Decisão unânime
Conselho recomenda cassação de aposentadoria de delegado condenado por inventar ritual satânico em caso de crianças mortas
Moacir Fermino foi julgado na última terça-feira por episódio que ocorreu em Novo Hamburgo em 2017
O caso do delegado da Polícia Civil Moacir Fermino, que já foi condenado na Justiça por ter inventado farsa envolvendo ritual satânico no caso de duas crianças encontradas esquartejadas em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, teve mais um capítulo nesta semana. O Conselho Superior de Polícia recomendou que o delegado tenha a aposentadoria cassada. A decisão, tomada de forma unânime, ocorreu durante julgamento no Palácio da Polícia Civil. A defesa do delegado ainda pode recorrer.
Na última terça-feira (26) à tarde, o Conselho Superior de Polícia se reuniu para julgar o processo administrativo aberto contra o delegado. O caso envolve a mesma situação que levou Fermino a ser julgado e condenado na Justiça, por inventar um ritual satânico durante a investigação da morte de duas crianças em Novo Hamburgo, em setembro de 2017. A decisão do conselho foi recomendar que o delegado tenha a aposentadoria revogada.
— A cassação da aposentadoria se dá, obviamente, pelo fato de que ele já está aposentado. A pena ao servidor que está na ativa seria a demissão. Como ele não pode ser demitido, porque está aposentado, a pena sugerida é a cassação da aposentadoria — explica o secretário-executivo do Conselho Superior de Polícia, delegado Mário Mombach.
A recomendação do conselho, no entanto, precisa passar ainda pelo crivo do governador. Caberá a Eduardo Leite tomar a decisão final sobre atender ou não a sugestão de que o delegado tenha a aposentadoria cassada. A defesa do delegado — que não respondeu os contatos da reportagem até o momento — poderá apelar novamente nesta etapa, pedindo que a decisão seja reconsiderada.
Vice-presidente do Conselho Superior de Polícia, o delegado Daniel Schmitz explicou que a resolução referente ao julgamento do processo administrativo-disciplinar em questão está sendo finalizada. Após assinaturas e juntada, o processo será encaminhado nos próximos dias ao governador do Estado, para análise e aplicação da pena disciplinar.
Fermino foi afastado das funções ainda em fevereiro de 2018, mesmo mês em que a própria Polícia Civil constatou que havia sido montada uma farsa, envolvendo a investigação do caso de duas crianças encontradas esquartejadas. Cinco pessoas, apontadas pelo delegado como envolvidas no crime, chegaram a ser presas, sendo libertadas depois disso.
A expectativa é de que possa haver uma decisão do governo do Estado sobre o caso até o final do mês de outubro.
O caso
Em setembro de 2017, duas crianças foram encontradas mortas, com corpos esquartejados, nas proximidades de uma estrada na zona rural de Novo Hamburgo. Seis anos depois deste crime, a identidade das vítimas não foi descoberta. A investigação foi encaminhada ao Poder Judiciário sem que se chegasse a uma conclusão sobre a autoria desse crime.
Conforme laudo do Instituto-Geral de Perícias (IGP), as vítimas são um menino e uma menina, com idades entre oito e 12 anos. A análise da perícia também constatou que os dois possuem parentesco pelo lado materno, podendo ser irmão, primos ou mesmo tia e sobrinho. Os crânios das vítimas nunca foram localizados.
A investigação na época era conduzida pelo delegado Rogério Baggio, mas foi assumida temporariamente por Fermino durante as férias do colega. Foi neste período que Fermino divulgou à imprensa que o caso havia sido solucionado, e apontou um grupo de pessoas como responsáveis pelo crime, num suposto ritual satânico. Mais tarde, a própria polícia desmontou essa investigação, apontando que havia sido uma farsa.
Na Justiça, o delegado foi condenado a seis anos em regime semiaberto ainda em 2020 pelos crimes de falsidade ideológica (três vezes) e corrupção ativa de testemunha (quatro vezes). O delegado recorre da decisão em liberdade.
O que é o Conselho Superior de Polícia
O Conselho Superior de Polícia é formado por oito conselheiros. Além de delegados da Polícia Civil, o órgão colegiado conta com conta com representantes da Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Quem preside o conselho é o chefe da Polícia Civil, atualmente o delegado Fernando Sodré.
Como se dá a votação
Um relator do conselho analisa o que foi coletado durante o processo administrativo, como os depoimentos das partes envolvidas. O relator apresenta o seu voto sobre o caso, no qual explica se entende se há culpa ou não, e sugere absolvição ou condenação. Após revisão de outro conselheiro, o caso é encaminhado para votação no plenário para os demais decidirem.
Os conselheiros se reúnem para julgar o caso no Palácio da Polícia Civil. Durante o julgamento, a defesa se manifesta. Depois disso, os conselheiros deliberam e fazem a votação.
Cada conselheiro, aponta seu entendimento sobre o caso e é realizada a votação. No caso dessa terça-feira (26), os conselheiros foram unânimes pela cassação da aposentadoria do delegado Moacir Fermino.
Contraponto
GZH tentou contato com o advogado José Cláudio de Lima da Silva, que representou o delegado Fermino durante o julgamento, mas não obteve retorno até o momento. A defesa ainda pode tentar reverter a decisão.