Papo Reto
Manoel Soares: "Olhei para o abismo e ele migrou para dentro de mim"
Colunista escreve para o Diário Gaúcho aos sábados.
Meu fim de semana começou poluído com a cena de um criminoso agredindo um menino de quatro anos. As imagens eram assustadoras, ele dava socos e sufocava o garoto. A primeira coisa que veio à cabeça foi o caso do menino Bernardo, que chocou o Brasil em 2014.
Ver as cenas me fez dizer em rede nacional uma frase perigosa: “Se encontro esse cara perderia meu réu primário”. Logo depois, fiz a correção: minha intenção não era incentivar a violência, mas já tinha falado. Depois, refletindo, lembrei de uma frase de Friedrich Nietzsche: “Quando você olha para o abismo, o abismo também olha para você”. Na intenção de condenar algo que consideramos errado, podemos errar na mesma medida, ou mais. Às vezes, parece que só a violência extrema funciona para combater a violência extrema... E assim nascem alguns discursos de ódio que devoram a humanidade.
A luta interna é não nutrir pelas pessoas que fazem o mal um ódio que nos faça agir como elas. Quando renunciamos à bondade e agimos como os agressores, damos motivos para outras pessoas sentirem o mesmo por nós. Um círculo de maldade se forma e nem sabemos por que odiamos.
Quando vi as cenas de agressão, olhei para o abismo e ele migrou para dentro de mim, quis fazer com o agressor de criança o dobro do que o vi fazer. Por mais que alguns achem que meus motivos eram justos, o fato é que eu senti vontade de ser como ele, fazer o que ele fez. Foi por outros motivos, mas eu seria como ele. Minha dica é: evitem olhar para o abismo.