Festa em Porto Alegre
Em noite de superação, três escolas da Série Ouro desfilam no Porto Seco
Bambas da Orgia, União da Vila do IAPI e Imperatriz Dona Leopoldina voltaram à passarela do samba após um ano de jejum no Carnaval
Resistência e superação foram as palavras mais repetidas na primeira noite de apresentação das escolas de samba de Porto Alegre. Tanto na fala quanto na atitude, as agremiações ocuparam a avenida do Complexo Cultural Porto Seco, na zona norte da Capital, demonstrando a força das comunidades apesar das dificuldades agravadas pela escassez de recursos.
Na série Ouro, as escolas Bambas da Orgia, União da Vila do IAPI e Imperatriz Dona Leopoldina voltaram à passarela do samba após um ano de jejum no Carnaval. Entre a noite deste sábado (16) e a madrugada de domingo (17), será a vez das apresentações da Império da Zona Norte, Imperadores do Samba e Estado Maior da Restinga.
Outras quatro agremiações da série Prata se apresentaram na primeira noite de desfiles. Na segunda noite, serão seis escolas da mesma série na avenida. Os jurados avaliaram sete quesitos: bateria, harmonia, samba-enredo, evolução, tema-enredo, fantasia e mestre sala e porta-bandeira.
O centenário de Nelson Mandela (1918-2013) foi celebrado no Porto Seco pela Bambas da Orgia, escola que abriu o desfile da série Ouro com quase duas horas de atraso. O enredo foi pensado para o ano passado e, como as estruturas já estavam prontas, foram levadas para a avenida este ano. Ao longo da evolução e com duas alegorias, a escola mostrou as riquezas da África do Sul, retratou o período em que Mandela esteve preso e, por ultimo, sua liberdade e a chegada do líder negro à presidência do país.
A utilização do mesmo samba foi significativo especialmente para Michele Volkweis, 39 anos. Compositora da canção, ela viveu a frustração de ter seu samba escolhido no ano em que o Carnaval não ocorreu. Viveu um ano de incertezas até ver sua criação interpretada na avenida. De muleta devido ao rompimento dos ligamentos do joelho esquerdo, ela desfilou ao lado dos interpretes e disse que atravessaria a avenida mesmo que fosse de cadeira de rodas:
— É muito importante mostrar que a gente consegue fazer carnaval, que temos condições. Agradeço muito a escola que seguiu acreditando no nosso tema. Esse carnaval é o da superação total. O Bambas está desfilando por amor e pela manutenção da nossa cultura.
A União da Vila do IAPI cantou a trajetória de Alceu Collares da infância, em Bagé, até a chegada ao Palácio Piratini, onde governou o Estado (1991-1994). Uma grande alegoria trouxe o ex-governador e sua esposa Neuza Canabarro. Com fantasias caprichadas e animação dos integrantes ao cantar o samba, a escola empolgou o público e emocionou o próprio Collares. Ao encerrar o desfile, o político de 91 anos estava vibrante:
— Estou apaixonado. A escola retratou minha vida, falou da vila pobre onde nasci. Sou filho de pai negro e de mãe índia, meus pais queriam muito que eu vencesse na vida. E eu venci.
A esposa de Collares também se surpreendeu com a disposição e o ânimo do marido ao entrar na avenida. Segundo Neusa, ele atualmente sai pouco de casa, mas se transformou assim que o desfile começou.
Com discurso politizado, a Vila do IAPI levou sua indignação ao Porto Seco na letra do samba-enredo e na interpretação dos integrantes. Em uma das alas, os participantes protestavam com cartazes que cobravam o poder público e pediam respeito ao Carnaval.
Em busca da terceira vitória da sua historia, a Imperatriz Dona Leopoldina homenageou a cidade de Triunfo e encerrou a primeira noite de desfiles já na manhã deste sábado. No samba-enredo, o município, localizado a 70 quilômetros de Porto Alegre, foi apresentado como um dos berços da Revolução Farroupilha.
A performance destacou as cores da escola — laranja, preto e branco — e trouxe a encenação de lutas e batalhas da Guerra dos Farrapos. A evolução da agremiação exaltou desde seu personagem mais ilustre, Bento Gonçalves, até as tribos que colonizaram a cidade e o Polo Petroquímico, motor da economia local.
Intérprete da escola, Marcio Medina, 45 anos, avalia que, apesar das dificuldades, a escola se preparou para fazer uma boa apresentação e conseguiu animar seus integrantes:
— Superação é a sina da nossa escola, mas com muita garra conseguimos contar a historia da cidade de Triunfo que merece esta homenagem.