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Celebração inédita

Depois de DNA, homem de 75 anos comemora seu primeiro Dia dos Pais

Com mais de 50 anos, irmãos Marli e Julio Cezar vão passar a data ao lado de Adeí

10/08/2013 - 12h21min

Atualizada em: 10/08/2013 - 12h21min





Coragem e atitude

Depois de adultos, filhos fazem exame de DNA e conhecem o pai

Pai. Essa palavra, pela primeira vez, será motivo de celebração para os irmãos Marli de Oliveira Veiga, 56 anos, e Julio Cezar de Oliveira, 54 anos, moradores do Bairro Rubem Berta, na Capital. Depois de meio século se perguntando quem seria o homem que não constava nos registros de nascimento, eles terão um Dia dos Pais ao lado de Adeí Pereira Nunes, 75 anos.

Esse encontro inclui coragem, dúvidas, descobertas e um teste de DNA. E é uma história com começo feliz. Afinal, há muitos abraços que não foram entregues.

Um início desencontrado

A relação de Adeí com Marlene, mãe de Marli e Julio Cezar, foi um namorico de adolescência. Após um tempo, segundo ele, ela sumiu. Quando reapareceu, voltaram a se encontrar. Mas, em seguida, novo sumiço e nunca mais se viram. Ele não imaginava que ela tivesse engravidado e dado à luz dois filhos seus.

- Eu nunca vi ela grávida - pondera.

A vida seguiu seu rumo, ele casou, teve três filhos e cinco netos. Trabalhou muito, e até hoje, apesar de aposentado, continua em atividade: atua com o irmão em um escritório de despachante. No Bairro Rubem Berta, há 52 anos, construiu o seu lar.

A ausência sentida

Foi em frente a esse mesmo lar que Marli passou algumas vezes quando era pequena. Criada pela avó, ela ouvia que ali morava o pai dela e do seu irmão, Julio, que foi criado pelos tios. Com essa dúvida, eles tocaram a vida.

- Eu não fui para a escola, fiz os meus documentos só quando eu casei. A gente cresceu sempre com uma certa frustração - conta ela.

Aos 11 anos, começou a trabalhar em uma casa de família. Logo depois, conheceu seu marido, com quem está há 40 anos. Mãe aos 15, Marli teve três filhos, e viu a família crescer com a chegada das cinco netas.

Julio também lembra de alguns obstáculos. A falta do pai se fazia ainda mais presente em alguns momentos.

- No alistamento, o cara perguntou: "como tu não tem pai?" Eu me sentia constrangido. De onde é que eu venho? - lembra.

O capricho do destino é que, há 32 anos, ele mora na Vila Santo Agostinho, nas proximidades da casa do pai. Ali teve dois filhos e viu chegarem quatro netos. Tão perto e, ao mesmo tempo, tão longe.

Depois de décadas de dúvida e indecisão, Marli deu um passo decisivo para resgatar a sua história e a do irmão. Incentivada pelo marido, em dezembro do ano passado, ela decidiu descer do carro ao passar em frente à casa de seu Adeí.

- Ele estava na rua. Perguntei para ele: "o senhor sabe quem eu sou?" - recorda, aos risos, lembrando do susto que deu no pai.

Adeí confessou que não sabia quem era ela. Então, ouviu Marli contar a sua história de vida e relatar que poderia ser sua filha. Eles combinaram um encontro no domingo seguinte, com a presença de Julio.

- Eu disse que poderiam vir. E aconteceu isso aqui - brinca o pai, sorrindo ao lado dos filhos.

Depois de procuraram a Defensoria Pública, eles receberam orientação para encaminhar o exame de DNA.

- Eu pensava: será que não vou lá e estragar a família? Mas a dinda (Eli, mulher de seu Adeí), tem muito carinho, trata a gente como filho - elogia Marli.

- Agora cresceu a família, apareceu tudo isso na minha vida - celebra o pai.

Alegria de ter um pai

A realização dos exames foi simples. Em um laboratório indicado pela Defensoria, eles coletaram uma amostra de sangue cada um. O resultado foi encaminhado à instituição. Em abril deste ano, a suspeita se transformou em certeza, no dia em que Marli foi buscar os laudos:

- Quando a moça falou o resultado, eu pensei: agora eu tenho um pai!

Depois, foi a hora de comunicar o marido, a família de seu Adeí e o irmão.

- Toda a vida eu tive essa curiosidade. A gente tem uma família agora - celebra Julio.

Depois da confirmação, foi o início da convivência. De uma hora para outra, a família dobrou de tamanho, acolhendo de braços abertos os recém-chegados.

- Eu tenho uma admiração por eles, por serem as pessoas que eles são. Eu me sinto bem com eles, gosto que estejam aqui em casa - elogia o pai.

O churrasco desse domingo será temperado com abraços, conversas, brincadeiras e, por que não, até algumas lágrimas de emoção. Afinal, esses são os elementos de toda boa história. E a dos filhos Marli e Julio com o seu pai Adeí está apenas começando.

O reconhecimento legal

Para incentivar o reconhecimento legal da paternidade, a Defensoria Pública do Estado fez o projeto "Pai? Presente". Em novembro passado, foi assinada parceria com o Sindicato dos Registradores Públicos e a Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado para catalogar certidões de nascimento sem o nome do pai.

- Os colegas das comarcas são incentivados a chamar as mães para sensibilizá-las e, depois, o pai - explica a defensora pública Jamile de Toledo.

Ela destaca que os exames de DNA são gratuitos. A partir deles, se estabelecem acordos para guarda e pensão alimentícia.

Saiba mais

- O projeto foi idealizado pela Ong Brasil Sem Grades, com o objetivo de resgatar a importância da figura paterna na vida dos filhos.

- Qualquer pessoa pode procurar o auxílio da Defensoria para esses e outros casos, independentemente do projeto Pai? Presente.

- Informações pelo site www.dpe.rs.gov.br (detalhes de todas as cidades do Estado)

- Telefone em Porto Alegre: 3211-2233

- Endereço na Capital: Rua Sete de Setembro, 666, Centro.

A função paterna é "decisiva"

Pós-doutor em Ética e Psicanálise, doutor em Filosofia e psicanalista, Mario Fleig explica que a relação de cada filho com o pai é decisiva para a condução da vida. Primeiro, porque isso é fundamental para a pessoa conhecer a sua história. Depois, porque é a função paterna que constrói limites para as vontades do filho.

- É uma conversa constante. É buscar soluções em conjunto - afirma Mario.

Figura que impõe limites

Conforme Mario, quando os filhos recebem limites do pai, eles precisam aprender a lidar com sentimentos como frustração e ódio. E a forma como lidam com isso será levada para outras relações.

- O filho aprende vendo como seu pai lida com as situações.


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