Direto da Redação
Ricardo Düren: "O retrato da angústia"
Jornalistas do Diário Gaúcho opinam sobre temas do cotidiano
Dentre tantas imagens de destruição, terror, resgates e solidariedade que chegam para nós, editores, enviadas de diferentes pontos do Estado pelos fotógrafos do Grupo RBS, uma das que mais me partiram o coração é um registro do repórter fotográfico Mateus Bruxel captado na segunda-feira. A fotografia mostra o resgate de famílias ilhadas, transportadas em uma embarcação militar sobre as águas turbulentas do Guaíba.
Ao centro da foto, um pai mantém os olhos fixos em um horizonte incerto. O rosto é sério, lúcido, não demonstra pânico. Ele não sabe ao certo o que acontecerá com sua família dali para frente, mas não pode deixar transparecer suas próprias angústias, sob risco de aumentar ainda mais as aflições daqueles que protege.
O braço direito dele cruza sobre o peito para segurar a mão da esposa, ao lado; a mão esquerda aperta firme a da filha, que é abraçada pela mãe, os três colados uns nos outros.
O rosto da mulher está voltado para a popa do barco, mas o olhar vai além, em direção a tantas conquistas, fruto de tanto esforço, que ficaram para trás, engolidas pelas águas. A menina está com os olhos fechados, possivelmente por medo. Tem todos os motivos para estar assustada, aquele não é um passeio.
Junto a eles, outras famílias. Um garoto que deve ter uns 12 ou 13 anos está cabisbaixo, mas também tenta se manter sério, disfarça a tensão em um semblante que transparece força. Deve imaginar que é isso que se espera de um homenzinho em uma hora dessas.
Ao fundo, outra garotinha se acomoda, nitidamente assustada, nos braços da avó, as cabeças coladas, os rostos transbordando tristeza. É uma menina pequena, mas que vai levar as recordações destes dias de tensão para sempre.
Ela teve a vida salva, felizmente, mas sai com o psicológico abalado por uma catástrofe que talvez ainda nem compreenda. É uma dentre tantas crianças que vão necessitar de toda nossa atenção, mesmo depois que tudo isso passar.