Estiagem
Nível do Guaíba baixa, muda paisagem e já impacta tratamento de água em Porto Alegre
Segundo o diretor-geral do Dmae, a redução no volume de água aumenta a concentração de algas e exige maior tempo para tratamento antes de distribuí-la para a população
Embora não se preveja racionamento devido ao baixo nível do Guaíba, o abastecimento em Porto Alegre entra em situação de permanente vigilância durante a temporada de verão. É visível mudança da paisagem fluvial, com bancos de areia e praias mais extensas que o normal. Alteração que acompanha a deterioração da qualidade da água, exigindo mais tempo de tratamento antes de distribuí-la à população.
— Temos grande segurança hídrica pela grande quantidade de água que o Guaíba nos oferece. O que ocorre é que a escassez hídrica prejudica o tratamento, aumentando o tempo necessário para este processo — explica o diretor-geral do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae), Alexandre Garcia.
Segundo ele, a população, mesma aquela que não observa o Guaíba durante o cotidiano, pode perceber o resultado da estiagem pela eventual mudança de gosto e odor, ocasionada pela redução no volume de água e pela concentração de algas. Garcia, no entanto, assegura que a qualidade é monitorada 24 horas por dia nos laboratórios instalados nas Estações de Tratamento de Água (ETA), as quais estão conectadas com as estações de Bombeamento de Água Bruta (Ebab).
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— No verão em Porto Alegre, a quantidade de água tratada e o consumo ficam muito próximos um do outro. Isso é um dos motivos que nos leva a buscar permanentemente melhorias no sistema de distribuição, com mais unidades de bombeamento para os pontos de consumo na cidade — afirma Garcia.
Por outro lado, com a falta de chuvas e o calor que se intensifica diante da escalada do verão, a imagem registrada pelo olhar nas margens do Guaíba inspira preocupação e reflexão com o manancial.
— A gente se preocupa muito. Já tivemos falta de água. Mas o que a gente preza é ensinar nosso filho sobre o cuidado com a natureza e a responsabilidade com o futuro — conta o professor Diogo Gomes, 37 anos, sob a anuência do olhar da esposa, Ana Paula, 37, também professora, e a admiração do pequeno João Vicente, quatro anos.
Eles moram na última casa da Rua Rodolfo Breyer, antes do acesso à margem do Guaíba, no bairro Belém Novo. De onde vivem e compartilham lições de vida com o único filho, podem ver parte das instalações da Estação do Dmae, que abastece a toda aquela região da Capital, incluindo a residência do Osmar de Oliveira, 79 anos, aposentado e praticante da pesca esportiva.
— Moro há uns 35 anos aqui. Cada verão que passa, o Guaíba desce mais um pouquinho. Mesmo quando está baixo, dá peixe. Mas tenho a impressão que jamais volta ao ponto em que estava antes da seca. Todo ano, o Guaíba vai sumindo um pouco mais — lamenta Osmar.
Aproveitando a tarde ensolarada de férias com os quatro netos na praia de Itapuã, na divisa da Capital com Viamão, Marcelo e Cláudia também expressam sua percepção.
— A gente vem aqui com frequência. Quando falta chuva, o Guaíba desce, faz muita diferença — diz o açougueiro de 54 anos, que questiona sobre a escassez de sombras e lixeiras no local.
Nesta terça-feira (3), o monitoramento que é realizado diariamente no Guaíba pela Sala de Situação da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) registrou nível de 70 centímetros acima do nível do mar, o que corresponde a uma condição típica para o verão. Na mesma época do ano passado, no dia 2 de janeiro de 2022, o nível do Guaíba tinha atingido a marca de 21cm. Apesar da folga na régua, as variações, no entanto, têm demonstrado nos últimos dias um quadro que exige o olhar permanente das autoridades.
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— Tivemos dias com verificação do nível em 40 centímetros e outros nos quais chegou a 30 centímetros, o que é bastante baixo mesmo para esta época do ano — indica o geógrafo e geólogo Luciano Cardone, diretor do Departamento de Gestão de Recursos Hídricos e Saneamento da Sema.
Diante deste cenário, autoridades intensificam a atenção ao monitoramento. Segundo Cardone, com a estiagem, dados das cerca de 180 estações meteorológicas e hidrometeorológicas instaladas pelo Estado têm sido apurados a cada 15 minutos pela Sala de Situação para serem analisados. Dois boletins diários são publicados, um pela manhã e outro ao final da tarde. As informações sustentam ações e decisões sobre o uso da água.
Conforme o documento desta terça-feira, são quatro as bacias hidrográficas colocadas em situação de atenção em decorrência de níveis considerados "muito baixos": Apuaê-Inhandava, Ijuí, Quaraí e Mirim-São Gonçalo (extremo sul do Estado). Contudo, mais preocupante é a situação de outras 10 das 25 as bacias hidrográficas do RS, estas colocadas em estado de alerta por conta da estiagem: Rio dos Sinos, Caí, Gravataí, Jacuí, Ibicuí, Uruguai, Negro, Santa Maria, Camaquã e Guaíba.