Coluna da Maga
Magali Moraes e a bolha assassina
Colunista escreve às segundas, quartas e sextas-feiras no Diário Gaúcho
A gente pisa em ovos, né? Uma bolha no pé tira qualquer possibilidade de um caminhar elegante. Vontade de flutuar e não pisar no chão. De jogar longe o maldito sapato. Quando a bolha surge, acabou a graça. Nosso humor se transforma. Não importa mais o que estamos fazendo. O cérebro chama geral os neurônios pra pensar no incômodo da pele machucada. Fica obcecado. Como pode um pedacinho minúsculo do corpo desestabilizar todo o resto? A bolha lateja. Cada passo é um gemido de dor.
Nessas horas, o band-aid que estava dentro da bolsa desaparece. Chegar no banheiro mais próximo é um trajeto que parece ter quilômetros de distância. Só nos resta mancar. Sorrir amarelo. Jogar o peso do corpo pra outra perna. E sentar o quanto antes, na primeira cadeira que encontrar. Um momentinho de alívio pra juntar forças. O que a gente mais quer é se livrar do sapato, mas uma bolha nunca aparece em casa. Estamos na rua, atarefados, cercados de outras pessoas sem dor aparente.
Esgualepada
Aconteceu comigo semana passada, numa viagem a trabalho. Botei um pisante maneiro pra ter uma dose extra de autoconfiança numa reunião importante. Na volta, saí do avião rastejando. Quando finalmente cheguei em casa, toda esgualepada, contei da bolha pro Ricardo. "Mas o sapato era bonito, né?" Isso é comentário que se faça?! Ele sempre faz. E com a risadinha que só os homens insensíveis conseguem dar. Injustiça. Que fique registrado: eu já tinha usado o sapato (lindão, óbvio) e nenhuma bolha estragou o look.
Nos dias seguintes, tive que erguer uma muralha de gaze e esparadrapo pra recuperar a dignidade no andar. Sabe o que curou meus calcanhares em frangalhos? A água salgada. No fíndi, dei uma caminhadinha na praia com as canelas mergulhadas no mar. A dor se foi. Aliás, zerou tudo. Fez casquinha. A pele regenerou. Ficou a cicatriz. Vou dar um tempo pra esse sapato. Bolhas, só as de sabão. De espuma no banho. Bolhas assassinas, não.