De forma temporária
Comércio gaúcho negocia suspensão de contrato e redução de jornada na bandeira preta
Com agravamento da pandemia no Estado, medidas vêm sendo discutidas nas últimas semanas entre sindicatos de empregados e patronais
Em meio às restrições para abertura do comércio durante a vigência da bandeira preta no Rio Grande do Sul, sindicatos de trabalhadores e patronais vêm discutindo a realização de acordos coletivos que permitam a suspensão de contrato ou a redução da jornada de trabalho temporariamente. A medida já é acordada em Porto Alegre, podendo ser adotada em outras cidades do Estado nas próximas semanas.
Um dos setores mais impactados pela pandemia, com o fechamento de 4,4 mil postos de trabalho com carteira assinada em 2020, de acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o comércio voltou a ter sua rotina afetada pela crise sanitária. Com a suspensão da cogestão pelo menos até 7 de março, que permitia prefeituras adotarem regras mais brandas, os estabelecimentos não essenciais ficaram impedidos de abrir as portas ao público enquanto perdurar a classificação estadual de altíssimo risco de contágio do coronavírus.
Como o programa federal que permitia a suspensão de contrato e redução de jornada, com complementação de parcela do seguro-desemprego, perdeu a validade em 2021, entidades passaram a negociar uma saída própria. Em Porto Alegre, o Sindicato dos Empregados no Comércio (Sindec) firmou acordo no início de fevereiro com 11 entidades patronais.
Pelo documento, as empresas podem suspender o contrato de trabalhadores inseridos no grupo de risco e dos demais funcionários quando ocorrer o fechamento obrigatório do comércio, desde que haja pagamento mínimo de 50% do valor do salário como ajuda de custo. Há garantia de emprego pelo período da suspensão. Em caso de redução de jornada, o corte poderá variar entre 20% e 40% da remuneração. A vaga é garantida pelo período da redução, acrescido de um terço. Em caso de rescisão antecipada, serão indenizados os dias faltantes pelo salário integral.
— Até o momento, cerca de 60 empresas nos procuraram para encaminhar a documentação — disse o presidente do Sindec, Nilson Neco, projetando que cerca de 30 mil dos 90 mil trabalhadores da categoria acabem entrando no regime.
Negociação no Estado
Movimentos semelhantes vêm sendo alinhados em outros locais. O presidente da Federação dos Empregados no Comércio de Bens e Serviços do Estado (Fecosul), Guiomar Vidor, diz que a entidade debate a possibilidade com seus 51 sindicatos associados no Interior. No entanto, a preferência é por encaminhar acordos com um perfil diferente do realizado na Capital.
— Temos falado sobre a criação de um banco de horas negativo para esse período de bandeira preta, para que se compense as horas de trabalho adiante, e também a alternativa de suspensão de contrato para os trabalhadores de grupo de risco, com pagamento de 50% do salário e garantia de contribuição previdenciária — destaca Vidor.
Em Santa Maria, procurou-se evitar a suspensão ou redução de jornada em um primeiro momento. A opção alinhada entre os sindicatos de trabalhadores e patronal foi a antecipação das férias durante o período da bandeira preta, permitindo que sejam concedidos até 14 dias.
— Buscamos construir soluções para esse período de bandeira preta, que é grave. Mas, se a situação perdurar, vamos ter de discutir medidas mais prolongadas — diz Rogério Reis, presidente do Sindicato dos Comerciários no município.
Presidente da Central Única dos Trabalhadores do Estado (CUT-RS), Amarildo Cenci, avalia que a demanda por acordos pode crescer nas próximas semanas, mesmo em outras categorias. Ele menciona que sindicatos ligados ao ensino privado e à alimentação discutem com as empresas a possibilidade de redução de jornada e suspensão de contrato para funcionários inseridos nos grupos de risco.
Cenci avalia que atuação do governo federal levou ao agravamento da pandemia e que, com a vacinação da população avançando a passos lentos, será necessário recriar o benefício emergencial para manutenção de empregos.
Validade dos acordos
O vice-presidente do Tribunal regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4), Francisco Rossal de Araújo, constata que, com o fim da validade das medidas que regravam a redução de jornada ou suspensão de contratos, a situação atual lembra o início da pandemia, em março de 2020. Naquele momento, acumulavam-se dúvidas sobre como proceder em relação a mudanças na relação entre empregado e empregador.
Em princípio, Araújo enfatiza que não há problemas entre os acordos realizados atualmente entre sindicatos de trabalhadores e patronais. No entanto, o desembargador observa que os acordos não podem onerar unicamente o trabalhador pela situação de fechamento da empresa.
— O que não se pode é simplesmente suspender o contrato e deixar a pessoa sem nenhuma remuneração. Uma cláusula leonina dessa não é válida — ressalta.
Araújo ainda recomenda que, em caso de acordos para a suspensão ou redução de jornada entre os sindicatos, seja estabelecido um período máximo de validade da medida.