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Dia do Samba

Porto Alegre tem samba, sim! Paixão pelo ritmo une músicos de todas as partes da cidade

Seja na área central de Porto Alegre, na Vila Bororó, na Zona Sul, ou no alto do Morro São José, na Zona Leste, o importante é o sentimento que une os amantes do samba de todas as idades

02/12/2013 - 07h02min

Atualizada em: 02/12/2013 - 07h02min


Parte dos gaúchos pode até desconhecer, mas Porto Alegre também respira samba. Em redutos espalhados pela cidade, amantes do ritmo o mantêm pulsante. Seja na área central da cidade, na Vila Bororó, na Zona Sul, ou no alto do Morro São José, na Zona Leste, o importante é o sentimento que une estes apaixonados de todas as idades. 


Hoje, data em que se comemora os dias estadual e nacional do samba, o Diário Gaúcho conta quatro histórias costuradas por este amor. E é numa roda de samba no alto do São José que elas acabam se encontrando. 


Passarinho do Morro


Enquanto carrega o pandeiro embaixo do braço nas subidas e descidas das ladeiras do Morro São José, na Zona Leste, Marco Antônio Rodrigues Moller, conhecido como Dione, 45 anos, sorri largo e alimenta um sonho: viver somente do samba. Quando perguntam o que ele faz nas horas vagas, responde sem titubear:


- Sou segurança. 


Na verdade, Marco Antônio trabalha como segurança de um hospital durante a semana. Nos finais de semana, ele se transforma em Dione, o vocalista da banda Scorpion, que toca nas sextas-feiras e nos domingos no Bar do Floriano, a duas quadras de onde ele nasceu e mora até hoje. Para ele, o samba está presente 24h. E é para sustentar o amor ao ritmo que Marco Antônio usa terno e gravata de segunda a sexta-feira, das 15h às 23h.


- Desde a infância, ficava olhando os músicos nas rodas de samba do Bar do Floriano. Há 20 anos, me viram cantando numa roda e me convidaram para fazer parte de uma banda. Nunca mais parei.


Na década de 1990, Marco Antônio cantou com Carlos Medina em cinco carnavais nas Praiana e na Imperadores do Samba. Depois, se tornou vocalista da Scorpion e há 22 anos toca no Bar do Floriano. Jamais, porém, conseguiu viver apenas da grande paixão.


- Fico esperando o fim de semana. É uma alegria imensa. A participação da comunidade do São José é fundamental. É ela que me dá prazer em seguir insistindo com o samba.


À frente da banda, Dione canta, toca pandeiro, samba para a plateia, sorri. E muito. Os olhos brilham a cada nova música. Até a voz muda: gorjeia feito um passarinho.

 

Assista ao webdocumentário Porto do Samba:


 

Mãos deslizantes


Chapéu panamá, óculos estilo aviador e banjo cavaco nas mãos são as marcas registradas de Marino Carlos da Silva, apelidado de Chumbo, 87 anos, da Vila Bororó, na Zona Sul da Capital. Em quase oito décadas dedicadas ao ritmo, descoberto depois que o pai o presenteou com um cavaquinho conquistado numa rifa da igreja, Chumbo fala do samba como se fosse amor à primeira vista.


- Onde tiver o samba, eu estou. Eu vou até sem querer. Quando vejo, já estou lá. Toco só pelo prazer, não recebo nada de dinheiro - resume.


Há dois anos, o funcionário público aposentado, de fala mansa e caminhar trôpego, participa aos sábados da roda de amigos do Samba do Irajá. Acompanhado do inseparável banjo e da mulher Ana, outra devota do batuque, ele embarca numa kombi com motorista pago pelo casal e só retorna para casa depois da meia-noite. Cabisbaixo, é preciso dizer.


- Fico esperando ansioso até a hora de ir para a banda. Mas triste mesmo é quando termina. Na hora boa, por volta das 23h30min, acaba. 

Chumbo é o que menos sorri na mesa dos 13 músicos que se revezam com pelo menos outros 30 ao longo da apresentação. Compenetrado, afina o instrumento, se posiciona e fica durante as seis horas na roda. Só sai se alguém o convidar. 


- Uma roda de samba é outra coisa. Gosto de ver o pessoal alegre, participando. Aquilo da uma satisfação em mim.


De toque sutil, apesar do apelido ter se originado da mão pesada que tinha quando aprendeu a tocar cavaquinho, Chumbo desliza pelas cordas em silêncio. Por vezes, esboça uma reação. Um sorriso escondido. Em êxtase.


Encontro de almas


Inseparáveis, as cantoras Jô de Souza e Luiza Hellena só se tornaram assim há dois anos por causa do samba. Hoje, vivem dele. Há quase quatro décadas cantando o ritmo, Luiza virou mãe, professora e amiga de Jô, como a própria gosta de salientar.

 

 

Foto: Mateus Bruxel


- Eu cantava em banda de baile e só sabia três sambas. Por acaso, comecei a cantar no Bar do Ricardo e conheci esta mulher maravilhosa. Este ícone da música gaúcha. Foi um encontro espiritual - confessa Jô.


