Papo reto
Manoel Soares visita sobrevivente de ataque a escola em Suzano
Colunista escreve nas edições de final de semana do Diário Gaúcho
As cabeças giravam de um lado para outro como se buscassem uma fenda no espaço-tempo que as levasse para as 7h do dia 13 de março. Lágrimas ainda presas na parte inferior da pálpebra se recusando a cair, pois sabiam que, na hora que a primeira rolasse sobre os rostos ruborizados pelo medo, é porque aquele que chamavam de “meu menino” já não estava mais ali.
Dos celulares, podíamos ouvir os ecos dos gritos dos presentes nos vídeos gravados. A vontade é de abrir os caixões que usam para transportar os corpos e assoprar nas narinas e na boca até o corpo levantar. Essa vontade não é fruto de um altruísmo, mas de um pavor ensurdecedor que retumba no peito por cada mãe que naquela multidão vai sobre as próprias pernas em um urro de dor inimaginável para quem não viveu.
Ao falar com minha mãe ao telefone, ela me disse que nenhuma mãe aceita ouvir: “Seu filho está morto”. Ela estava certa, era como se a frase fosse dita em um idioma que elas não entendiam. Do nada, saíam do surto e diziam “Manda chamar meu filho”, como se o cérebro, em um mecanismo de sobrevivência, deletasse a informação da partida dele.
Transe
Eu, perdido em meio a tudo aquilo, lembrava dos meus pequenos e quase caía no transe. Sacudia a cabeça e tentava voltar, mas era complicado. De repente, o caos me apresenta esse cara da foto. José Vitor saiu com um machado cravado no peito e não somente conseguiu buscar socorro. Conversando com ele, vi que se sentia muito culpado por não ajudar os colegas que morreram.
Na hora, disse a ele que o machado que veio cravado em seu corpo poderia ter sido usado para matar mais pessoas. Sendo assim, ele ter saído de lá com o machado no peito foi uma forma de salvar vidas. Choramos juntos depois disso.