Direto da Redação
Ricardo Düren: "Milagre de São João"
Todas as quartas-feiras, jornalistas do Diário Gaúcho opinam sobre temas do cotidiano
Ainda hei de levar a turminha lá de casa para passar uma noite de São João em Linha Carijinho, uma localidade rural e pacata de Sobradinho, município de colonização italiana encravado na região serrana do Vale do Rio Pardo. Não sei se vou já neste ano, mas um dia desses ainda vou.
O passeio até Sobradinho, margeando penhascos por uma estrada sinuosa, já é um espetáculo à parte. Mas o ponto alto, quando se chega à Linha Carijinho na véspera do dia de São João, é um rito que surpreende os visitantes há quase um século: a caminhada sobre as brasas da fogueira junina.
Não que eu esteja cogitando fazer um desfile épico sobre o braseiro – o plano é ficar só olhando. E segurando firme as crianças, para que não tenham nenhuma ideia maluca. Em Linha Carijinho, a caminhada sobre as brasas é missão exclusiva dos chamados passadores, gente que se especializou na ardente caminhada.
E, ainda que seja encarada como uma demonstração de fé, a passagem sobre as brasas, por via das dúvidas, é feita sob o olhar atento de bombeiros e socorristas. Até a fé pode falhar. Portanto, não me invente de fazer isso em casa depois de uns goles de quentão.
Contudo, é fato que os passadores atravessam o solo incandescente sem dar um “ai”. O feito intriga os mais céticos, que buscam toda sorte de explicações racionais para o fenômeno. Dizem que o frio da noite ameniza o calor das brasas, que os passadores cruzam muito rápido sobre o fogo, que têm os pés enrijecidos pelo trabalho duro na lavoura.
Mas a versão que mais me agrada é a dos habitantes de Linha Carijinho: a passagem sobre as brasas, dizem eles, é um milagre de São João.
Por isso, já propus à turminha de casa que fossemos até lá para a noite de São João. Nossas três gurias sempre gostaram de festas juninas – dos vestidos rendados, das danças, da tapioca e do milho verde. Porém, diante do convite, quiseram saber se em Linha Carijinho também havia o milagre do wi-fi.
Ah, essas gurias são fogo.