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Dia das Mães

Irmã Conceição é a mãe da Vila Resvalo

Projeto social fundado por Conceição Inaia Andrade, 78 anos, na Vila Resvalo, no Bairro Cristal, atende mais de mil

10/05/2014 - 13h01min

Atualizada em: 10/05/2014 - 13h01min


A irmã Conceição Inaia de Andrade recebe o carinho de alunos na Instituicao de Educação Infantil Casa de Nazare, na Vila Nossa Senhora das Graças, no bairro Cristal

As vielas de terra da Vila Nossa Senhora das Graças, mais conhecida como Vila Resvalo, no Bairro Cristal, em Porto Alegre, ganharam há 27 anos o coração gigante que bate no franzino corpo de 1,50m de Conceição Inaia Andrade, 78 anos. Desde que decidiu morar entre aqueles que recebiam o seu auxílio, a integrante da congregação das Irmãs Franciscanas Bernardinas tornou-se mais do que uma irmã para os moradores: ela é a mãe da comunidade.

Mesmo sem jamais ter parido, a freira é amada e respeitada por crianças e adultos da vila. Ainda na juventude, irmã Conceição deixou o Ceará, terra natal, para entregar-se ao ofício de ajudar ao próximo. Quando conheceu a realidade da Resvalo, em 1985, não se conteve. Durante dois anos, insistiu com a congregação para criar uma creche na comunidade. E foi a partir da motivação da senhora de cabelos brancos e voz macia que a realidade das mais de mil famílias da vila começou a ganhar novas possibilidades.

- Fazíamos recreação com as crianças, mas numa casinha alugada que tínhamos. Os moradores começaram a pedir uma creche. Mas a paróquia e a congregação não queriam assumir. Aí, a comunidade resolveu juntar-se comigo e com mais duas mulheres - recorda a irmã.


 Mais de 600 crianças e adolescentes

No casebre de madeira, rodeado de esgoto a céu aberto por todos os lados, Conceição e os moradores passaram a cuidar de 16 crianças e deram o nome de Casa de Nazaré à instituição.

- Onde hoje estamos funcionavam duas casas de prostituição. Com a arrecadação de doações, conseguimos comprá-las - revela.

Cada vez mais envolvida com a vida difícil da vila, a freira enfrentou a negativa da própria congregação e mudou-se para a comunidade em 1987, mesmo ano de criação da Casa. Desde então, jamais deixou a Resvalo, e determinou-se a tornar o projeto social um exemplo na cidade.

- Começamos com 16 crianças. E hoje a gente se assusta, tem mais de 600 aqui - comenta, orgulhosa. 

"É preciso amar"

Mas o número citado por Conceição vai além das centenas. Pelas duas casas assistenciais fundadas pela freira dentro da Resvalo passaram milhares de crianças e adolescentes nas duas últimas décadas. Os filhos dos primeiros a ingressarem na instituição já estão nos braços da freira e de seus escudeiros, escolhidos a dedo por Conceição.

- Para estar aqui, é preciso amar o que faz, pois o meu lema é promover a vida - afirma a franciscana.

Por meio de parcerias com entidades particulares brasileiras e do Exterior, com a prefeitura e empresas, a Casa de Nazaré ganhou uma filial dentro da própria Resvalo. Desde 2005, o Núcleo São Francisco reforça os cuidados com crianças e adolescentes. Hoje, os pequenos ingressam no projeto nos primeiros meses de vida e ficam até os 18 anos. Aliás, Conceição foi a primeira a implantar na Capital o trabalho educativo com jovens a partir dos 14 anos, no turno inverso ao da escola.

Um olho no escritório, outro na sala de aula

Nos becos da Resvalo ou nos corredores das duas instituições, a cada passo que dá, a freirinha recebe um abraço, um aperto de mão, um aceno, um afago, um sorriso. Não há quem vire o rosto para irmã Conceição.

A rotina dela inicia antes do sol nascer. Quando as primeiras crianças chegam à instituição, às 7h30min, Conceição começa a se dividir entre os dois prédios. A distância entre ambos é de cem metros. Já a moradia da freira fica entre os dois. Nas mesas do escritório e da sala de estar da morada brotam balas e pirulitos. Iniciativa da própria Conceição para "quem quiser adoçar a vida", como diz.

