Rali forçado
Falta de manutenção em estradas deixa famílias isoladas em Viamão
Basta cair a primeira gota de chuva para mais de 200 famílias da zona rural de Viamão ficarem distantes do resto do mundo
Ônibus na Estrada Quilombo Gomes e Silva, em Viamão.
Foto: Mateus Bruxel, Agência RBS
De olho no céu
Crateras, pedras, areia e buracos cheios d'água juntos na mesma estrada. E não fazem parte de um rali. Pelo contrário, isolam mais de 200 famílias de duas localidades no distrito de Capão da Porteira, distantes cerca de 45km do Centro de Viamão. Com a falta de manutenção, que já levou até cinco meses para ocorrer, as estradas Das Lombas e Quilombo Gomes e Silva se tornam um desafio diário para quem precisa deixar a região.
Na semana passada, com dificuldades de cruzar os mais de 20km de via de terra, a única linha de ônibus ficou sem atender os moradores por oito dias. Quando voltou a funcionar na rota, acabou atolando na última viagem. Foram mais de duas horas no meio da estrada, no escuro, com as crianças que voltavam da escola.
- Meu filho, que costuma descer às 18h30min na parada, chegou depois das 20h30min - conta a dona de casa Betiane Marinho Malta, 27 anos, que mora há 12 anos na Estrada das Lombas.
Abaixo-assinado pede melhorias
Preocupada com a situação das duas vias, Betiane organizou um abaixo-assinado com mais de 200 assinaturas de moradores da região. No documento, eles pedem manutenção permanente do trecho para que as famílias não corram o risco de ficarem isoladas numa situação de emergência. O documento foi entregue na prefeitura de Viamão na quinta-feira passada.
- Já perdemos três horários da linha de ônibus e só temos três durante o dia. Quem não tem veículo próprio, depende de carona ou anda a pé - acredita Betiane.
"Tomara que não seja eu"
E foi em situações de extrema necessidade que o agricultor aposentado Coraci Paulo Antônio da Silva, 73 anos, morador há 20 anos da Estrada Quilombo Gomes e Silva, precisou caminhar mais de 10km até encontrar a outra linha de ônibus mais próxima, já na RS-040.
- Estava com médico marcado no Centro de Viamão e não tinha como sair daqui porque estava chovendo. Precisei caminhar pela estrada de chão até chegar na rodovia. Fico pensando se alguém morrer num dia de chuva, vai ficar lá até a estrada secar.
Tomara que não seja eu - comentou Coraci, enquanto sacolejava na segunda-feira passada dentro do micro-ônibus colocado pela empresa Palmares para fazer o horário do meio-dia.
Sacolejo indesejado
Na segunda-feira passada, a reportagem do Diário Gaúcho percorreu as duas estradas dentro do ônibus que faz a rota Capão da Porteira. Por cerca de 1h30min, a partir do meio-dia, o que se viu foi um misto de aventura e desafio para o motorista Márcio Santos da Silva, 36 anos, e os passageiros que foram se revezando ao longo da viagem.
No horário, viajam estudantes que vão até a escola na localidade de Chico Serafim, a 20km da localidade de Lombas, idosos e trabalhadores. Sempre com todas as 25 poltronas lotadas e com algumas pessoas em pé, o veículo sacolejou a cada novo buraco ou pedra que cruzava.
Como se não bastassem a poeira da estrada e o sobe-e-desce indesejado, era preciso cruzar os maricás que estão tomando conta da rota em mais de um trecho. É preciso fechar os vidros para não ser arranhado dentro do veículo.
A quantidade de areia em outros dois pontos deixou o ônibus patinando e quase andando de lado para seguir viagem.
No pior momento, um buraco com mais de 1m de comprimento e pelo menos 40cm de profundidade fez o ônibus deitar alguns graus para um dos lados. Foi preciso se segurar com força para não cair no corredor.
Conhecedor da rota há uma década, Márcio detalha cada trecho de dificuldade. Quando chove, não há como passar com o veículo pesado pelas vias nos dias seguintes.
- Já fiquei algumas vezes atolado. Antes de sair da RS-040 e entrar nas estradas de chão, olho o céu para ver se não vem chuva.
Prefeitura começou reparos
Ao receber o abaixo-assinado dos moradores das duas estradas, a Secretaria Municipal de Agricultura se comprometeu de enviar uma caçamba e uma retroescavadeira para melhorar o acesso. Um dia depois, eles iniciaram os trabalhos num trecho de 500m. Porém, uma chuva rápida acabou atrapalhando o serviço. Na segunda-feira à tarde, logo depois de a reportagem do Diário Gaúcho visitar o local, os veículos voltaram a trabalhar.
Mas a manutenção atrapalhou os veículos pequenos, já que o saibro não chegou a ser espalhado e ficou amontoado no meio da via. Ontem, os funcionários seguiam trabalhando no local.
Moradores na Estrada Quilombo Gomes e Silva, em Viamão.
Foto: Mateus Bruxel, Agência RBS
Secretaria se reunirá com moradores
Por meio da assessoria de imprensa, a Secretaria informou que são mais de 1.200 km de estradas rurais em Viamão. As cinco troncais, consideradas as principais dentro da zona rural e que representam 800km por onde passam ônibus e vans, recebem manutenção com saibro, patrola e roçadeira a cada 40 dias. As demais, caso das duas estradas citadas, a demora pode ser maior. A Secretaria agendou uma reunião para o próximo dia 19 deste mês com representantes das duas localidades que ficam isoladas para ouvir as solicitações dos moradores e buscar soluções.