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Com cepa de Manaus, RS entra em fase mais perigosa da pandemia; futuro depende de vacina e cumprimento de regras

Um ano após o primeiro caso de coronavírus no Rio Grande do Sul, nesta quarta-feira (10), analistas alertam para risco de Brasil se tornar celeiro de novas variantes

10/03/2021 - 08h54min


Marcel Hartmann
Marcel Hartmann
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Antonio Valiente / Agencia RBS

Com a confirmação, na semana passada, da transmissão comunitária da variante de Manaus em solo gaúcho, profissionais da saúde projetam uma nova, e mais perigosa, fase da pandemia no Estado e no Brasil como um todo, no momento em que se chega ao primeiro ano do registro do caso número 1 no Rio Grande do Sul, nesta quarta-feira (10). Para contê-la, cuidados sanitários precisarão ser intensificados e a vacinação em massa deverá ser acelerada.

A ciência ainda não sabe se a cepa P.1, surgida primeiramente em Manaus, traz mais riscos de mortes para quem é infectado, mas há estudos mostrando que ela é transmitida mais facilmente. O resultado é que, com mais pessoas contaminadas, aumenta o número de hospitalizados e de mortos pela covid-19. 

O surgimento da cepa é apontado por profissionais da saúde como um dos responsáveis pelo colapso das Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs) gaúchas e pelo aumento das internações de jovens e grávidas

Analistas também observam que o sucesso no combate ao próximo ano pandêmico dependerá da capacidade dos gaúchos de usarem máscaras e evitarem aglomerações, das medidas de restrição impostas por governos e da velocidade de vacinação. 

Um entrave é a baixa aquisição de doses pelo governo federal, que firmou acordos com poucas farmacêuticas e chegou a negar acordo com a Pfizer. 

— A variante P.1, que tem se mostrado em vários estudos mais transmissível, encontrou um cenário de baixa adesão a medidas de proteção e de tentativa de vida normal por parte de boa parcela da população. É um cenário perfeito para uma grande explosão de casos — analisa o médico Alexandre Zavascki, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e membro da Sociedade Sul-Riograndense de Infectologia (SRGI).  

Em Araraquara, interior de São Paulo, a cepa de Manaus foi encontrada em 93% dos casos analisados na cidade, segundo estudo do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo (IMT-USP). 

A velocidade de infecções foi tão grande que hospitais colapsaram rapidamente, a ponto de a prefeitura impor um lockdown aos moldes europeus. A boa notícia é que, apesar da presença da variante, a epidemia na cidade começa a melhorar como resultado do distanciamento social.  

Aumento de casos  no Estado

No Rio Grande do Sul, analistas afirmam que não é possível apontar, ainda, quando a nova cepa se tornará dominante no Rio Grande do Sul. Quando isso ocorrer, é esperado um aumento ainda maior na velocidade de infecções. 

O médico epidemiologista Ricardo Kuchenbecker, gerente de risco do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), pontua que, com a emergência de novas variantes, a ideia de imunidade de rebanho adquirida por infecções cai por terra, uma vez que há risco de reinfecções. 

Manaus é o maior exemplo disso: passou por dois colapsos da saúde, apesar de grande parte da população ter sido infectada na primeira onda. Com a abundância de infecções, há risco de o Brasil se tornar um celeiro de novas cepas.

— Nesta nova fase da pandemia, a única forma de se esperar por imunidade de rebanho é por vacina ou por um custo elevadíssimo de óbitos. Somado a isso, há o atraso no calendário de vacinação. Muitos casos novos são porta aberta para a emergência de novas variantes e para o sobrecarregamento do sistema de saúde — diz o epidemiologista. 

Em um contexto no qual a ideia de imunidade de rebanho deixa de existir, torna-se ainda mais importante que a população use máscaras, evite aglomerações e, em tempos de sobrecarga hospitalar, fique em casa, destaca o virologista Fernando Spilki, coordenador da rede Corona-ômica do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e professor da Feevale.

— Se baixássemos a curva e a volta de atividades fosse racional, o cenário seria mais otimista. Mas, da maneira como está e com vacinação lenta, vamos para um cenário pessimista. Vemos agora o que parece uma transição de segunda para terceira onda, e nada nos impede de termos um cenário difícil novamente no inverno. Se não trabalharmos direito, iremos para quarta ou quinta ano no fim deste ano. Precisamos de mais bloqueios, conscientização e vacinação — avalia Spilki. 

O maior desafio desta geração 

Dado o panorama atual, projeção feita pelo Instituto de Métricas e Avaliação da Saúde (IHME, na sigla em inglês) da Universidade de Washington prevê entre 25 mil e 32 mil mortes por coronavírus no Rio Grande do Sul na segunda metade de junho. Apesar de sombrio, o cenário pode ser evitado. 

— Estamos em um caminhão desgovernado e, com a nova cepa, é como colocar esse caminhão em uma ladeira. Mas ainda temos como controlar esse caminhão. Há jeito para o Rio Grande do Sul, mas depende de nós. E da vacina — diz a médica epidemiologista Lucia Pellanda, professora e reitora da  Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA).

Luís Lamb, coordenador do Comitê de Dados do Palácio Piratini e secretário de Inovação, Ciência e Tecnologia, afirma que o governo do Estado está empenhado em abrir mais leitos hospitalares – o número de Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs) cresceu em 130% frente a antes da pandemia –, mas conclama os gaúchos a respeitarem os protocolos sanitários.

— O Estado está ampliando leitos, mas isso deve ser acompanhado de medidas de comportamento individual e de consciência coletiva. A pandemia está se espalhando de forma mais rápida do que com as cepas originais. Esse desafio só será vencido se todos nós estivermos tomando no mesmo rumo. É talvez o maior desafio desta geração, do Brasil e do Rio Grande do Sul no último século — resume Lamb.


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