Da amizade, surgiu a parceria na noite e no CiaSamb@.com. De dia, ambas atuam no Sindicato dos Músicos Profissionais do Rio Grande do Sul. À noite, cantam com a banda. Entre uma tarefa e outra, Jô, que também é maquiadora, vira a responsável por dar brilho às faces das duas. Luiza Hellena, ex-cabeleireira, ajeita os cabelos das duas. 


- Até nisso somos uma dupla - completa Luiza Hellena, aos risos. 


Nas noites das terças-feiras, elas formam a dupla vocal da banda. Falante, Jô faz questão de dizer que segue aprendendo sobre samba com a amiga. Antes de se apresentarem, testam os microfones, repassam as letras que serão cantadas e, até, jantam juntas no próprio restaurante. 


Mas é durante a apresentação que o encontro de almas surge, inesperadamente. De mãos dadas, elas se comunicam apenas pela música. E isso acaba contagiando a plateia, formada na maioria das vezes por casais apaixonados por samba, como as duas. É possível ver nos olhos de ambas os diálogos se multiplicando. Enquanto Jô ensaia uns sacolejos ao embalo da música, Luiza é quem dá a voz. E mesmo que troquem a função, o ritmo não se perde. A conexão existe.


Histórias se cruzam no Floriano


Engana-se quem pensa que o mundo do samba de Porto Alegre se resume aos amores dos próprios músicos. Floriano e Maria Salete Flores, de 65 e 57 anos, respectivamente, não cantam, não dançam, nem tocam algum instrumento musical. A tarefa deles é outra: ajudam a manter a história da própria música viva no boteco existente há seis décadas, no alto do Morro São José, antes comandado pelo pai de Floriano.

 

Foto: Mateus Bruxel


Juntos há 37 anos, o homem de piadas fáceis, mas que tem medo de sorrir nas fotos, e a mulher chamada de primeira dama do Morro, que deixou a família de classe média alta para viver com o amado, dedicam os dias e as noites para manter o Bar do Floriano como uma espécie de templo do samba escondido entre os morros de Porto Alegre. 


É também no bar que oferece churrasco do quilinho aos domingos - a pessoa leva um quilo de carne para assar e tem direito a almoçar - que ocorre uma das festas mais tradicionais da cidade, criada por Carlos Alberto Barcelos, o Roxo, no segundo final de semana do mês de novembro: a festa do escorpião, responsável por reunir os sambistas nascidos naquele mês e por fechar duas ruas do São José - tamanha a quantidade de gente que se reune para sambar e comemorar.


- Começamos com uma roda que tinha uma cubana, um violão e um pandeiro. E só foi crescendo. Não bebo álcool, não sou boêmio. Mas o samba me contagia, me faz estar vivo - resume Floriano.


Há quase 25 anos, é no Bar do Floriano que se reunem os amantes das rodas samba e as histórias de vida acabam se cruzando, como as de Chumbo, Dione e as cantoras Jô e Luiza Hellena. 


Fala, sambista!


"Eu não sei se eu nasci com o samba, no samba ou se o samba nasceu em mim. O samba me torna eloquente, eu fico desinibido, perco os temores, os medos. O samba faz com que eu ame sem ser amado e os desamores desaparecem."


Adair Antunes - Jornalista e presidente do Sindicato dos Músicos Profissionais do Estado do Rio Grande do Sul


"É alegria, me dá prazer, me faz com que eu conviva com os amigos."


Silfarnei da Silva Alves - Músico


"É a voz do povo. Não tenho um marco que designa quando ele passou a fazer parte da minha vida. Acho que foi amor à primeira vista."


Marcelo Rocha - Músico


"Sempre gostei do samba desde pequeno. Gosto muito da música e continuo tocando meu pandeirinho para a turma que me acompanha."


Valtinho do Pandeiro - Músico


"É juntar as pessoas que tu gosta. É alegria de viver."


Di Maior - Músico


A data estadual


Em 3 de setembro deste ano, a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul aprovou por unanimidade o Dia Estadual do Samba, projeto de autoria do deputado Raul Carrion (PC do B). No Estado, a data já era comemorada em Porto Alegre, Canoas, Esteio, São Leopoldo, Pelotas, entre outras cidades.


A data nacional


O Dia Nacional do Samba surgiu na década de 40 em homenagem ao compositor brasileiro Ary Barroso, por iniciativa do vereador baiano Luis Monteiro da Costa. Foi num 2 de dezembro que ele visitou, pela primeira vez, a capital Salvador. Sem jamais ter pisado na Bahia, Ary havia composto o sucesso "Na Baixa do Sapateiro". A comemoração foi se espalhando pelo Brasil e virou data nacional. 


Fique atento!


- A Banda da Saldanha retoma hoje as segundas-feiras de samba. Hoje, serão 12 horas de música, do meio-dia à meia-noite, incluindo o lançamento do CD e do DVD da banda. No sábado e no domingo, a programação segue normal.


- A Casa de Cultura Mario Quintana também comemorará o dia com uma roda de samba organizada pelo Samba do Irajá. Será na Travessa dos Cataventos (Rua dos Andradas, 736), a partir das 18h, com entrada franca. 


- O Projeto Vassourinha, no Teatro de Câmara Túlio Piva, terá apresentações de puxadores, destaques de escolas de samba, Wilson Ney.


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