Direto da Redação
Lis Aline Silveira: "A batalha pelo lixo"
Jornalistas do Diário Gaúcho opinam sobre temas do cotidiano
Há vários anos, temos o hábito, aqui em casa, de separar o lixo seco do orgânico. Moro em São Leopoldo, e no meu bairro, três vezes por semana, passa o caminhão de uma cooperativa de reciclagem para recolher as nossas sacolas. Já dá para saber de longe que ele vem, pois toca uma musiquinha instrumental intermitente, tipo uma flauta peruana.
Pois bem, de uns tempos para cá, notei que o caminhão tem passado direto pela minha casa. Como assim, não querem mais o meu lixo seco, tão organizadinho e guardado com tanta consciência ecológica?
Foi aí que comecei a investigar: mesmo o caminhão não passando, a sacola não estava mais lá. Com um pouco mais de observação, matei a charada. Está cheio de gente de olho no meu lixo. Homens e mulheres que anteriormente tinham emprego viram-se desempregados, ou, mesmo com os ofícios anteriores, aposentadorias e auxílios, não estão conseguindo colocar comida na mesa, pagar a conta da luz, comprar um botijão de gás. A saída: enjambrar algum tipo de carrinho e sair pelas ruas a catar resíduos, para vender e conseguir alguns reais a mais.
É mais um lado triste da crise e da miséria que se avolumam no país. E um problema de difícil solução. Aqueles resíduos tirados na minha lixeira garantirão algumas moedas a quem os pegou, mas farão falta lá na frente, para os trabalhadores organizados da usina de reciclagem.
O problema também está muito presente em Porto Alegre, onde inclusive há um grupo de coletores informais que acampou em frente à prefeitura, exigindo liberdade para atuar sem perseguições nem multas. A solução? Além de ser necessária buscar a organização deste novo grupo de coletores, me parece que o problema só reduzirá quando o país voltar a ter melhores condições de vida para a parcela mais pobre da população. Com pouco emprego, preço dos alimentos, dos combustíveis e dos serviços lá em cima, ainda vai ter muita gente brigando por lixo por aí.