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Rotina

Eles trabalham onde os outros brincam: saiba como vivem os funcionários do Park Tupã

Parque de diversões, que existe há 41 anos, passa os meses de inverno em Porto Alegre

10/08/2018 - 15h09min

Atualizada em: 10/08/2018 - 15h37min


Elana Mazon
Elana Mazon
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Há 25 anos, Porto Alegre vira o endereço do Park Tupã nos meses de inverno. Atualmente, a equipe está localizada em um terreno na Avenida Praia de Belas, próximo ao shopping de mesmo nome. São cerca de 90 pessoas, incluindo os donos, administradores, funcionários, suas famílias e sete crianças. Eles são responsáveis por transportar, montar e fazer funcionar o parque de diversões, que tem 41 anos de história e, atualmente, conta com 21 brinquedos. 

Cada família carrega sua residência móvel e se adapta aos locais onde vai passar uma temporada. Depois do período por aqui, a próxima parada será em Blumenau, Santa Catarina. Durante o verão, dividem-se entre Curitiba, no Paraná, e Florianópolis, a capital catarinense. Quando ocorre a Festa da Uva, em Caxias do Sul, também vão para lá.

Conheça a rotina das famílias que passam o ano viajando e, nas férias, visitam suas casas.

Júlio Cordeiro / Agencia RBS
Parque está localizado em um terreno próximo ao shopping Praia de Belas

Em família
Quem chega ao parque encontra, na bilheteria, uma mulher de sorriso simpático e voz forte oferecendo ingressos e passaportes ao público e dando informações a quem precisa. É Andrea Pereira, 38 anos, sendo 20 como funcionária do local. 

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Aos 18 anos, quando morava em Balneário Camboriú, Andrea foi visitar o parque, que passava uma temporada em sua cidade. Conheceu Arleno Pereira, um dos operadores dos brinquedos, hoje com 48 anos. Resultado? Ela e Arleno se casaram e Andrea passou a trabalhar no Tupã. Os dois têm um filho, João Pedro, 10 anos.

Júlio Cordeiro / Agencia RBS
Andrea trabalha na bilheteria e vive no parque com o marido e o filho, João Pedro

– Quando a gente é jovem, voa, né? Não vê problema em nada. Fui visitar e nunca mais saí do parque – conta ela.

Mas Andrea também não é de reclamar:

– Considero a vida boa. Trabalho, não falta. A dificuldade é a escola do meu filho, tem que trocar a toda hora. Mas ele também gosta de viver aqui. Nos dias de folga, sempre temos algo pra conhecer em cada cidade diferente: uma praia, um shopping...

Arleno, hoje, não trabalha mais nos brinquedos. Ele ajuda a administrar o parque e trabalha em setores como elétrica e manutenção. De Foz do Iguaçu, morou em diversas cidades. Quando passou por Sapucaia do Sul, se juntou ao parque.

– Aqui, todo mundo aprende a fazer um pouco de tudo. Os quatro anos em que viajei sozinho foram mais difíceis. Mas não existe trabalho fácil. Depois, com a Andrea, ficou melhor – diz ele.

Júlio Cordeiro / Agencia RBS
Arleno começou como operador, mas, hoje, faz um pouco de tudo

Nos 30 dias de férias que tiram por ano, Andrea e Arleno descansam em Maringá, no Paraná, onde possuem uma casa.

– Estamos investindo para ter um lugar para viver quando nos aposentarmos – finaliza ele.

Temporariamente separados
O motor-home onde vivem Sidinei Mafra, 47 anos, e Verônica Mafra, 37, com os filhos, Felipe e Pedro, de 15 e três anos, respectivamente, anda mais vazio. É que Verônica está no Rio de Janeiro com o caçula, na casa de sua mãe, para tratar de um problema de saúde.

Júlio Cordeiro / Agencia RBS
Sidinei no Evolution

No parque, Sidinei sempre trabalhou diretamente nos brinquedos, desde 1994, quando entrou para a equipe. Atualmente, é responsável pelo Evolution – um dos brinquedos mais radicais do parque. Ele cuida da manutenção, ajuda a montar e desmontar, auxilia o público que chega para se divertir e garante: quem chega ao local só para brincar nem imagina o trabalho que dá para manter o parque funcionando.

– Qualquer barulho diferente que o brinquedo faz, eu já noto. Às vezes, até já sei onde está o problema. A segurança é prioridade – diz ele.

O primogênito de Sidinei nasceu no parque. Aos 15 anos, ele dá uma ajuda para o pai, eventualmente. Para seu futuro, porém, pretende seguir outra profissão: caminhoneiro.

– Ele quer mudar, mas não quer deixar de pegar a estrada. Está no sangue – diz Sidinei, orgulhoso.

Júlio Cordeiro / Agencia RBS
Felipe (E) quer ser caminhoneiro

"Trabalho que não acaba"
O casal de donos do parque, Índia e Hugo Mayer, de 61 e 67 anos, respectivamente, vem de famílias que conviveram com estradas durante a vida.

