Saúde pública
Depósito de restos humanos no hospital Presidente Vargas é investigado por vereadores
Funcionários registraram, em vídeo, o depósito com o mau acondicionamento dos materiais
Corpos de dezenas de bebês mortos no parto ou antes mesmo de nascer têm um destino insólito no Hospital Materno-Infantil Presidente Vargas, em Porto Alegre: vão parar num depósito. Caixas, sacos e baldes acondicionam restos dos natimortos numa sala situada nos fundos do Centro Obstétrico, como denunciam servidores. Esses funcionários fizeram, em vídeo, imagens do depósito e as enviaram à Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Câmara Municipal da Capital. O caso está sendo investigado pelos vereadores.
Os restos humanos do Presidente Vargas costumam ser submetidos a um exame anatomopatológico para determinar a causa da morte. Isso era feito, mediante convênio, pelo Hospital Conceição, mas desde junho o acordo foi rompido e, desde então, placentas e fetos se acumulam no depósito. Algumas, em geladeiras. Outras, conservadas em vidros com formol e caixas. Mesmo a imersão em produtos químicos não impede a proliferação de moscas e o mau-cheiro, asseguram os servidores.
- Nossa preocupação é evitar que as moscas contaminem o centro cirúrgico - pondera um servidor.
Desde julho seriam pelo menos 60 fetos descartados, fora outros materiais, como biópsias feitas em gestantes. Eles deveriam ser enviados a exame em horas ou dias, para evitar deterioração.
O Presidente Vargas vive uma crise crônica nesta década. Semana passada, a diretora-geral, a diretora-técnica e o diretor-administrativo do hospital pediram demissão. Referência em obstetrícia, o estabelecimento é cenário, há pelo menos três anos, de leitos vazios, alas desativadas e aparelhos estragados. No quarto andar, da Pediatria, apenas cinco dos 38 leitos estão disponíveis, relata o vereador Thiago Duarte (PDT), que também é obstetra e atua no Presidente Vargas. No terceiro andar, seis dos 12 leitos da UTI Pediátrica estão aptos a receber pacientes.
- Eu sabia que fetos e placentas não vinham sendo encaminhados para exame, mas ignorava que estavam em tão más condições. É uma irregularidade criminosa - define o vereador Thiago.
A crise teve ponto alto em 2011, quando quase 300 funcionários do hospital foram demitidos, por determinação da Justiça. O Judiciário considerou irregular o convênio mantido pelo Presidente Vargas com a Fugast (Fundação de Gastroenterologia), pelo qual eram contratados servidores. Com isso, houve fechamento de setores por falta de pessoal. Desde então há falta de pessoal. Em agosto, a emergência pediátrica do Presidente Vargas chegou a ser fechada para atendimento externo, mas reabriu em novembro.
Vice-presidente do Sindicato Médico-RS (Simers), Maria Rita de Assis Brasil destaca outro aspecto do descarte irregular no hospital: a ausência do resultado da biópsia nas gestantes que perderam os filhos.
- Elas podem estar com câncer e nem saber, já que os testes não são feitos desde julho.
Desde 2000, o Presidente Vargas é administrado pela Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre, oferecendo 100% do atendimento pelo SUS. O secretário Carlos Casartelli, por meio da assessoria de imprensa, assegura que a situação está para se normalizar, porque já foi firmado novo convênio para análise patológica do material do Presidente Vargas. Será com o Hospital de Clínicas. Até lá, o descarte do material humano será providenciado.