Quem vai ao velório de alguém especial e não reflete sobre a própria vida já morreu por dentro e não sabe. Desculpe começar assim tão sincerona, mas ainda estou impactada. A gente deveria escrever na porta da geladeira um bilhete enorme, com letras gigantes, dizendo "Será que estou aproveitando ao máximo o dia de hoje?". Provavelmente esse recado só funcionaria no início, e iria perdendo a força junto à lista do supermercado, os boletos vencendo, mil tarefas e compromissos. 

Somos instantes. Tenho um quadrinho com essa frase pra lembrar como tudo é breve. Nossa trajetória, por mais longa que seja, tem data certa pra terminar (e ninguém quer mais detalhes). Somos instantes de encantamentos, de erros e acertos, de felicidades, de descobertas, de tentativas, de esperanças. Tomara que somando tudo isso, a gente faça jus ao privilégio de estar vivo. Somos instantes que permanecerão na memória dos que ficam, ou logo seremos esquecidos? 

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Compaixão

Tem quem foge de velório. Não vai por medo desse enfrentamento, e da tristeza que faz parte. Entendo, existem programas mais agradáveis. Só que a compaixão se pratica com presença e abraço apertado. É um ritual de despedida e respeito, a última homenagem. O que eu acho mais louco é o contraste da situação. Enquanto familiares e amigos velam o ente querido, lá fora a vida segue indiferente. O sol brilha, motoristas buzinam, filas crescem nas lotéricas, o pão sai do forno, os shoppings lotam.

Enterros e velórios também reaproximam. A gente encontra pessoas que não via há tempos, atualiza a árvore genealógica da família, se surpreende com conhecidos em comum que nem sabia. Acho que é um presente final do falecido: mesmo não estando mais entre nós, reúne todo mundo pra nos lembrar do óbvio: não se leva nada material dessa vida. Riqueza mesmo são os laços de afeto, as boas memórias, os ensinamentos, o legado de histórias pra contar aos mais novos, o carinho eterno.