Inspiração
Melissa mais sete: livro reúne histórias de gaúchas na luta contra o câncer de mama
Verba arrecadada com a comercialização de "Lenços da Esperança" será destinada à associação que atende pacientes em tratamento do tumor em São Leopoldo
Com um lenço de tecido fino rosa no pescoço, Melissa Portal, 33 anos, conta sua história de luta contra o câncer de mama. Com um sorriso que surpreende quem desconhece sua força de vontade de viver, revela uma inesperada frustração sobre a volta do tumor.
— Não vou perder o cabelo dessa vez. Eu adorei ficar careca, foi uma festa em casa — afirma, enquanto explica que o bom humor foi a maneira encontrada para manter a qualidade de vida do marido e da filha, que, à época do primeiro tratamento, em 2016, tinha menos de um ano de idade. Atualmente, as sessões de quimioterapia são mais brandas, e por isso ela não perderá o cabelo.
A trajetória de Melissa, que tentava esconder da família a angústia da doença ao brincar com a cabeça descoberta, está no livro Lenços da Esperança (edição independente), que reúne ainda relatos de outras sete mulheres que enfrentam ou já venceram o tratamento. A obra foi escrita por Igor Bueno. Ele colheu os depoimentos e os reuniu em 96 páginas, disponível ao público a partir do fim do mês de outubro pelas redes sociais do projeto.
Toda a verba da comercialização será destinada à Associação Força Rosa, que atende mais de 50 mulheres em São Leopoldo, no Vale do Sinos. Com psiquiatras, fisioterapeutas, terapeutas sexuais, professores de dança e de artesanato, entre outros, a associação quer passar a ajudar também quem não tem acesso a tratamento médico. Como exemplo do alto custo, Melissa afirma que as sessões de quimioterapia às quais será submetida custarão R$ 48 mil. O sonho de transformar sua luta e de outras mulheres em livro surgiu de um sonho.
— Ela me ligou e disse que tinha sonhado que autografava um livro. Encarei como uma missão e falei: "Vamos fazer". Acordei um amigo que é escritor independente e, agora, o sonho está virando realidade — define Estelamáris Bernardes, 53 anos, amiga e "fada madrinha" de Melissa.
O nome da publicação, destaca Estelamáris, tem referência na beleza do lenço, usado na cabeça ou no pescoço, e "não para secar as lágrimas de choro", como já foi questionado. Colocada no formato de livro pela amiga Ana Carolina Rodrigues, a publicação terá 2 mil exemplares e será bancada por financiamento coletivo, que angaria recursos neste site.
Em dois meses de entrevistas, o livro tem histórias de superação de mulheres que têm entre 30 e quase 80 anos. Como o relato de Carla Daudt, 52 anos: "Câncer não é o fim. É esperança, o começo de uma luta". E o de Santina Viegas, 78 anos, que perdeu o marido e passou a encarar os problemas cotidianos de outra forma: "O câncer me ensinou a valorizar a vida. Muitas vezes, temos tudo e não sabemos valorizar".
Na mesma cirurgia em que seus seios foram retirados, Melissa recebeu próteses de silicone. As marcas da operação no peito são ignoradas.
— Nunca tive problema com a cicatriz. Meu marido também encara muito bem. Pra mim, o importante é eu estar viva. Mas há mulheres que não ficam peladas na frente do companheiro — cita, ao lembrar da mãe e da avó, que morreram vítimas do mesmo tumor.
Histórias
Em Lenços da Esperança, profissionais da área buscam desmistificar o tratamento e informar as formas de diagnóstico preventivo. Com frases do tipo "câncer não pega", mulheres em fase de quimioterapia contam situações de preconceito vividas no dia a dia. O impacto da doença em familiares também é presente nas páginas do livro: "Perdi minha esposa para o câncer quando ela tinha 29 anos e, com a Melissa, sempre estivemos atentos. Quando ela me disse "cuida da minha filha?", e me abraçou, foi muito impactante", diz Gilberto Portal, 60 anos.
A partir de segunda-feira (7), uma exposição do fotógrafo Fábio Pilger mostrará retratos das tantas personagens do livro. A mostra ficará na Câmara de Vereadores de Porto Alegre até o dia 15 de outubro.
Estelamáris, a "fada madrinha" que idealizou o projeto resume o livro:
— É incrível ler os relatos e sentir o que essas mulheres passaram. É a história como ela é.