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Após morte de idosa, EPTC promete melhorias na sinalização em trecho da Avenida Assis Brasil
O DG+ desta semana traz a história de uma dona de casa que, por uma ironia do destino, foi atropelada justamente no local que lutou durante anos para ver melhor sinalizado. A morte de Vera, garantem amigos e familiares, não será em vão: região ganhará melhorias em breve
É num caderno de 96 folhas, com centenas de assinaturas, que o comerciante Romeu Valer, 50 anos, guarda a luta de anos para a instalação de uma sinaleira no cruzamento da Rua Zeferino Dias com a Avenida Assis Brasil, próximo ao número 5.400, no Bairro Sarandi, Zona Norte de Porto Alegre. O surrado caderninho serviria como mais um abaixo-assinado da região e pertencia à dona de casa Vera Lúcia Goulart Mincola, 62 anos, que há 40 dias morreu atropelada exatamente no trecho onde a população solicitava medidas.
- Não deixaremos que a morte dela tenha sido em vão. Fica a herança da luta dela - garante o comerciante Romeu Valer, 50 anos, que desde a morte de Vera assumiu a liderança dos moradores para exigir as alterações no trecho.
O último abaixo-assinado
Uma semana antes de ser atropelada por um CrossFox que seguia na Avenida Assis Brasil no sentido Porto Alegre-Cachoeirinha, Vera, que morava no Parque Minuano há 28 anos, participou de uma reunião no bairro para discutir a antiga solicitação dos moradores. Segundo a filha Cibele, 34 anos, a mãe apresentou um abaixo-assinado com mais de três de assinaturas.
- Eu pedi muitas vezes para a mãe parar de bater de porta em porta, pedindo assinaturas e números de documentos. Mas com este último abaixo-assinado, ela tinha certeza que, desta vez, seria atendida - lamenta a filha.
Brincadeira sobre a travessia
Na noite do acidente, ocorrido por volta das 18h30min, a empregada doméstica de Vera, Gilsiane Bueno do Amaral, 32 anos, recorda ter atravessado a avenida ao lado da patroa. As duas se despediram ao cruzarem a Assis Brasil. Vera seguiu até um mercado para comprar leite.
- Ainda brinquei com ela, perguntando se queria ajuda para atravessar de volta. Rimos juntas antes de ela responder que era mais do que acostumada com a avenida. Nunca pensei que, 20 minutos depois, a Vera estaria morta - lamenta Gilsiane, emocionada.
Casada há cinco meses
Por todos os lados da casa de Vera há fotos dela ao lado das três filhas - Alessandra, 21 anos, Cintia, 33 anos, e Cibele, 34 anos - e do marido, Erci Brito, 70 anos. Mas o quadro mais recente, pendurado na parede ao lado da porta de entrada, Vera não viu ser colocado: a foto ao lado de Erci e do bolo de casamento.
Primos distantes que, depois de décadas, se reencontraram no ano passado, os dois estavam casados havia cinco meses. Eles dividiam-se entre Porto Alegre e a morada de Erci, em Lavras do Sul, na Região da Campanha, terra natal da família de ambos. Desde a morte da mulher, Erci passou a ficar mais tempo em Lavras. É lá que Vera está sepultada.
EPTC promete mudanças no trecho
O maior desejo de Vera deverá ser resolvido nas próximas semanas. Segundo a gerente de Planejamento de Trânsito da EPTC, Carla Meinecke, um trecho de 4km da Avenida Assis Brasil está passando por revisão geral e manutenção total da sinalização, entre o Terminal Triângulo e o limite com Cachoeirinha - incluindo o cruzamento com a Rua Zeferino Dias. A obra custa R$ 180 mil e deve ser concluída em, no máximo, três meses.
- Começamos com a sinalização vertical da avenida, colocando e trocando mais de 170 placas de orientação, advertência e regulamentação. Em seguida, passaremos a horizontal, o que inclui novos semáforos, postes e gradis - destaca Carla.
Foto: Carlos Macedo, Agência RBS
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Até o fim de setembro
Logo depois da morte de Vera, o assessor de relações comunitárias da EPTC, Márcio Ramos, reuniu-se com os moradores da região para esclarecer sobre as mudanças na avenida.
- Estamos com esta demanda (solicitação) da moradora desde 2012, mas a demora para a execução ocorreu porque o projeto era maior e abrangeria todo o trecho. Até o final deste mês, serão incluídos dois semáforos, faixa de segurança para pedestres e gradis no canteiro central - afirma Márcio.
Para Cibele, filha de Vera, a mudança no planejamento de trânsito da região chegou tarde.
- Nada nos trará ela de volta. Justamente ela, que tanto lutou, acabou sendo vítima desta tragédia. Mas, pelo menos, a vontade da mãe será realizada. Isso nos servirá como um afago - conclui.
Justificativas dos moradores para não usarem o atual semáforo
O semáforo leva um minuto até fechar e libera 10 segundos para o pedestre cruzar oito faixas da Avenida Assis Brasil. Está distante quase 200m do cruzamento.
O cruzamento fica exatamente em frente a um centro comercial que liga a Assis Brasil com a Rua Nehita Martins Ramos, conexão com todo o Parque Minuano.
Se o pedestre não usar o corredor do centro comercial, precisa caminhar cerca de 400m para qualquer um dos lados que levam às vias mais próximas: Rua Baden Powell ou Avenida Sertório.
A maior parte dos moradores são idosos ou mães com crianças. Para eles, é mais fácil cruzar diretamente pelo centro comercial do que caminhar mais.
No topo do ranking
A Avenida Assis Brasil está entre as três que lideram o ranking de atropelamentos na Capital, segundo a EPTC. Foram 27 ocorrências no primeiro semestre deste ano.
Entre julho e agosto deste ano, pelo menos oito acidentes de trânsito _ incluindo atropelamentos e abalroamentos - foram registrados próximo ao cruzamento da Avenida Assis Brasil com a Rua Zeferino Dias, segundo a Delegacia da Trânsito de Porto Alegre.
Pelo menos dois acidentes com danos ocorreram no trecho depois da morte de Vera. As marcas do mais recente ainda estão no local: dois orelhões foram arrancados quando um carro perdeu o controle e subiu na calçada.
Nos primeiros sete meses deste ano, 1.180 pessoas morreram em acidentes de trânsito no Rio Grande do Sul, segundo estatísticas do Detran gaúcho. A média é de 170 mortes por mês.
Segundo o Detran, o maior número de mortes ocorreu em Porto Alegre: foram 94 no primeiro semestre.