Empreendedorismo
As lições de otimismo do ex-catador de latinhas que hoje fatura R$ 50 milhões por ano
Geraldo Rufino lidera uma das maiores empresas de reciclagem de peças de caminhões da América Latina e diz que o Brasil está cheio de oportunidades
O otimismo chega a ser irritante. Na boca da maioria das pessoas, as palavras do empresário Geraldo Rufino, 56 anos, poderiam fazer muita gente levantar e deixar a sala. Mas a história desse mineiro que fez a vida em São Paulo é capaz de prender qualquer um por horas, como fez nesta quarta-feira (9) no Tá na Mesa, tradicional almoço realizado pela Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande Sul (Federasul), em Porto Alegre. As dezenas de convidados queriam descobrir como um menino catador de latinhas, que vivia em uma favela de São Paulo com mais sete irmãos, foi capaz de criar uma empresa que fatura cerca de R$ 50 milhões por ano. Um dos segredos é, justamente, o otimismo, além da crença de que cada um pode mudar a própria vida.
— Seja lá qual a for a sua condição social, somente quem tem a possibilidade de mudar essa situação é você mesmo, e através da sua produtividade. Se você estiver disposto a trabalhar neste país, só passa fome se quiser — prega Rufino.
Ele garante que, apesar da pobreza, sempre teve o que comer na infância. O segredo era ir às feiras livres e esperar até o fim, quando muitos itens eram jogados fora pelos feirantes. O que levava de graça para casa fazia a festa da família, que dividia o que conseguia com os vizinhos. O faro empreendedor não demorou para se manifestar. Aos 11 anos, arranjou um jeito de ganhar dinheiro catando latinhas no aterro perto de onde morara. E para outros meninos, que faziam carreto nas feiras da região, construiu uma frota de carrinhos de madeira para alugar — o equipamento ajudava no transporte.
O lixão, segundo ele, foi um lugar "maravilhoso". Lá, ele encontrava roupas, sapatos e brinquedos além das latinhas. Eram 12 horas por dia recolhendo material que vendia para a reciclagem. As forças para não esmorecer nessa jornada de trabalho extenuante vinham das palavras da mãe, que morreu quando ele tinha oito anos: sair da pobreza dependia de quantas horas estava disposto a produzir.
— Minha mãe me ensinou que Deus não sacaneia ninguém, tudo que aparece na vida da gente é oportunidade. É que, em vez de desembrulhar o pacote, você fica lamentando. Eu acreditava que era oportunidade, eu desembrulhava o pacote — lembra, sempre sorrindo, o empresário.
Aos 15 anos, usou as economias que tinha para ajudar o pai e ficou sem dinheiro. Recomeçou trabalhando como empregado, com Carteira de Trabalho assinada. A dedicação e a tenacidade o levaram a virar diretor da empresa com apenas 24 anos, retomar os estudos e ganhar 81 salários mínimos da época por mês. Mas a gana de ser o patrão de si mesmo nunca o abandonou. Com os irmãos, comprou dois caminhões para fazer carretos. Quando os veículos, que não tinham seguro, se envolveram em acidentes ao mesmo tempo, entrou no negócio que o consagrou: a desmontagem de caminhões acidentados comprados em leilão para a venda de peças. O que poderia ter sido o fim do negócio se transformou no nascimento da JR Diesel, hoje localizada em Osasco (SP), que oferece peças usadas com procedência das principais montadores.
"Tem de exportar é o brasileiro, o país é fantástico"
O Brasil é o melhor lugar do mundo para fazer negócios e crescer, defende o empresário Geraldo Rufino. Para quem duvida, o autor do livro O Catador de Sonhos emenda uma lista de razões: a fartura de água, o solo fértil, a diversidade biológica, os potenciais consumidores (200 milhões de brasileiros) e até o Carnaval. Mas essa tese não é ufanista? Rufino discorda, sem perder o humor.
— Tudo aqui é bacana, não tem nem desastres naturais. As pessoas acordam de manhã, o sol brilha, e o cara nem agradece por isso. Olha...tem de exportar é o brasileiro, o país é fantástico — brinca o empresário.
Provocado sobre a postura do povo diante da crise econômica, da situação política do país, o ex-catador de latinhas inflama-se. Faltaria aos brasileiros a responsabilidade pela própria vida.
— As pessoas agradecem muito pouco, lamentam muito e terceirizam a culpa. É sempre a culpa de alguém. Todos nós podemos a mesma coisa, a massa cinzenta que eu tenho é a mesma que você tem. Não sou melhor do que ninguém. É que eu só penso que vai dar certo, eu só sou grato pelo país que eu tenho — afirma.