- Toda a mulher tem este dom de cuidar, de ensinar e de educar - acredita a freira.

Sabe os destinos de cada um

E é quando fala das crianças e jovens que já passaram pela instituição que Conceição suspira fundo. Como uma mãe de verdade, sabe o nome de todos eles e procura saber como cada um está. Isso inclui quem já deixou a vila, quem começou a trabalhar, quem casou, quem morreu ou quem seguiu rumos tortos na vida - alguns estão na prisão.

- Biologicamente, eu não sou mãe. Mas, de coração, eu acho que tenho muitos filhos, porque a gente sente a alegria quando eles progridem, como também a gente sente a tristeza quando eles seguem outros caminhos. Não sou aquela mãe coruja, como se diz, mas uma mãe com desejo de que eles se promovam na vida - resume Conceição, não escondendo os olhos marejados.

"Mudou a minha vida"

Mãe de cinco filhos, a doméstica Alessandra Lucas, 32 anos, faz questão de dizer que considera Conceição a segunda mãe dela. Alessandra fez parte do primeiro grupo de crianças a integrar a Casa de Nazaré. E de lá só saiu aos 18 anos.
 
- A vila estava numa fase muito difícil quando a irmã Conceição surgiu para nos ajudar. Muitas famílias não tinham o que comer e dependiam da ajuda dela para alimentar os filhos - recorda a doméstica.

Hoje, Emmanuel, quatro anos, Marcelly, cinco anos, David, dez anos, Brenda, 14 anos, e Dérick, 15 anos, também estão na instituição da qual a mãe fez parte. E Alessandra garante que eles estão em boas mãos.

- Meus filhos têm espírito crítico, sabem o que querem. Ganharam isso na Casa de Nazaré - afirma.

"Mãe que me ajudou em todos os momentos"

Foi num momento de dificuldades, há 24 anos, que Maria Inês Pacheco Flores, 51 anos, também conheceu irmã Conceição. Ela tinha acabado de mudar-se do Interior do Estado para a Vila e precisava trabalhar como faxineira.

- A irmã me estendeu a mão e abraçou as minhas duas filhas pequenas. Duas vezes por semana, eu ajudava a Casa como voluntária.

Com o apoio de Conceição, Maria Inês voltou a estudar, concluiu o Ensino Médio, fez outros cursos na área de educação, e hoje é uma das coordenadoras da Casa. Priscila, 29 anos, a mais velha, se formou em Educação Física e Pedagogia. Durante oito anos atuou como educadora na instituição. Hoje, é professora do Estado. A filha Aline, 27 anos, é educadora numa escola, mas trabalhou durante dez anos na Casa.

- Irmã Conceição é a mãe que me ajudou em todos os momentos da vida. Ela promoveu a minha vida e a das minhas filhas.

Os serviços oferecidos por Conceição

Educação Infantil: crianças de quatro meses a cinco anos e 11 meses. São 200 crianças.
Serviço de convivência e fortalecimento de vínculos: crianças de seis anos a 13 anos. São 185 crianças fixos.

Trabalho educativo: de 14 a 18 anos. São 85 jovens fixos.

Serviço de atendimento familiar: para as famílias. São mais de 500 famílias atendidas por ano.

Fala, Resvalo!

- Muitas pessoas se espelham nela como mãe, como pessoa - diz Dérick Lucas, 15 anos, na instituição desde os cinco meses de idade.

- Ela é exemplo de cidadania. Exemplo é pouco perto de tudo o que ela representa para as famílias - diz Jurema Silveira, 53 anos, há dez anos atuando na instituição.

- Mesmo não tendo parido, ela é uma mãezona.  Ela é mãe e avó de muitas pessoas - diz Alessandra Lucas, 32 anos, que fez parte da primeira turma da instituição. Hoje, tem cinco filhos na Casa de Nazaré.

- Ela é como mãe para as crianças. E todas a amam, assim como os adultos - diz Scheila Zene dos Santos, 29 anos, dona de casa com dois filhos na instituição

Para colaborar com a instituição:
Rua Coronel Timóteo, 350 - Bairro Cristal
Telefone: 3242-9196


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