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Michele Vaz Pradella: "O crime de ser mulher"

Jornalistas do Diário Gaúcho opinam sobre temas do cotidiano

29/06/2022 - 09h00min


Michele Vaz Pradella
Michele Vaz Pradella
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Agência RBS / Agência RBS
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“Senta que nem mocinha!”, “Olha o estado da tua roupa, parece um moleque!”. Estas são apenas algumas das frases que você, mulher, certamente ouviu na infância. Nos primeiros anos de vida, muitas meninas devem ter concluído que era mais divertido ser menino. Afinal, deles, o que era cobrado? Quase nada exigido, e muito tolerado.

Não à toa, situações de abuso e violência contra a mulher, muitas vezes, culpabilizam a vítima e absolvem o algoz. “Sofreu assédio no trabalho? Também, usando aquelas roupas...”. “Tentaram te agarrar à força na festa? Aposto que tu estavas bebendo demais e deu mole pra ele!”. “Apanhou do marido? Alguma coisa ela aprontou pra ter merecido isso”. “Quer fazer um aborto? Assassina! O bebê não tem culpa, aguenta mais um pouquinho e entrega pra adoção”. “Entregou para adoção? Credo! Se livrou da criança sem nem olhar pra ela”. Essas e muitas outras frases resumem uma triste realidade: ser mulher no Brasil é viver sob constante vigilância.

Sim, porque a mesma sociedade que julgava as guriazinhas que brincavam como moleques na rua está sempre de olho no comportamento que possa ser considerado “inadequado”. 

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Chega a ser incoerente que vivamos em um regime patriarcal e machista, sendo que, segundo o IBGE, quase a metade dos lares brasileiros é chefiada por mulheres. Outro dado alarmante: em 2021, cerca de 100 mil crianças ficaram sem o nome do pai na certidão de nascimento. No nosso patriarcado, a paternidade é opcional. Temos, portanto, uma multidão de mulheres que criam sozinhas seus filhos, precisam trabalhar fora e geralmente são a única fonte de renda familiar. Não bastasse tudo isso, são julgadas, abusadas, discriminadas, violentadas e até mesmo mortas. 

Nosso crime? Ter nascido mulher. 

O que, biologicamente, é definido pelo pai, que nos dá o segundo cromossomo X. Mesmo ausentes, mesmo que não constem na certidão de nascimento, são os pais que definem o destino das filhas. A culpa é deles, mas o martírio é nosso.



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