– Meu pai tinha um parque pequeno, eu passei a infância viajando. O Hugo era artista em um circo. Nos conhecemos quando eu tinha 15 anos. Com 16, casei com ele. Desde então, viajamos juntos. No início, dormíamos em barracas – conta Índia.

A base da família está em um apartamento em Balneário Camboriú. Mas o casal não vai ao local há um ano.

– Saímos pouco do parque, pois nosso trabalho exige muita responsabilidade. Tem a preocupação com a segurança dos brinquedos, a conservação de tudo, o atendimento aos clientes... – diz a dona.

Os clientes, aliás, são apontados por Hugo como a parte boa de administrar um parque:

– Conhecemos muita gente, de muitos lugares. Eu gosto disso. O resto, é trabalho que não acaba mais.

Apesar do cansaço, ele e a esposa não cogitam a possibilidade de mudar de vida ou de curtir a aposentadoria.

– Acho que, se fizermos isso, a gente morre. Quando vamos para a nosso apartamento, em poucos dias, já queremos voltar. No motor-home, na estrada, me sinto mais livre – conta Índia.

Segunda e terceira gerações
No que depender de Jerusa Mayer, 42 anos, o futuro do Tupã está garantido. Filha de Índia e Hugo, ela cuida da parte financeira do parque. 

Júlio Cordeiro / Agencia RBS
Jerusa e José Vitor curtem o "pátio" de sua casa: um motorhome no parque

– A rotina é pesada, mas vicia. As pessoas, geralmente, passeiam em um motor-home e moram em uma casa. A gente mora no motor-home e passeia em casa – conta ela, que revela passar apenas duas ou três semanas por ano em Balneário Camboriú, na casa da família.

O trabalho começa por volta das 8h e só termina quando o parque fecha, após as 22h, de terça a domingo. Nas segundas-feiras, quando toda a equipe está de folga, Jerusa ainda precisa fazer um balanço da semana e enviar documentos para um sócio do parque, em Santa Catarina. Além da rotina pesada, outros fatores dificultam o trabalho.

– Quando era mais jovem, tudo era mais fácil. Até os problemas, como um caminhão que estragava na estrada, viravam uma festa. Hoje, já temos mais preocupações. Uma delas é a violência. Não podemos nem pensar em ter um veículo com problemas no caminho, pois existe o risco de assaltos – diz ela.

Cinco escolas em um ano
A trajetória de Jerusa no parque começou aos 13 anos. Antes disso, morou com uma avó em Laguna, Santa Catarina. Mas ainda passou alguns anos estudando em escolas nas cidades onde o parque estava. Nesta época, segundo Jerusa, o Tupã era menor e viajava mais, pois não conseguia passar muito tempo em uma mesma cidade, como atualmente.

– Eu chegava a passar por 10, 12 escolas por ano. Não eram todas as instituições que recebiam bem as crianças que iam passar só um tempo. Às vezes, sofria preconceito – conta.

O filho dela, José Vitor, oito anos, também acompanha a família. Mas a rotina dele é menos complicada.

– Ele passa por cinco escolas por ano. Mas, como o parque tem um roteiro específico ao longo do ano, meu filho sempre retorna para as mesmas escolas. Ele até conhece alguns colegas – diz.

Nos finais de semana, José convida seus coleguinhas para um passeio no parque. Afinal, para uma criança, tem seu lado bom morar no local onde todos se divertem.

– Ele fica todo orgulhoso. Mas não sei se ele vai querer seguir neste trabalho. Como ainda é pequeno, fala de várias profissões – conta a mãe.

Casa no meio do público
Ângela Paim é a primeira a chegar em todas as cidades onde o parque vai receber o público. Ela é a responsável por providenciar um terreno que possa receber os brinquedos e os motor-homes e acertar a documentação exigida pelas prefeituras. 

– O parque só sai de um lugar quando está tudo pronto na cidade seguinte. O que facilita é que esta é uma empresa antiga, já conhecida, com profissionais que entendem do assunto – diz ela, que chegou ao Tupã há 10 anos:

Júlio Cordeiro / Agencia RBS
Ângela e o marido em sua casa móvel

– Recebi o convite do seu Hugo (dono do parque) após a morte do Beto Carrero (dono de um dos maiores parques de diversões da América Latina, falecido em 2008), com quem trabalhei por muitos anos.

Desde esta época, a vida nômade é normal para Ângela e seu marido, Antônio Carlos Pereira da Silva, que ajuda na recepção do parque. Do lado de fora do motor-home onde o casal vive, um tapete e duas cadeiras com almofadas recebem os visitantes. Em dias de parque cheio, a fila do Túnel do Terror, que fica logo ao lado de onde o veículo está estacionado, alcança o local e não é difícil ver alguém usando os assentos para descansar.

– Eu não me importo! É normal estar no meio das pessoas. Nas segundas-feiras, que é o dia de folga, aqui é como na casa de qualquer família: tem passeio, tem churrasco... – diz Ângela.




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