta para que deixasse o serviço administrativo e se aventurasse na floresta conhecida por ser o último reduto da onça-pintada no Estado.
– É o sonho de qualquer biólogo estar neste lugar. Larguei tudo por esta oportunidade – conta.
Isolamento total
Com o apoio do marido, o fotógrafo norueguês Bjorn Nilsen, 52 anos, que se mudará para o Turvo até o final de abril, Solange, bióloga do Estado desde 2010, preparou uma única mala, enfrentou quase dez horas de viagem e passou a morar numa casa de alvenaria ao lado do prédio administrativo do parque. Lá, comanda um guarda-parque e cinco auxiliares de serviços rurais. Comodidades dos tempos modernos, como celular e internet, só são acessíveis neste trecho de menos de 1 hectare. No restante do parque, o isolamento é total.
Solange sabe, e gosta. Estar entre as árvores centenárias e os animais silvestres é seu passatempo favorito. Quando caminha em direção ao Salto, por uma trilha serpenteada pelo Rio Uruguai, tem as borboletas como companheiras. Sem cerimônia, elas pousam no chapéu, nas costas e nos braços de Solange. E por ali ficam até a gestora retornar ao setor administrado. A bióloga tem tato com elas: acaricia e até beija as borboletas que insistem em permanecer ao seu lado.
– Virei a mulher das borboletas – comenta, entre risos acanhados.
Incansável
Apesar do pouco tempo no local, Solange conquistou mais do que as borboletas: tem a admiração dos funcionários, dos frequentadores e da população de Derrubadas e de Tenente Portela, as duas cidades mais próximas. Logo depois da sua chegada, foi formado o primeiro conselho consultivo do Turvo, envolvendo 20 representantes de instituições públicas e da sociedade civil.
– É uma responsabilidade muito grande. Existe um plano de manejo que exige o fortalecimento da fiscalização para coibirmos a pesca e a caça dentro do parque. Vamos reforçá-lo e cumpri-lo. Isso aqui é um paraíso, e precisa ser preservado desta forma – enfatiza.
A dedicação à preservação da área faz Solange até esquecer que precisa tirar folga. Desde que assumiu a função, não parou. Garante que tem muito a fazer. Era assim quando atuava como professora de Ciências nas escolas municipais de Gravataí, função que desempenhou por cinco anos antes de juntar-se à Divisão das Unidades de Conservação do Estado. Na época, Solange já sonhava com o dia em que atuaria no Turvo. Nunca lhe passou pela cabeça, porém, ser a gestora.
Espírito aventureiro
Casada há quatro anos com o norueguês que conheceu num evento da área ambiental em São Paulo, um ano antes, a bióloga teve total aprovação de Bjorn quando decidiu embarcar rumo ao Noroeste. Não teve a mesma recepção do restante da família, que olhou o convite com desconfiança, mesmo sabendo do espírito aventureiro da bióloga.
– As pessoas se espantam quando digo que meus companheiros são a onça-pintada, as cotias, os tamanduás-mirins, os esquilos, e outros animais – confessa, sempre rindo.
Nos primeiros dias confinada no parque, Solange percebeu que, depois que escurece na floresta, o melhor é ficar dentro de casa. Certa noite, enquanto cozinhava, ouviu passos caminhando ao lado do prédio. Suspeitou que fosse um animal pesado. À espreita, pela janela, não conseguiu identificar. Pela manhã, ao observar as pegadas, teve a certeza: era uma anta – animal que ela tem o sonho de ver de perto.
Sem período para concluir o trabalho como gestora, Solange planeja permanecer o tempo suficiente para deixar uma marca própria na região.
– Estou apostando a minha vida aqui, ficarei o quanto eu puder para fazer com que o meu trabalho seja continuado – resume, confiante.
PARQUE ESTADUAL DO TURVO
/// Situado à margem do Rio Uruguai, o Parque Estadual do Turvo abriga remanescentes bem preservados de Floresta Estacional Decidual. O leito rochoso desse rio forma uma cachoeira longitudinal (Salto do Yucumã), com 1.800 m de extensão e até 20m de altura de grande potencial cênico.
/// O parque busca proteger os processos naturais chaves para a persistência e evolução das comunidades, em especial os processos de sucessão, o regime hídrico do rio Uruguai e dos arroios tributários.
/// O PE do Turvo é o último refúgio em território gaúcho de espécies, como a anta (Tapirus terrestris) e a onça-pintada (Panthera onca). A viabilidade das pequenas populações de onça no parque se mantém apenas em função das ligações com as áreas florestadas da Argentina e com possíveis contatos com as populações mais numerosas da bacia do rio Iguaçu.
Fonte: Secretaria Estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Sema)
SAIBA MAIS
/// O Parque Estadual do Turvo está aberto à visitação pública de quarta-feira a domingo, das 9h às 18h30min. O horário máximo de entrada é 17h.
/// Contatos: (55) 3616.3006. E-mail: parque-turvo@sema.rs.gov.br
/// Ingressos:
Veículo de passeio (incluindo os ocupantes) – R$ 16,84
Moto – R$ 10,23
Ônibus ou caminhão (incluindo os ocupantes) exceto escolar – R$ 224,06 Micro Ônibus (incluindo os ocupantes) – R$ 112,18
Utilitário para transporte de passageiros (incluindo os ocupantes) – R$ 56,24