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Bairro Arquipélago 

Escolas públicas da região das Ilhas seguem sem aula presencial nem remanejo dos alunos

Todas as cinco instituições de ensino foram atingidas pela enchente. Duas delas passam por limpeza, em parceria com a Marinha do Brasil, e outras três, que atendem 700 estudantes, ainda estão fechadas

20/06/2024 - 13h00min


Isabella Sander
Isabella Sander
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Última região de Porto Alegre onde a água baixou e ainda em estado de alerta, devido à nova cheia, o bairro Arquipélago, que compreende as ilhas do município, tem cinco escolas públicas: quatro estaduais e uma municipal. Até agora, nenhuma pôde abrir as portas, e tampouco houve remanejo dos alunos atendidos.

Há atividades remotas sendo oferecidas aos alunos das escolas estaduais Almirante Barroso, na Ilha da Pintada, e Alvarenga Peixoto, na Ilha dos Marinheiros. As direções também têm feito uma busca ativa para mapear onde estão seus estudantes, já que muitos perderam suas casas, e se têm condições de participar de aulas online.

Em duas das cinco instituições públicas das Ilhas – a Escola Municipal de Educação Infantil (Emei) Ilha da Pintada e a Almirante Barroso –, o momento é de limpeza pesada. Ambas foram adotadas pela Marinha do Brasil, que disponibilizou militares para fazer a lavagem dos espaços e do mobiliário que puder ser recuperado.

Segundo informações da Secretaria Estadual de Educação (Seduc), a previsão é de que a Marinha finalize a limpeza da Almirante Barroso no final de junho. A instituição é a maior do Arquipélago: em 2023, possuía 522 alunos matriculados.

Em visita à Almirante Barroso, na terça-feira (18), a reportagem de GZH conferiu o andamento da limpeza no estabelecimento. Munidos de lavadoras de alta pressão e vestidos com macacões de segurança, militares se revezavam no trabalho de lavar e enxaguar tetos, pisos e paredes.

Algumas das salas de aula já estavam completamente limpas. Em outras, as marcas de lama atingiam alturas superiores ao topo das portas e janelas. Em um cômodo, foram concentradas mesas e cadeiras, ainda enlameadas. Por orientação da direção, a Marinha descartará todos os móveis feitos de madeira, mas tentará tirar a sujeira daqueles de plástico.

O ginásio da instituição já foi limpo e abriga um posto avançado de saúde, já que a unidade de saúde da região está fechada. No pátio, que fica em uma parte um pouco mais alta do terreno, areia seca se acumulava no parquinho e soterrava alguns brinquedos. Na parte mais baixa, rente ao Guaíba, a água já dava sinais de subir. A preocupação dos fuzileiros navais era de que a cheia atingisse as áreas já limpas e atrasasse a entrega.

As outras três instituições estaduais – Alvarenga Peixoto, na Ilha dos Marinheiros, Maria José Mabilde, na Ilha da Pintada, e Oscar Schmitt, na Ilha das Flores – ainda não passaram por limpeza, seguem fechadas e sem previsão de reabertura. No total, elas tinham, em 2023, 676 estudantes matriculados. Os espaços passarão por vistoria técnica, antes de iniciar a faxina.

Mateus Bruxel / Agencia RBS
A Escola Maria José Mabilde, na Ilha da Pintada, segue fechada.

A Seduc informou que a Maria José Mabilde havia passado por uma primeira limpeza feita pela Marinha do Brasil. Em visita, a reportagem verificou, entretanto, que o barro imperava sobre o local, que estava vazio e fechado. Conforme relatos de moradores, essa primeira limpeza consistiu em retirar da entrada do prédio com escavadeira as dunas de areia que se formaram com a enchente, a fim de viabilizar o acesso ao portão principal.

No pátio localizado em frente à instituição, areia molhada se sobrepunha ao piso e dificultava o acesso aos brinquedos do playground. Dunas de areia soterravam um orelhão e uma lixeira pública. Na parte interna, havia indícios de uma tentativa de uma limpeza embrionária: figuravam uma mangueira e alguns rodos e vassouras, misturados à paisagem de lama e água a qual os olhos da população já se habituaram.

Sem perspectiva de volta à escola

Enquanto a equipe de GZH circulava pela Ilha da Pintada, uma cena chamou a atenção: dois adolescentes andavam sobre destroços e tentavam abrir as janelas de uma casa de madeira que havia sido arrastada de um lado para o outro da rua. A menina, Luiza, 17 anos, morava lá com os pais – agora, acha que não voltam mais, por medo da água, mas querem remontar a residência, para seguir com a posse do terreno.

