Ele já não pode pisar mais na avenida. Depois de muitos carnavais, as pernas de Inácio de Quadros, 71 anos, não aguentam sustentar a elegância emprestada durante 13 anos à velha-guarda da Academia de Samba Puro. Por isso, neste Carnaval, ele fará seu último desfile. Mas se engana quem pensa que o baluarte pretende afastar-se do samba, ou da escola do Morro Maria da Conceição, com a qual viveu tantas alegrias.

- Vou parar esse ano, pela idade, pelo câncer (no pâncreas). Estou me preparando, mas é difícil parar. Esse ano vou desfilar de cadeira de rodas. Eu vou encerrar, mas não vou ficar detrás dos panos - promete.

Nas paredes do Recanto de Xangô e Iansã, o famoso bar que mantém na Rua João do Rio, no Bairro Partenon, quase o mesmo número de anos que está na velha guarda da azul-amarelo-e-branco, Inácio guarda um pouquinho da história do samba no morro.

"Tem a cadência do morro"

São fotos que registram visitas de personalidades do samba, como Neguinho da Beija-Flor, fantasia da velha guarda, instrumentos (como o tantã de seu Inácio) e os três estandartes de ouro que a Ala Mestre Papai (nome da ala da velha-guarda, em homenagem ao mestre de bateria da Samba Puro, já falecido) recebeu em 2002, 2010 e 2012.

- A velha- guarda é o que eu estimo, eu amo. A gente não pode dançar que nem os guris porque o infarto pega. Mas temos que dançar, fazer gestos, cantar o samba - conta o chapeador aposentado.

Para Inácio, uma escola de samba parte da velha-guarda e da ala das baianas, por contarem com os componentes mais experientes. Mas ele tem um carinho especial, também, por outra ala de sua escola:

- A bateria é a melhor, não vai ter outra igual! Tem a cadência do morro, uma pancada diferente, um ritmo carioca. A Samba Puro é amada, o pessoal vibra com ela - diz Inácio, que escolheu o Morro Maria da Conceição para viver há mais de 30 anos.

Querido por todos

- Não tem uma escola que não me conheça. Em cada quadra que eu chego, sou muito bem recebido, em cada escola tenho um amigo - revela Inácio.

A coleção de camisas das escolas de samba (tem perto de 40 exemplares) confirma que ele reúne, também, uma porção de amigos feitos no meio carnavalesco. Antes de encantar-se pela escola do morro, na juventude Inácio desfilou em quase todas as agremiações da Capital.

Som, petisco e simpatia

Por Renato Dornelles
Colunista de Carnaval

"Ouvir um bom samba, ao vivo, e ainda saborear petiscos, com cerveja ou refri na temperatura ideal, é daqueles programas impagáveis. Ainda mais se a música for executada pela Velha Guarda da Academia Samba Puro, no bar Recanto de Xangô e Iansã. Os "comes" são preparados na hora pela dona Santa. Para servir a bebida, com simpatia e atenção, ninguém menos do que o dono, Inácio de Quadros.

É sempre assim que somos recebidos no famoso bar do Morro Maria da Conceição. Por lá, batemos papos agradáveis, sabemos das últimas da Samba Puro e da Realeza e ainda ouvimos histórias de personagens inesquecíveis, como o saudoso Mestre Papai, responsável por um suingue agradável da bateria da Samba Puro. Inácio e seus convidados nos brindam ainda com belos sambas do compositor Eugênio Paraquedas, morador das redondezas."

Samba desde o início da tarde

No bar de Seu Inácio, aberto de sexta a domingo, seguidamente tem samba já no começo da tarde. As reuniões até inspiraram um samba composto por Inácio e Luis Carlos Ribeiro de Oliveira.

Na letra, além do orgulho da velha guarda, há versos dedicados à dona Santa, como é conhecida a esposa Enrieta de Quadros, 67 anos (são casados há 45 anos), e sua famosa massa caseira servida nas quentinhas.

O casal já tem seguidores: a neta Thays, 18 anos, está envolvida no desfile. E os netos João Pedro, seis anos, e Gabriel, três anos, também mostram que são do samba.