Direto da Redação
Tiago Boff: "O cheiro do verão"
Jornalistas do Grupo RBS escrevem sobre temas do cotidiano
Café? Pizza? Alho fritando na panela? Deixemos as comidas de lado: asfalto molhado pela chuva? Grama cortada? Carro novo? Exigir uma resposta à pergunta “Qual cheiro é o teu predileto?” institui o caos em qualquer roda de amigos. Afinal, o que nos desperta sensações de prazer vem carregado de subjetividade. Contudo, arrisco apresentar a vocês um aroma unânime – ou quase né, vai saber. O protetor solar.
No meu cérebro, coração ou na alma – profundo! –, o filtro solar é o anúncio solene da chegada do verão. Se bem que bastaria alguns minutos sob o sol pelando, ouvir na Gaúcha a tranqueira na Freeway... Bom, eu prefiro encostar o nariz no braço e inspirar com vontade. Cafungar o agridoce da pele um pouco suada, emplastando a meleca que sai do tubo. Juro, se fechar os olhos enquanto espalho a pasta no corpo, consigo me ver correndo na areia, saltando sobre as ondas, chutando a superfície da água ou jogando bobinho com bola de vôlei. Se te cansei, calma: mudei o exercício e estou, agora, bem acompanhado deitado embaixo do sombreiro.
Dolce far niente
No Arroio Seco, prainha de Arroio do Sal, não existem ambulantes oferecendo canga, picolé, caipirinha ou queijo coalho. É ruim pela falta do serviço (tirando a canga, eu queria todos os outros itens ao mesmo tempo), mas compensa a calmaria de permanecer horas observando o mar.
Respeito demais os autônomos, pois foi assim que cresci, com minha mãe sacoleira viajando horas em ônibus leito e meu pai no camelô do bairro. Só que, com a expansão de alguns badalados balneários, falta espaço para relaxar, sem planos. Os italianos têm até uma expressão pra isso: “dolce far niente”, o “doce fazer nada”, um ócio desprovido de culpa.
Proponho esse momento a ti, enquanto estivermos livres do Nordestão. Se as rajadas de vento te derrubarem, corre pro vendedor e compra logo uma barraca. Mas não esquece de colocar uma extra no bagageiro do pinga-pinga que passa lá no Arroio Seco.