— Não deu pra salvar muita coisa, só geladeira, fogão. Roupa eu não sei se dá pra salvar, porque já está há mais de um mês aí, cheio de barro seco — lamenta a jovem.

Atualmente, Luiza está hospedada na casa do namorado, também na Ilha da Pintada, e os pais alugaram uma casa no bairro Bom Jesus. Estudante da Almirante Barroso, acha que não volta mais para a escola neste ano.

— Eu não tenho dinheiro para comprar mochila e nem material escolar, e tem tanta coisa para limpar. E tem pouca escola aqui perto e nenhuma boa, então não tem por que trocar. De qualquer forma, vão nos passar direto de ano, por conta da enchente — pondera a adolescente.

Em meio aos destroços, encontrou um secador de cabelo, mas desanimou, ao se dar conta de que dificilmente conseguiria fazê-lo funcionar.

Limpeza a pleno vapor

A Emei Ilha da Pintada é a instituição mais avançada na limpeza entre todas as públicas localizadas no bairro Arquipélago. Com 130 crianças matriculadas em turmas pré-escolares, o estabelecimento, assim como a Almirante Barroso, foi adotado pela Marinha do Brasil, que levou para lá militares e maquinário, consertou a parte elétrica, instalou uma antena da Starlink para ter internet e abasteceu o local com uma caixa d’água, tudo para viabilizar a faxina pesada. O trabalho, que conta também com a parceria das profissionais da escola, começou no dia 8 de junho e deve ser encerrado até o final da semana que vem.

Ainda com alguns espaços deteriorados pela água e pelo barro, parte do térreo do estabelecimento já teve suas condições recuperadas e aguarda por pintura, substituição de aberturas e parquet e instalação de mobiliário. Por isso, enquanto alguns dos 20 militares destacados se dedicam às paredes e pisos ainda sujos, outros passam lava-jato em brinquedos e pequenos móveis que a diretora, Luciana Scolari, acha que ainda pode tentar recuperar.

Antes de os fuzileiros navais chegarem, a instituição teve o apoio, na primeira limpeza, da prefeitura do município de Quinze de Novembro, do Noroeste gaúcho.

— A prefeitura nos disponibilizou um caminhão de bombeiro, porque a gente não tinha água na ilha e precisava limpar o quanto antes da escola, uma retroescavadeira e uma caçamba. Com essas ferramentas e o pessoal que veio da prefeitura, conseguimos tirar cerca de 40 centímetros de barro de dentro da escola — lembra Luciana.

Outra ajuda vem da rede privada: o Colégio Monteiro Lobato, da Zona Norte de Porto Alegre, está fazendo uma rifa e dedicará sua festa junina à arrecadação de recursos para a compra de mobília e outras necessidades apontadas pela Emei Ilha da Pintada.

— Perdemos toda a mobília, que era de MDF, material escolar, livros e todos os jogos das crianças. Ainda separamos alguma coisa e estamos fazendo uma limpeza e uma reavaliação para ser se vai poder ou não ficar, mas muito foi fora, porque a escola é de Educação Infantil e muita coisa era de madeira, que absorve muito barro. Sabemos que o barro está poluído e as crianças colocam na boca, então tivemos que descartar — relata a diretora.

A pressa para retomar as aulas aumenta quando Luciana percebe suas crianças brincando em locais insalubres.

— A gente está vendo que nossos alunos já estão no entorno, voltando para a comunidade, e brincando no barro, no lixo. Isso nos preocupa, porque sabemos que é material contaminado. Então, se esse espaço estiver aberto, vai poder acolher as crianças com condições — pontua a diretora.

O secretário municipal de Educação, Maurício Cunha, que estava no local quando a reportagem de GZH visitou a escola, explicou que a região das Ilhas tem uma especificidade que torna mais desafiador o retorno da comunidade escolar: a comunidade escolar em si, e não só a própria instituição, foi severamente atingida, e, por isso, tem ocorrido um trabalho de busca ativa para saber onde estão esses alunos.

— A direção está em contato com as famílias e sabe que muitas estão em Guaíba e outras localidades, retornando agora para cá. Por isso, estão fazendo planejamentos de acolhimento ainda para esta semana, tanto online quanto presencial. Também estamos conversando com a igreja aqui ao lado para usar o salão paroquial por um tempo, e vendo dentro da escola as opções que temos para receber as crianças aqui a partir da sexta-feira da semana que vem — destaca o secretário.

O salão paroquial poderia ser usado como sala de aula, para o caso de se constatar que não há condições de comportar todos os estudantes nos ambientes já adequados para receber alunos. Como a escola possui três andares, os outros pavimentos serão usados normalmente.


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