Dias melhores
Gatos de luz estão com os dias contados na Ilha do Pavão
Ceee recebe autorização para instalar energia elétrica para 200 famílias que ainda vivem com luz irregular. A obra deve se iniciar em agosto
Vivendo ainda às escuras, 200 famílias da Ilha do Pavão, no Extremo Norte de Porto Alegre, deverão abandonar as gambiarras em breve: a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) autorizou a Ceee a implantar a rede de energia elétrica no trecho onde hoje o gato de luz é unanimidade. Como as famílias vivem numa área pertencente à Concepa, concessionária da BR-290 no trecho, era necessária a liberação do órgão. As obras, que fazem parte do Programa Energia Legal, estão programadas para iniciarem em agosto, com investimento de R$ 200 mil.
Enquanto não chega a novidade, os moradores seguem enfrentando dificuldades quando cai a noite. A gataiada na rede não é suficiente para manter a vila iluminada, e a sobrecarga acaba queimando eletrodomésticos e eletrônicos.
Na casa de Maria Margarete Carvalho, 43 anos, acabaram virando armário as duas geladeiras recebidas por meio de doações. O chuveiro elétrico está instalado, mas enquanto a energia não vem, o banho é de mangueira no verão, e de balde, no inverno.
Sonho é beber água gelada
As oito crianças que vivem na casa são as que mais sofrem. Sem conseguir enxergar na escuridão, os pequenos são atacados sem dó pelos mosquitos à noite. Para jantar, só com velas. E a televisão, que seria a única diversão da gurizada, queimou numa das sobrecargas.
- Até para beber uma água gelada é uma dificuldade. Temos que comprar gelo nos vizinhos que têm um gato mais reforçado - revela Maria Margarete.
Segundo a chefe do Departamento de Fiscalização da Ceee, Shirlei Debastiani Cortez, a Ceee pretende começar os trabalhos na ilha em agosto, se estendendo até o final deste ano.
- Vamos nos reunir com a comunidade para explicar como funcionará este processo. Daremos tudo instalado para que não ocorra cobrança a mais dos novos clientes - explica Shirlei.
Energia legal
A chefe do Departamento de Fiscalização da Ceee, Shirlei Debastiani Cortez, explica:
Desde 2012, o programa Energia Legal contemplou 19 comunidades na área de concessão: 16 ficam em Porto Alegre.
Outras 12 vilas já estão com o processo de regularização em andamento. E mais 12 deverão ser incluídas no segundo semestre.
Por ano, até 2015, a Ceee pretende investir R$ 3,5 milhões no programa.
Para uma vila ser escolhida, é preciso que a liderança procure a agência da Ceee mais próxima. Um expediente será aberto, e o departamento de fiscalização agendará a primeira reunião.
O morador que participar pagará 24 parcelas de R$ 20 para ter o kit padrão Ceee que possibilita a instalação do medidor. Ele é composto por caixa de luz, poste, condutores, aterramento, disjuntor geral.
Se o morador pagar as primeiras 12 parcelas em dia, terá o direito de pedir à Ceee a isenção das outras 12. Se o cliente fizer parte de algum programa do governo federal, pode ter desconto de até 60% do valor da conta.
Venda de gelo dá lucro
A falta de energia elétrica fez surgir um negócio rentável na ilha. Pelo menos três famílias vendem gelo para o restante da comunidade. Elas vivem do outro lado da rodovia, onde há energia elétrica regularizada, ou possuem uma gambiarra reforçada, como é o caso da comerciante e líder comunitária Loreci Gomes de Almeida, 52 anos.
Depois de perder três freezers do bar numa queda forte de luz, Loreci passou a comercializar garrafas de 2 litros congeladas. Cada uma custa R$ 2. Por dia, vende até 30.
"Não nos negamos a pagar"
- Uso uma geladeira velha, que troquei por um botijão de gás. É a alternativa enquanto não consigo pagar o conserto de um freezer - conta.
Há 18 anos vivendo na ilha, Loreci conta as semanas para, finalmente, ter energia elétrica regular.
- Não nos negamos a pagar a conta. Mas queremos ter o direito a um banho quente, a uma água gelada, coisas que ainda não temos acesso hoje. Basta um ventinho para os fios caírem - resume.