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Posso Entrar?

Cris Silva: "Pode entrar, Karol"

Colunista traz histórias inspiradoras de vida e trabalho todas as sextas-feiras

29/09/2023 - 06h00min


Diário Gaúcho
Diário Gaúcho
Agência RBS / Agência RBS
Cris Silva

Durante uma entrevista para alunos de uma faculdade, perguntaram quem era minha inspiração. Eu sempre dou a mesma resposta: pessoas comuns com um trabalho ou feito especial me inspiram. Não tô falando de artistas, celebridades, nada disso... Tô falando das pessoas anônimas que me emocionam pela capacidade de criar algo lindo mesmo diante das adversidades. 

A personagem de hoje é uma dessas mulheres que me fazem acreditar que o ser humano pode ser especial quando quer. Com vocês, Karol Rosa de Almeida, 29 anos, moradora da Restinga, aqui na Capital, e proprietária da Kopa Coletiva Arquitetura Popular.

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Arquivo Pessoal / Arquivo Pessoal
Na ExpoFavela

FOI ASSIM

“Antes de criar a Kopa, eu estava na faculdade de Arquitetura (consegui entrar através de política pública) e era estagiária. Engravidei no segundo semestre da graduação e nunca consegui, em função de ser mãe e periférica, uma vivência na área de escritório de arquitetura, pois a pauta das entrevistas era sempre ‘Quem vai levar teu filho ao médico quando ele ficar doente?’ ou ‘Ah, tu é da Restinga? Seriam quantas conduções até lá? Ah, quatro?’. Então, as minhas duas vivências foram em órgãos públicos, onde consegui passar em concursos de estágio. Antes da graduação, fui operadora de telemarketing, desenhava rostos realistas e vendia como quadros, fazia unha decorada e me virava como podia.”

O COMEÇO

“Saí da faculdade desempregada e com um filho para criar. Assim como eu não imaginava fazer faculdade, por ser algo fora da minha realidade, também não me imaginava sendo a “dona do meu próprio negócio”. Porém, diante da necessidade, surgiu a oportunidade. Enquanto eu largava diversos currículos de um lado, do outro eu ia oferecendo meus serviços no Instagram. Comecei a fazer vídeos me posicionando enquanto arquiteta periférica. Não concordava que, em seis anos de graduação, minha casa ou as comunidades nunca tivessem aparecido em alguma disciplina. Os primeiros vídeos foram: “Arquitetura não é só pra gente rica”; “Precisamos falar de home office, mas também precisamos falar sobre desigualdade social”. A partir do meu posicionamento, os primeiros possíveis clientes ‘populares’ começaram a se identificar e pedir orçamentos. Senti que tinha um caminho a ser trilhado.”

Arquivo Pessoal / Arquivo Pessoal
Mão na massa

MEU NEGÓCIO

“Iniciei a Kopa Coletiva Arquitetura Popular nas redes sociais exatamente 10 dias depois da formatura, em fevereiro de 2020, um mês antes da pandemia. A Kopa é um negócio de impacto social em habitação, que tem a missão de democratizar o acesso, levando projetos e reformas para periferia, além de provar que arquitetura é para todos. Nós oferecemos pacotes de projetos acessíveis e parcelados para os públicos de baixa renda, periféricos e moradores de bairros populares, que nunca pensaram ou puderam contratar um profissional técnico. Conseguimos impactar, também, em melhorias habitacionais em parceria com doadores. Além disso, a Kopa movimenta a economia dos territórios, contratando mão de obra e comprando das lojas de materiais locais.”

CAIU A FICHA

“O momento mais difícil foi quando caiu a ficha que a desigualdade social existe e é potente. Foi quando eu vi que teria que me esforçar muito pra fazer meu nome, justamente porque eu não tinha nome, não tinha influência, não tinha parentes que pudessem me apresentar para o mercado, não tinha carro pra atender clientes, não tinha notebook pra levar, não tinha dinheiro para alugar um espaço para receber clientes, não tinha roupa ‘adequada’, tampouco sabia ‘me portar’ para atender quem a faculdade nos ensina a atender. Mas mal eu sabia que o meu propósito não era atender a arquitetura tradicional e, sim, a arquitetura para o meu povo, e que nenhum desses medos importaria e me impediria de alguma coisa.”

MINHA INSPIRAÇÃO 

“Desde pequena, sonhava em ver a casa da minha mãe reformada. A partir da minha vivência em uma casa que, quando criança, eu considerava ‘feia’ e tinha vergonha que começou a existir uma pontinha de desejo de ser arquiteta, então, a motivação sempre foi proporcionar isso pros meus, pra minha família. Hoje, minha motivação em especial são meus filhos (pois agora são dois)! Quero que eles tenham o exemplo que dá pra impactar de forma positiva a sociedade por meio do nosso trabalho.”

Arquivo Pessoal / Arquivo Pessoal
Um dos projetos

DAQUI PRA FRENTE

“Vou trabalhar muito para não ser mais ‘só eu’ na equipe da Kopa, quero que a empresa cresça, quero ter gente do meu lado, uma equipe para atender mais e mais famílias. Mas o que eu garanto é que a Kopa vai impactar cada vez mais e também colaborar para um futuro promissor de melhorias habitacionais não só na Restinga e Rio Grande do Sul, mas no Brasil! Garanto isso, porque não estou sozinha na caminhada e acredito que o futuro para promover moradia digna e direito a cidade é coletivo! É só o começo!”

Quem quiser conhecer mais sobre a Karol e seu trabalho pode procurar lá no Instagram no @kopacoletiva.

RECADO DA CRIS

“Se quer ir rápido vá sozinho, se quer ir longe, vá em grupo.”



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