Prática ilegal
Florista cobra R$ 20 por lugar na fila do posto de saúde
Reportagem constatou um problema que se repete há mais de uma década

Uma prática ilegal denunciada desde maio de 2000 pelo Diário Gaúcho continua prejudicando pacientes do Sus na Capital. Aproveitando-se da fragilidade do sistema de marcação de consultas, que ainda não está totalmente informatizado, e da falta de ação das autoridades, "flanelinhas" da saúde seguem vendendo lugares na fila do agendamento.
Comerciante é vizinha do posto
No Centro de Saúde IAPI, na Zona Norte, o usuário não precisa madrugar para disputar as poucas senhas distribuídas diariamente.
Por valores que variam de R$ 20 a R$ 30, ele garante uma consulta com médicos de qualquer especialidade. Basta procurar a pessoa certa: Flávia da Silva, florista do Cemitério Municipal São João desde 1995.
Flávia trabalha e mora no box número 10. O ponto da comerciante fica a menos de 100m da rampa na qual se forma a fila do Sus.
Senha de número 7
Todos os dias, Flávia atravessa a Rua Três de Abril para faturar uma grana extra. Por mês, a cobrança irregular pode chegar a R$ 400. Ontem, a reportagem negociou um lugar por R$ 20 na fila da consulta com o cardiologista. Às 6h30min, havia cerca de cem pessoas aguardando a abertura do Centro de Saúde, prevista para às 7h.
- Trouxe o papel com encaminhamento para o cardiologista? - perguntou Flávia, antes de receber o valor combinado.
São distribuídas oito senhas para o médico solicitado pela reportagem. A nossa era a sétima, mas desistimos para não prejudicar o atendimento de um usuário do Sus.
Reconsulta mais cara
De dia, Flávia vende flores para familiares que vão rezar pelos mortos. À noite, guarda lugar na fila da saúde para os vivos. Após receber o valor combinado, anunciou o aumento do preço do serviço.
Diário Gaúcho - E aí, conseguiu?
Flávia da Silva - Tu é o sétimo da fila, na frente daquele senhor que está sentado ali.
Diário Gaúcho - E se eu precisar de outra consulta?
Flávia da Silva - Daí vai custar R$ 30.
Smic: fora da banca é com a polícia
Segundo a Divisão de Licenciamento da Smic, o alvará da florista é válido até agosto de 2014. A Divisão de Fiscalização afirma que tem atribuição legal de fiscalizar o que é comercializado e o que acontece somente no interior da banca.
Neste caso, quando há alguma irregularidade, a secretaria abre um processo administrativo, dá prazo, ampla possibilidade de defesa e, dependendo do caso, pode até cassar o alvará. Como a cobrança foi feita fora da banca, é um caso para a polícia. A Smic só pode agir se a autoridade policial solicitar a interdição por atividade irregular.
Não há queixa registrada
Delegado da 9ª DP, Alexandre Vieira afirmou ontem que nenhuma queixa havia sido registrada. Ele entende que é um fato difícil de ser enquadrado como estelionato ou extorsão.
- Até hoje, não houve nenhum fato registrado. Talvez isso ocorra porque a pessoa que paga consegue marcar a consulta. O que tem aqui é uma imoralidade, como o caso dos cambistas. Mas, uma vez registrado, vamos examiná-lo - revelou.
Secretaria desconhece
A Secretaria Municipal de Saúde, (SMS) por meio de sua assessoria de imprensa, informou que o sistema de marcação de consultas do Centro de Saúde IAPI é informatizado e que, para reagendamento, é exigido documento do paciente, além da solicitação do médico para reconsulta. Com isso, foi eliminada a praxe de venda de consultas no local.
Com relação à venda de lugar na fila, a SMS afirma que desconhece o fato denunciado e informará à 9ª DP.