Notícias



Tratamento em risco

Pacientes com leucemia sofrem com falta de medicamento no Rio Grande do Sul

Problema é registrado desde dezembro do ano passado e não há previsão de novos envios por parte do Ministério da Saúde

22/02/2022 - 15h10min

Atualizada em: 22/02/2022 - 15h11min


Lisielle Zanchettin
Lisielle Zanchettin
Enviar E-mail
Alexandre Chemello / Arquivo Pessoal
Em falta desde dezembro, mesilato de Imatinibe garante tratamento de pessoas com leucemia mieloide crônica

O fim do estoque e a incerteza da chegada de novos lotes do medicamento Mesilato de Imatinibe preocupa pacientes do Rio Grande do Sul. Este tipo de remédio é utilizado para tratamento da leucemia mieloide crônica (LMC), um tipo de câncer que envolve as células mieloides da medula óssea.

A compra do medicamento é de responsabilidade do Ministério da Saúde, que deve realizar o envio mensalmente aos Estados para distribuição aos hospitais que atendem via Sistema Único de Saúde (SUS). Pacientes e instituições, no entanto, relatam a falta da medicação desde dezembro de 2021.

Diagnosticado com LMC em 2001, o aposentado Ayrton Pedro, 69 anos, morador de Lajeado, no Vale do Taquari, realiza o tratamento no Grupo Hospitalar Conceição (GHC) em Porto Alegre e conta que no último mês teve que se deslocar à Capital três vezes para buscar pequenas quantidades do remédio.

– Na primeira vez, recebi dez comprimidos. Como tomo um por dia, era pouco para o mês. Depois, me entregaram mais dez e na última vez, apenas cinco. A sorte é que eu fiz uma pequena reserva durante esses anos de tratamento e ainda tenho alguns comprimidos extras em casa. Mas uma hora vai acabar e não sei como será – conta. 

O fracionamento, segundo o aposentado, é uma maneira que o hospital adotou para que os pacientes recebam ao menos um pouco da medicação. 

Em nota, a Secretaria Estadual de Saúde (SES) confirma a falta do Mesilato de Imatinibe 400 mg e informa que não há estoque e previsão de reabastecimento do Ministério da Saúde.

O estudante de Educação Física, Alexandre Chemello, 54 anos, recebeu o diagnóstico da doença em 2007. Morador de Porto Alegre e também paciente do GHC, conta que a medicação trouxe qualidade e perspectiva de vida.

– Na época em que descobri a doença os pacientes tinham até dois anos de sobrevida. Com o Imatinibe vivemos normalmente, mas precisamos seguir com o tratamento. Ele é um inibidor da célula cancerígena, confesso que tenho medo do que possa acontecer com a interrupção do tratamento – relata, angustiado.

Durante o mês de janeiro, Chemello não recebeu medicação e manteve o tratamento com uma pequena reserva que havia em casa. Em fevereiro, até o dia, havia recebido apenas cinco compridos por meio de doação de outros pacientes. Por conta disto, protocolou uma denúncia no Ministério Público Federal e aguarda retorno. 

GZH solicitou informações e esclarecimentos ao Ministério da Saúde, mas até a publicação desta reportagem não houve retorno. 

O que é a LMC

A Chefe do Serviço de Hematologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Alessandra Paz, explica que a leucemia mieloide crônica ocorre devido a um erro nos cromossomos 9 e 22. A partir disso, a célula passa a produzir a proteína chamada de P210, fazendo com que se multiplique e em alguns casos, evolua para leucemia aguda

Os remédios inibidores, como o Imatinibe, realizam a quebra desta junção e interrompem a produção da proteína causadora da leucemia. Através da utilização correta do medicamento, o paciente consegue ter a doença neutralizada. 

– Antigamente, a única solução era o transplante de medula óssea, que tem um alto índice de mortalidade. Os inibidores são a resolução. No entanto, a interrupção do tratamento ou a utilização de uma dose menor pode fazer com que o paciente perca o controle da doença e retorne com mais gravidade - explica. 

De acordo com a Associação Brasileira de Linfomas e Leucemia (Abrale), pacientes relatam falta do inibidor no Hospital São Lucas da PUCRS, Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, Grupo Hospitalar Conceição, Hospital de Clínicas de Porto Alegre e Hospital Bruno Born, de Lajeado. 

O que dizem os hospitais

  • Hospital São Lucas da PUCRS
    A instituição confirma a falta da medicação e informa que dos 1.160 comprimidos para tratamento de pacientes, apenas 120 foram recebidos em janeiro. Até o dia 21 de fevereiro, não houve recebimento de novas remessas. 
  • Grupo Hospitalar Conceição
    O mesmo se repete no GHC. São 130 pacientes realizando tratamento e não há estoque da medicação. 
  • Hospital de Clínicas
    Também relata o mesmo problema e afirma que se caso um novo lote de medicamentos não seja enviado, não haverá medicação para tratamento dos pacientes durante o mês de março.
  • Santa Casa de Misericórdia
    A instituição afirma ter ainda um pequeno estoque da medicação e prioriza grupos de pacientes que não podem interromper o tratamento.
  • Hospital Bruno Born, em Lajeado
    Cerca de 20 pacientes não receberam a medicação durante o mês de fevereiro. O hospital informa que isso ocorre devido ao atraso e envio em quantidade reduzida pelo Ministério da Saúde. 

Leia, na íntegra, a nota da SES/RS

"No âmbito do SUS, os tratamentos de oncologia acontecem através de serviços hospitalares CACON’s (Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia) e UNACON’s (Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia), serviços hospitalares. A inclusão dos pacientes vincula-se aos critérios estabelecidos em Protocolos Clínicos do Ministério da Saúde. Atualmente, os medicamentos oncológicos cuja compra está centralizada pela União são trastuzumabe-150mg, pertuzumabe 420 mg, rituximabe-100mg e 500 mg, dasatinibe-20mg, nilotinibe-200mg, imatinibe-100mg e 400mg. A União faz a aquisição dos medicamentos e repassa ao Estado que distribui aos CACONS/UNACONS, mensalmente.

Os Protocolos Clínicos trazem, dentre outras, informações sobre os fármacos e o esquema de administração. O cadastro dos usuários é feito através de CACON/UNACON à SES/RS através de sistema informatizado. O Estado avalia e aprova as solicitações também via sistema informatizado e encaminha a programação trimestral ao Ministério da Saúde. Para melhor entendimento segue extrato da Portaria de Consolidação GM/MS nº 02/2017 onde consta o cronograma fixo da programação de medicamentos, seguido pelo estado, enviado ao MS. Na programação ao MS é informado o Cartão Nacional do SUS, nome do paciente, Hospital, cidade, fármaco e esquema medicamento.

Atualmente o fármaco que está em falta é imatinibe-400mg e ainda não temos previsão de reabastecimento do MS, o fármaco nilotinibe-200mg não está em falta."


MAIS SOBRE

Últimas Notícias