Não tem o que dizer, estou triste. Triste porque Marli Medeiros não estará mais em nosso convívio. Conheci ela há 20 anos, quando comecei na RBS TV. Foi uma das primeiras mulheres que vi mostrando que berço não é destino. Com um instinto natural para multiplicar a partir do zero, Marli ensinou a Vila Pinto, no bairro Bom Jesus, que nada é descartável. Tudo pode se transformar: ela dava novo significado a plástico, papel, alumínio e pessoas. 

Reunia mulheres em uma usina de reciclagem, mostrando as suas famílias que todos somos capazes de mudar nossa história. Em certo momento, eu inventei de dirigir uma peça de teatro no Centro Educação Ambiental, o CEA, como chamávamos. Descobri que ela, além de criar a usina de reciclagem, atendia aos filhos e familiares das mulheres que trabalhavam.

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Como se não bastasse, Marli e sua família construíram uma sala de cinema dentro da quebrada. Fiquei encantado com a iniciativa, ela estava sempre à frente de seu tempo. Quando a especulação imobiliária tentou desapropriar pessoas na comunidade, Marli bateu de frente com muitos de seus patrocinadores e colocou em risco a sustentabilidade de seu projeto. Ela foi de uma coragem absurda ao bater pé e dizer que ter moral na quebrada era mais importante do que ter dinheiro. Na época, achei que ela foi radical e quando disse isso, Marli respondeu: "Espero que um dia você também seja." Fiquei mudo, e meu constrangimento foi amaciado com o sorriso largo que ela sempre dava depois de uma "paulada". 

Assim como Marielle, Marli era uma mulher negra da favela que ousou ir além de suas fronteiras, exigiu respeito dentro e fora da Bonja. Marli, obrigado por acolher minha mãe na Themis quando faziam o curso de Promotora Legal Popular, obrigado por nos ensinar que a chave da mudança está em quem se dispõe a ser a conexão da quebrada e asfalto. Você não partiu, só se multiplicou, e para sempre: #marliPresente