Opinião
Felipe Bortolanza: carta ao arrependido
Ao contrário de muitas pessoas, não fiquei estarrecido com o fato de um homem ter roubado o carro e pertences de uma mulher e, horas depois, arrependido, providenciou a devolução dos bens. Tudo documentado em uma carta endereçada à vítima. A história, ainda que surpreendente, tem semelhança com outras já ocorridas. O que me chocou no fato ocorrido em Canoas, na semana passada, foram duas frases quase no final do texto, escrito no caderno do filho que ficou dentro da mochila, no banco do carro.
O autor do roubo, após os pedidos de desculpas, escreveu em bom português e com letra caprichada: “Não sirvo para ladrão (...) Vou continuar pedindo emprego”.
Diante disso, resolvi escrever uma carta a este desempregado. Não o chamarei de ladrão. Ele cometeu um roubo, sim. Deveria pagar por isso. Mas minha abordagem, aqui, é social, não policial. Lá vai:
Caro desempregado
Ladrão arrependido devolve carro e manda carta para a vítima
Em primeiro lugar, devo dizer que eu não gostaria de ter passado pelo susto que a Pâmela e seu filho passaram diante de seu ataque. Mas, seguramente, tua situação é bem pior. Estar sem emprego e ver um filho passando necessidades deve ser uma tortura diária. E é esta situação que me comoveu.
Todos temos medo do desemprego. A demissão costuma ser mais sorrateira do que a ação de um bandido. E o pavor da falta de dinheiro para cumprir as mínimas necessidades da família é algo que, no seu caso, transformou um trabalhador em um delinquente, que atacou uma mulher com uma arma de brinquedo.
Ainda que louvável sua atitude de devolver os objetos roubados (inclusive a mochila, que seria muito útil ao seu filho), espero que não tenha recaída. Um trabalhador que tenta entrar na vida de bandido e conclui que o melhor caminho é seguir a busca por um emprego, merece minha torcida. Imagino como foi reconfortante voltar para casa depois de ter devolvido o carro a sua dona.
Num país de tantos bandidos profissionais e engravatados, o senhor deu um exemplo de como a persistência pelo caminho do bem deve superar a criminalidade. Não desista, lute, estude, distribua currículos, faça trabalhos voluntários, dê bons exemplos para seu filho. Disso, jamais se arrependerá. E tudo vai se ajeitando.
Abraço e muito juízo.